O artigo A mentira existe, de Alexandre Aragão de Albuquerque, publicado nesta sexta-feira (20), no Brasil 247, chama atenção já pelo título. Existe alguém que negue a existência da mentira? O ponto central do autor, no entanto, é outro: para o identitarismo, mentir deve dar cadeia — ou, no mínimo, serve como desculpa para derrotas eleitorais, quedas de popularidade etc.
Quando Jair Bolsonaro venceu o pleito contra Fernando Haddad, a maioria da esquerda culpou as mentiras disseminadas pelo WhatsApp na reta final da campanha. Mas ignorou a avalanche de mentiras que a imprensa publica todos os dias — há décadas.
Albuquerque escreve: “A mentira existe. É falso afirmar que tudo se trata de uma questão de opinião. Minimizar a mentira como se ela fosse algo acessório, menor ou até mesmo anedótico pode ser uma atitude profundamente nociva para a vida em sociedades contemporâneas”.
Por que “sociedades contemporâneas”? A mentira sempre foi um problema humano. Não à toa, um dos Dez Mandamentos proíbe levantar falso testemunho.
A mentira não foi inventada por Bolsonaro. Tampouco será erradicada por decreto. Combater a mentira virou, na boca da esquerda pequeno-burguesa, um pretexto moralista para justificar a censura.
Karl Marx já havia deixado isso claro no livro Liberdade de Imprensa. A mentira existe, é fato. Mas o mesmo se aplica aos braços e pernas, que também podem ser usados para o mal. Não há o que fazer. Não há remédio para isso. Marx escreveu:
“A liberdade de imprensa é uma coisa excelente, que embeleza o doce costume da vida, uma coisa agradável e digna. Mas há também pessoas más, que usam a fala para mentir, o cérebro para tramar, as mãos para roubar, os pés para desertar. A fala e o pensamento, as mãos e os pés seriam coisas excelentes — boa fala, pensamento agradável, mãos hábeis, pés excelentes — se apenas não houvesse pessoas más para os usarem mal! Ainda não se encontrou nenhum remédio para isso.”
Ditadura
Para mostrar o quanto a esquerda perdeu o rumo, basta ver a comemoração do autor em relação ao voto de Flávio Dino no Supremo Tribunal Federal (STF), em 11 de junho de 2025. No plenário, o ministro defendeu que redes sociais sejam responsabilizadas por conteúdos publicados por usuários — mesmo sem ordem judicial.
A contradição salta aos olhos: como algo pode ser considerado ilegal antes mesmo de ser julgado? Na prática, as plataformas preferirão remover qualquer conteúdo que possa representar risco jurídico — ou seja, tudo o que possa desagradar os poderosos.
O STF está, na verdade, entregando a empresas estrangeiras o poder de decidir o que pode ou não ser publicado no Brasil. Um ataque frontal à soberania nacional.
O autor cita que “Dino argumentou que a liberdade é um valor nodal, e liberdade (também a de expressão) sem responsabilidade é tirania. Afinal, todos nós estamos adstritos a um conceito constitucional de liberdade”. Sim, e a Constituição diz, de forma inequívoca: é livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato. Nada mais.
Sua santidade, Dino
Tentando levantar a bola do juiz autoritário, Albuquerque afirma que Flávio Dino teria dito: “As pessoas não são obrigadas a crer em Deus. O que não pode é, em qualquer meio, inclusive o digital, em nome da liberdade de expressão, os crentes pretenderem caluniar, atacar, punir ou exterminar aqueles que são agnósticos em relação à existência de Deus”.
Deixando de lado os agnósticos, cabe perguntar: o que o ministro pretende fazer com os que se dizem o “povo escolhido por Deus”? Se são os escolhidos, o resto é o quê? E os cristãos que acusam outros cristãos de serem falsos? Serão censurados também?
E ele segue: “Portanto, é impossível um Tribunal (como o STF), que tem como obrigação expressar os melhores valores que a humanidade foi capaz de produzir, no campo filosófico e científico, como também no campo da espiritualidade, encontrar-se diante da mentira e minimizá-la”.
Difícil imaginar uma corte que mandou Lula para a cadeia sem provas, que persegue grevistas da enfermagem e outros trabalhadores, como detentora dos “melhores valores da humanidade”. Em breve, teremos ministros do STF sendo canonizados.
Crimes e mais crimes
Um dos vícios herdados da direita por setores da esquerda foi transformar a política em crime. Albuquerque fala da “espionagem como política de Estado”, cita que “a Abin confirma uso de programa secreto que monitorou alvos durante o governo Bolsonaro” e conclui que se trata de uma prática “grave: usar a estrutura de inteligência do Estado brasileiro para monitorar ilegalmente adversários políticos”.
Seu objetivo é evidente: reforçar a tese de que “Bolsonaro e seu bando são perversos”. Mas é curioso ler isso vindo de setores que apoiaram Joe Biden nas eleições norte-americanas — o mesmo que foi vice de Obama, governo que espionou Dilma Rousseff e deu suporte ao golpe de 2016.
Não há dúvida de que a espionagem deve ser denunciada. Mas também é preciso denunciar que os EUA impõem uma ditadura ao mundo inteiro. Essa história de “democracia versus fascismo” que a esquerda pequeno-burguesa insiste em vender é uma farsa.
Como não conseguem derrotar Bolsonaro politicamente, muitos agora só querem vê-lo na cadeia. Para isso, contam com o Judiciário. Mas como confiar numa instituição que foi peça-chave no golpe contra Dilma?
É por isso que se repete tanto o discurso dos “crimes”: “organização criminosa”, “Gabinete do Ódio”, “gente responsável por vídeos, textos, memes”. Tudo isso serve para criar um clima de medo.
Enquanto isso, a esquerda abandona a disputa política nas redes e nas ruas para se agarrar à censura e à tutela do Judiciário.
Ato falho?
A direitização de certos setores da esquerda é tão avançada que aparece até no vocabulário. Albuquerque escreve: “Ninguém se engane, a defesa da democracia é tarefa permanente das pessoas de bem”. “Pessoa de bem”? Até ontem, essa era uma expressão típica da extrema-direita [grifo nosso].
Ao final do artigo, ele conclui que “todos devem engajar-se fortemente na luta contra essa extrema-direita que teima em querer sufocar a democracia brasileira com seus tentáculos mentirosos”.
Mas esses mesmos setores não movem uma palha contra a grande imprensa, que atacou o PT por anos, e ajudou a construir o ódio da extrema-direita contra a esquerda.
Na época do Mensalão e da Lava Jato, foi essa imprensa que fez o serviço sujo. Prisões arbitrárias, delações forçadas, julgamentos espetaculosos. A revista Veja dizia que Lula e Dilma “sabiam de tudo”.
Tudo isso agora está convenientemente esquecido. Bolsonaro virou o pai da mentira no Brasil. Mas há uma mentira ainda maior: a de que o STF está combatendo as “fake news”.
Na verdade, o que está em curso é a implantação de uma censura brutal no País — e muitos estão aplaudindo. Tudo em nome da verdade. Mas é justamente a verdade que não pode ser dita.
A censura serve para proteger, por exemplo, os sionistas e seu massacre em Gaza. Quem denunciar, será calado pelas redes sociais. E ainda haverá quem bata palmas.