Falta de dólares? Mas mercado financeiro atrai US$ 5,5 bi apenas em novembro

por Luís Silva

Os recursos direcionados por estrangeiros ou brasileiros fora do País para a compra de títulos de dívida negociados no mercado doméstico e emitidos pelo setor público, por bancos e empresas privadas voltaram a disparar em novembro, atingindo o maior valor para o mês desde que o Banco Central (BC) passou a divulgar a atual série estatística, em 1995. A grande especulação global desembarcou com vigor no País, aportando nada menos do que US$ 5,522 bilhões apenas em novembro, estimulada pela facilidade de ganhos rápidos e elevados no mercado financeiro e no mercado de capitais pela política permanente de arrocho monetário.

Para comparação, em novembro do ano passado, o mercado doméstico de títulos de dívida havia recebido uma injeção de US$ 832,739 milhões em valores líquidos, quer dizer, já descontados os dólares remetidos para fora do País por investidores estrangeiros. A comparação entre os dois meses mostra um salto de expressivos 563,11%, nada menos do que 6,6 vezes a mais. Os dados de novembro ajudaram a turbinar o desembarque de dólares no mercado doméstico de papéis de dívida, que passou a acumular alta de 63,18% nos primeiros 11 meses deste ano frente ao mesmo período do ano passado, quando aquelas operações haviam alcançado perto de US$ 10,647 bilhões. Entre janeiro e novembro deste ano, entraram naquele mercado US$ 6,727 bilhões a mais do que em idêntico intervalo de 2023, elevando o total líquido neste ano para US$ 17,374 bilhões.

Golpe e fuga de dólares

Embora o avanço tenha sido nada desprezível, bem ao contrário, o total acumulado até novembro de 2024 corresponde ao sétimo maior valor para o período desde 1995 e ao mais alto desde 2021, quando os títulos de dívida emitidos aqui dentro haviam atraído US$ 17,684 bilhões (sempre entre janeiro e novembro). A conta ficou negativa entre 1997 e 2022, com a saída de dólares daquele mercado superando a entrada de divisas estrangeiras, período que coincide com a fase de valorização do real frente ao dólar e a pelo menos duas crises cambiais ocorridas no período, que levaram o Brasil a pedir o socorro do Fundo Monetário Internacional (FMI) para pagar compromissos internacionais.

Perda de fôlego?

A entrada vigorosa de dólares observada em novembro deste ano no mercado de títulos reforça as análises que apontam uma forte dose de especulação nos movimentos registrados no mercado do dólar nas últimas semanas. A cotação da moeda norte-americana em reais chegou a recuar 3,78% entre o final de julho e o último dia de setembro, saindo de algo acima de R$ 5,66 para pouco menos de R$ 5,45 conforme registro diário realizado pelo BC. Em outubro, o dólar subiu 6,05% e atingiu, ao fim do período, perto de R$ 5,78 e avançou para R$ 6,05 no encerramento de novembro, numa elevação de 4,77%.

Até 30 de dezembro, quando bateu em R$ 6,19, a cotação da moeda havia experimentado elevação de 2,29% frente ao fechamento de novembro (em aparente desaceleração quando considerado o ritmo observado nos dois meses anteriores). Desde 30 de setembro até a antevéspera do final do ano, portanto, a cotação do dólar chegou a registrar variação de 13,66%. A escalada, como sugerem os dados do próprio BC, deveu-se em larga medida a jogadas no mercado de dólar futuro, que nem sempre envolvem a movimentação real da moeda norte-americana, mas meramente apostas de operadores e especuladores sobre o valor a ser alcançado pelo dólar mais à frente ou sobre sua variação ao longo do tempo em relação à moeda brasileira.

E mais dólares

Somando as operações realizadas aqui dentro e as transações ocorridas no mercado externo, os títulos de dívida registraram a entrada líquida total de US$ 26,5 bilhões entre janeiro e novembro deste ano, pouco mais de dois terços ocorridas no mercado doméstico. Na comparação com os mesmos 11 meses de 2023, quando aqueles títulos haviam anotado a entrada líquida de US$ 17,324 bilhões, as estatísticas do BC indicam elevação de 52,97%. Em novembro, isoladamente, a alta chegou a 76,52%, com os negócios neste mercado atraindo US$ 4,596 bilhões neste ano e US$ 2,604 bilhões no ano passado.

As negociações de papéis brasileiros lá fora anotaram alguma desaceleração no ritmo de crescimento diante da remessa líquida de US$ 925,572 milhões em novembro deste ano, o que se compara com a entrada de US$ 1,771 bilhão em igual mês do ano passado. No acumulado até novembro, a movimentação cresceu 36,69%, saindo de US$ 6,677 bilhões para US$ 9,127 bilhões – ou seja, em torno de US$ 2,450 bilhões a mais.

Criptoativos, outro lado da especulação

Os números do balanço brasileiro de pagamentos, conta que consolida todas as transações realizadas pelo País no mercado internacional, foram afetados negativamente pelo aumento de 49,77% no rombo acumulado até novembro na conta de capital. O déficit nesta área subiu de US$ 10,027 bilhões para US$ 15,017 bilhões (US$ 4,990 bilhões a mais), notadamente por influência da saída de dólares destinados a aplicações em criptoativos. As remessas de dólares destinadas a transações com moedas virtuais lá fora subiram de US$ 10,353 bilhões para pouco menos de US$ 15,290 bilhões, em alta de 47,68% na comparação entre os 11 meses iniciais deste ano e de 2023. Esse tipo de “investimento”, altamente especulativo, anotou algum arrefecimento em novembro, quando as remessas caíram 7,17%, de US$ 1,313 bilhão em 2023 para US$ 1,219 bilhão neste ano.

Reservas

Entre seu pico mais recente, registrado no primeiro dia de outubro, quando havia alcançado US$ 372,219 bilhões, as reservas internacionais brasileiras anotaram queda de 10,72%, chegando a US$ 332,306 bilhões no registro de 27 de dezembro. Ao longo daquelas semanas, portanto, o BC injetou no mercado físico de dólar perto de US$ 39,913 bilhões, sacando contra as reservas do País. A cotação do dólar registrou algum arrefecimento em dezembro, mas manteve a tendência de elevação, o que parece indicar que o BC precisará pensar em estratégias mais efetivas para combater a especulação com o câmbio e reduzir a capacidade dos mercados de interferir na sua definição.

Luís Silva – Jornalista

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Last Update: 31/12/2024