No último domingo, milhares de pessoas foram às ruas contra o chamado “PL da Dosimetria”, um eufemismo para uma lei que, na prática, não só reduz as penas dos envolvidos na tentativa de golpe de 8 de janeiro, como avança para uma futura anistia.
O projeto, articulado pelo deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP) na Câmara, reduz substancialmente as penas para os condenados da tentativa de golpe bolsonarista. Apesar do discurso cínico, o PL tem um alvo certo: livrar Bolsonaro da cadeia numa perspectiva de, lá na frente, trazê-lo de volta à vida política.
Num trâmite expresso, ao contrário de projetos como o fim da Escala 6×1 que se arrasta indefinidamente, o projeto chegou ao Senado neste dia 17, onde foi apreciado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Essa comissão avalia se o projeto tem ou não possibilidades de ir a plenário. Com um número certo de votos para a sua aprovação em plenário, principalmente da extrema direita e do centrão, havia a perspectiva de a medida ser barrada na comissão, ao menos temporariamente para jogá-la para o ano que vem.
Isso, porém, foi arruinado pela orientação do governo no Senado, sob o comando de Jaques Wagner (PT-BA), que articulou a sua aprovação na comissão em troca da taxação das Bets. Esse acordão do PT com o centrão e a extrema direita permitiu que o projeto fosse levado horas depois ao plenário, e, presumivelmente, aprovado com folga, por 48 votos contra 25.
Acordão com o centrão, a extrema direita e o STF
Wagner matou no peito a articulação espúria, afirmando que nem a ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffman, ou o próprio presidente Lula, saberiam do acordão. No entanto, é inverossímil que o líder do PT no Senado tenha tomado essa decisão da própria cabeça. Mais do que isso, denúncias dos próprios senadores afirmam se tratar de um acordão que envolveria o governo Lula, a extrema direita, o centrão e até o Supremo Tribunal Federal (STF).
“Este texto que estamos votando é fruto de um acordo entre o governo Lula, parte da oposição e o ministro Alexandre de Moraes”, declarou o senador Alessandro Vieira (MDB-RJ). A taxação das Bets garantiria ao governo Lula uma arrecadação extra de R$ 22 bilhões para cumprir a meta fiscal no ano que vem, e, em troca, o PT daria caminho livre para a votação da medida no Senado beneficiando os golpistas.
O projeto aprovado pelo Senado com a ajuda da liderança do PT pode reduzir a pena de Bolsonaro de 6 a 8 anos em regime fechado para até 2 anos. Mais do que isso, abre o caminho para o avanço de novos projetos para a completa reabilitação do golpista, o objetivo declarado da extrema direita, para o qual até foram buscar a ajuda de Trump para impor sanções contra o Brasil.
Traição
No plenário do Senado, o PT votou contra, sabendo que o PL já tinha os votos garantidos para a sua aprovação. Neste teatro, Lula deve vetar o Projeto de Lei para não ficar mal diante da maioria da população que é contra qualquer anistia a golpista, sabendo de antemão, porém, que o veto será derrubado pelo Congresso Nacional.
A traição ocorrida neste dia 15 mostra que o governo Lula e a direção PT não só não enfrentam a extrema direita, como estão dispostos a livrar a cara dos golpistas em troca da manutenção do arcabouço fiscal. Na prática, vendeu a luta contra o golpismo por R$ 22 bilhões, que irão garantir a meta de superávit fiscal e garantir o pagamento da dívida pública aos banqueiros. Mostra ainda que não se pode depositar qualquer confiança no STF para dar uma batalha consequente ao golpismo da extrema direita.
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Essa política de acordos e conciliação do governo Lula e a direção do PT com o centrão e a extrema direita no Congresso Nacional, no entanto, não vem de agora. Além de barrar pautas dos setores oprimidos, deixa avançar projetos como o PL da Devastação ou o Marco Temporal. Uma política que só fortalece, cada vez mais, a extrema direita.
Revela ainda como as direções dos partidos da esquerda da ordem, ao apoiar esse governo, enfrentam a extrema direita só no discurso, quando, na prática, acabam capitulando não só ao PT como ao bolsonarismo e ao golpismo da extrema direita.
O PSTU esteve nas ruas no último domingo para derrubar qualquer projeto de anistia. Defendendo que o caminho é as ruas e alertando que o governo Lula, apesar de falar em “Congresso inimigo do povo”, acaba conciliando com os setores mais reacionários que diz, no discurso, combater. O PSTU compartilha da justa indignação da base petista e do conjunto do ativismo, que se sente agora traída com a hipocrisia do governo e da direção e parlamentares petistas.
Essa traição reforça a necessidade da organização e da mobilização da classe trabalhadora, de forma independente do governo e dos partidos da ordem, sem nenhuma confiança no STF, para combater a extrema direita e derrotar qualquer anistia aos golpistas.