Um levantamento realizado pelo Instituto Fogo Cruzado mostrou um aumento dos discursos pró-armas no Congresso Nacional nos últimos 10 anos. Somente em 2023, as declarações em defesa do armamento da população foram, em números, três vezes mais do que falas que contrariavam o uso dos equipamentos.
Para chegar aos resultados, o Instituto analisou discursos na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, entre os anos de 1951 e 2023. Os registros deram origem ao estudo “O que o Congresso Nacional fala sobre o armamento civil?”. A pesquisa coletou dados de 1.977 discursos realizados nas duas casas legislativas sobre o tema.
O primeiro discurso que defende a liberação do armamento da população é do deputado federal Campos Vergal, feito em 1951. De lá para cá, o discurso armamentista ganhou cada vez mais espaço entre as discussões no parlamento.
Foi a partir de 2015 que houve um aumento considerável da defesa das armas. Naquele ano, o Brasil era cenário de manifestações populares e convivia com a primeira legislatura dos parlamentares eleitos na esteira do discurso anti-política, que usavam uma roupagem “liberal”.
“Ocorreu na eleição de 2014 um processo mais intenso de renovação das elites políticas, com a ascensão de diversos novos deputados e senadores. […] É nessa legislatura que observamos uma mudança: pela primeira vez foram contabilizados mais discursos favoráveis à ampliação do acesso às armas do que pelo seu controle”, afirma o estudo.
Entre 2015 e 2023, foram realizados 272 discursos sobre o tema na Câmara e no Senado, sendo 73% pró-armamento e 24% em defesa do controle de armas. Foi a primeira vez que os discursos pró-armas superaram os contrários.
Em 2019, primeiro ano do mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro, novas regulamentações e decretos flexibilizaram o acesso a armamento para a população. Em voga por quatro anos, as novas regras foram revogadas logo nos primeiros dias do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Mesmo com o novo governo, porém, não se alterou a lógica da defesa do armamento da população no Congresso. Foram 75 discursos a favor da população armada contra 24 contrários.
Dentre os discursos realizados entre 2015 e 2023, apenas 30% utilizaram dados, estatística ou pesquisa científica para justificar seus argumentos. Dentro desse grupo, 55% não mencionaram fonte de onde os dados foram retirados.
“Considerando a existência de uma variedade de dados e estatísticas sobre violência e segurança pública, bem como pesquisas que tentam entender a relação entre circulação de armas e aumento ou diminuição da violência, surpreende que a grande maioria dos atores envolvidos nesse debate tenha preferido ignorá-los”, afirma o estudo.
Apesar da defesa do armamento feito por parlamentares, o estudo pontua que mais armas em circulação na mão de civis não é a solução para o problema da segurança pública do País. Pelo contrário.
“Um retrocesso ainda maior do que o que vimos em anos recentes em relação ao armamento civil será desastroso nesse contexto. O futuro que precisamos construir é de menos mortes e ele não virá com mais civis armados”, afirmou a pesquisa.