Os Estados Unidos realizaram, nesta quarta-feira (10), o sequestro de um petroleiro em águas próximas à costa da Venezuela, em mais um episódio da escalada militar comandada pelo governo de Donald Trump contra Caracas e seus aliados na região. O próprio presidente norte-americano confirmou a operação, que atinge diretamente o setor petrolífero venezuelano e agrava a crise de abastecimento em Cuba.
Segundo Trump, as forças norte-americanas “acabaram de tomar um petroleiro na costa da Venezuela — um navio muito grande, o maior já capturado, na verdade”. Questionado pela imprensa sobre o destino da embarcação e da carga de petróleo, o presidente respondeu: “acho que vai ficar conosco”, admitindo abertamente o roubo do produto.
De acordo com fontes ouvidas pela agência Reuters, a operação foi conduzida pela Guarda Costeira dos Estados Unidos. As autoridades não divulgaram o nome da embarcação, a bandeira ou o ponto exato da interceptação. Consultorias privadas do setor marítimo, entretanto, apontam que se trata do petroleiro Skipper, rebatizado após ter sido sancionado anteriormente por Washington, sob a alegação de participação no comércio de petróleo iraniano.
Informações de rastreamento de navios indicam que o cargueiro, de bandeira guianense, estaria operando na rota entre o porto de Basra, no Iraque, e Georgetown, capital da Guiana. Uma fonte ouvida pela revista norte-americana Politico afirmou, sob anonimato, que a embarcação tinha como destino final Cuba, o que tornaria o sequestro parte direta do cerco energético imposto pelos Estados Unidos à ilha.
Caracas denuncia ‘pirataria internacional’
O governo venezuelano reagiu denunciando o ataque contra o navio nas imediações de seu litoral. Em comunicado, o presidente Nicolás Maduro afirmou que a Venezuela “exige o fim da intervenção brutal e ilegal dos Estados Unidos” e relacionou a captura do petroleiro ao objetivo declarado de Washington de controlar as vastas reservas de petróleo do país.
O chanceler venezuelano, Yván Gil, classificou a ação como “ato de pirataria internacional” e lembrou que não é a primeira vez que Trump admite publicamente que seu objetivo é “ficar com o petróleo venezuelano”.
A operação ocorre no mesmo dia em que Maduro liderou, em Caracas, uma grande mobilização popular pelo 166º aniversário da Batalha de Santa Inés, marco da Guerra Federal dirigida por Ezequiel Zamora. Diante de milhares de pessoas no centro da capital, o presidente destacou que “as mesmas mãos de produtores, camponeses e operários que semeiam a terra venezuelana são as que levantarão as armas para defender a Pátria”, e afirmou que “Venezuela segue em vitória” frente às tentativas de agressão externas.
Maduro convocou à unidade regional e defendeu que “mais cedo do que tarde temos que refundar a Grande Colômbia”, fazendo referência ao projeto de integração latino-americana de Simón Bolívar em oposição à política norte-americana no continente.
Escalada militar e mortes no Caribe
O sequestro do petroleiro ocorre em meio a uma escalada generalizada na região. Trump ordenou o envio de um porta-aviões, caças e dezenas de milhares de soldados para a região, sob o pretexto de combater o tráfico de drogas e “reafirmar a dominância” norte-americana no chamado “Hemisfério Ocidental”.
Desde o início de setembro, o governo Trump já realizou mais de 20 ataques contra embarcações classificadas como suspeitas de narcotráfico, com um saldo superior a 80 mortos.
Durante declaração à imprensa sobre o sequestro do petroleiro, Trump ainda ameaçou o presidente da Colômbia, Gustavo Petro. “É melhor ele ficar esperto, ou será o próximo”, disse o republicano, acusando o governo colombiano de enviar cocaína aos Estados Unidos. Petro é alvo de sanções norte-americanas.
Golpe contra o petróleo venezuelano e contra Cuba
A Venezuela exportou mais de 900 mil barris de petróleo por dia no último mês, terceiro maior volume do ano, apoiada em operações da estatal PDVSA, que ampliou a importação de nafta para diluir o petróleo extrapesado. Até agora, apesar das sanções e ameaças, Washington vinha evitando interferir diretamente no fluxo físico de petróleo venezuelano.
A captura do petroleiro representa, assim, um passo adiante na tentativa de asfixiar economicamente o país e seus aliados. Analistas do setor energético afirmam que a apreensão agrava a instabilidade no mercado. As cotações reagiram com leve alta: o Brent fechou em US$62,21 o barril, alta de 0,4%, enquanto o petróleo West Texas Intermediate (WTI) subiu para US$58,46.
Para Cuba, a ação tem impacto imediato. A ilha vive uma das fases mais difíceis desde o início do bloqueio econômico norte-americano. As restrições, acirradas nos últimos anos, limitaram drasticamente o acesso a combustíveis, insumos médicos, peças de reposição e bens básicos. O país depende de remessas de petróleo venezuelano para atenuar a escassez de energia.
Com o sequestro do navio supostamente destinado a Havana, intensificaram-se os apagões, foram cortadas viagens de transporte público e houve novas dificuldades na distribuição de alimentos. Famílias que já enfrentavam longas filas e preços elevados agora convivem com interrupções mais prolongadas de eletricidade e maior custo para se deslocar.
Até o momento, Caracas não anunciou medidas concretas de retaliação ao sequestro do petroleiro, mas o governo venezuelano tem utilizado o episódio para reforçar o chamado à mobilização popular e à unidade com outros países da região contra a intervenção estrangeira.