Na abertura do 3º Encontro Nacional da Rede de Comunicadores da CTB realizado nesta quinta-feira (15), o pesquisador Ergon Cugler, da Fundação Getulio Vargas (FGV), apresentou um panorama contundente sobre os impactos da desinformação na sociedade brasileira e apontou caminhos possíveis para combatê-la a partir da atuação direta dos trabalhadores.

Com trajetória ligada à Estratégia Nacional de Enfrentamento à Desinformação, Ergon acumula experiência junto ao IBIPT (Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia), à Secom e ao Ministério da Saúde. Durante sua participação, ele abordou três pontos centrais: como a desinformação impacta redes sociais e a vida concreta das pessoas; a relação com a inteligência artificial; e o papel estratégico da organização coletiva, especialmente da CTB, no enfrentamento do problema.

“Desinformação não é ‘falta de informação’. É informação falsa ou distorcida, com intenção deliberada de enganar — e, muitas vezes, de lucrar com isso”, explicou. Como exemplo, citou o caso do ex-presidente dos EUA, Donald Trump, que chegou a sugerir o uso de desinfetante contra a Covid-19. “Mais de 800 pessoas morreram. Isso não ficou só no digital, teve consequência real.”

Ergon também destacou o impacto no Brasil: a taxa de cobertura vacinal, que chegou a ser de 97%, caiu para 75% após a disseminação de fake news. “Até a vacina da pólio foi deixada de lado. Estamos falando de um retrocesso de 40 anos”, alertou.

Negócio da mentira

Durante sua fala, o pesquisador apresentou dados sobre como a desinformação se tornou um mercado: com grupos organizados que vendem desde “curas milagrosas” até protocolos falsos de saúde, utilizando ferramentas como bots, e-books e cursos online. “Hoje, temos cerca de 2,5 milhões de brasileiros inseridos em comunidades abertas que difundem teorias da conspiração”, afirmou.

Inteligência artificial a serviço da desinformação

A tecnologia, segundo Ergon, também tem sido instrumentalizada de forma perigosa. “Estudos mostram que fake news geradas por inteligência artificial são mais difíceis de detectar do que as escritas por humanos. Além disso, a IA já está sendo usada para manipular voz, imagem e vídeo — como vimos em eleições nos EUA e em golpes no Brasil.”

Outro ponto levantado foi o uso de bots em grupos de WhatsApp e Telegram, programados para interagir automaticamente com usuários que mencionam palavras como “vacina” ou “doença”, oferecendo produtos falsos e desinformação direcionada. “A IA não é o inimigo. O problema é o uso que se faz dela”, pontuou.

A resposta vem da base

Apesar do cenário preocupante, Ergon encerrou sua apresentação com uma mensagem de esperança: o combate à desinformação passa pelo fortalecimento das relações humanas e da confiança nas instituições públicas — e, sobretudo, nos trabalhadores da ponta.

Durante sua pesquisa de mestrado, entrevistou agentes comunitários de saúde para entender como lidavam com a resistência à vacinação. “Não era a técnica nem a autoridade que convencia. Era o vínculo. A confiança construída com o tempo, com base no cuidado e na presença cotidiana.”

Mas há um alerta: vínculos só se constroem com condições de trabalho dignas. “Se um agente de saúde precisa visitar 20 famílias por dia para bater meta, como ele vai criar uma relação de confiança?”, questionou. “Defender os direitos dos trabalhadores é também enfrentar a desinformação. Um servidor valorizado, com estabilidade e tempo para cuidar da comunidade, é um antídoto contra a mentira.”

Por isso, concluiu, a CTB tem um papel fundamental nesse processo. “Organizar os trabalhadores, garantir condições de trabalho e fortalecer redes de solidariedade é também defender a verdade. E isso, num cenário como o que vivemos hoje, é um ato de resistência.”

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Last Update: 16/05/2025