As comunidades menonitas que se estabeleceram na Amazônia, especialmente em países como Bolívia e Peru, enfrentam graves acusações de desmatamento e, mais alarmante ainda, de abusos sexuais sistemáticos. Em Manitoba, uma colônia menonita na Bolívia, onde os moradores rejeitam a modernidade, um grupo de homens foi preso em 2009 e posteriormente condenado, em 2019, por estupro e abuso sexual de 151 mulheres e meninas, incluindo crianças pequenas.
Esse caso terrível inspirou o livro “Entre Mulheres”, de Miriam Toews, e adaptado para o cinema em 2022, com o mesmo título, vencedor do Oscar de Melhor Roteiro Adaptado em 2023.
O filme denuncia os abusos ocorridos nessas pequenas comunidades cristãs. “Aconteceu novamente. Quando acordamos, sentimos mãos que tinham desaparecido. Os anciãos disseram que eram fantasmas ou Satanás, ou que estávamos mentindo para chamar a atenção, ou mesmo que era um ato de imaginação feminina selvagem. Continuou durante anos. Aconteceu a todas nós”, relata uma das personagens do filme.
Isoladas e presas em uma bolha temporal com dinâmicas arcaicas e patriarcais, essas comunidades menonitas, originárias de países como Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Holanda e Suíça, sobrevivem na Bolívia desde 1954. Elas são acusadas de desmatar terras para expandir suas atividades agrícolas, muitas vezes invadindo terras indígenas.
Entre 2005 e 2009, em Manitoba, 151 mulheres foram sedadas e abusadas sexualmente por homens da própria comunidade. Esses criminosos usavam tranquilizantes para gado, que eram pulverizados pelas janelas das casas, para dopar as vítimas enquanto dormiam e então abusar delas.
“Sabemos que são os homens que nos atacam. Não fantasmas, não Satanás, como fomos levadas a crer. Sabemos que não imaginamos os ataques. Que fomos derrubadas para ficar inconscientes com tranquilizante de vaca. Sabemos que estamos feridas, infectadas, grávidas, apavoradas, loucas… e que algumas de nós estão mesmo mortas”, diz uma das mulheres em uma cena do filme.
A investigação sobre os crimes começou quando um dos infratores foi pego em flagrante, o que levou à prisão de outros oito homens. Eles foram julgados e condenados em 2011 a 25 anos de prisão por estuprar e abusar sexualmente de 151 mulheres, incluindo meninas, mulheres adultas e idosas.
“Elas acordaram meio inconscientes, com dor de cabeça e manchas em seus corpos. Elas não tinham ideia de por que não estavam usando roupas íntimas”, revelou Fredy Pérez, promotor do caso, em entrevista à BBC em 2019.
Apesar da condenação, a luta das vítimas continua, pois as autoridades mais velhas da comunidade fazem de tudo para que as mulheres retirem suas denúncias, buscando proteger os culpados.
Miriam Loews, autora de “Women Talking”, título original do livro que inspirou o filme, destaca a indiferença do mundo em relação aos crimes cometidos nessas colônias isoladas, onde o silêncio e a repressão são usados como ferramentas de controle e manutenção da ordem patriarcal.
“O número de incidentes de violência doméstica patriarcal nessas colônias é muito alto e, na maioria das vezes, o mundo é indiferente, o que é apenas o que os anciãos e líderes religiosos desejam. Quando o mundo exterior começa a se interessar por esses crimes, a colônia faz as malas e parte para partes ainda mais remotas do mundo, onde serão deixados sozinhos e livres para se comportar impunemente”, disse a escritora.