No ano passado, o show da cantora pop Madonna, em Copacabana, um enorme empreendimento comercial, foi alvo de muita demagogia pseudo-esquerdista. Nesse sábado, trazida pela mesma empresa que produziu Madonna, tocou na mesma praia de Copacabana, a cantora pop Lady Gaga. A reação da imprensa pró-imperialista e da esquerda pequeno-burguesa foi igualmente lamentável. Transformaram um mero empreendimento comercial em manifestação revolucionária.

Logicamente que ninguém explica, como não explicaram no show de Madonna, como pode ser uma manifestação revolucionária e libertadora um evento milionário, patrocinado não só por grandes empresas multinacionais, mas pela prefeitura do Rio de Janeiro e o governo do estado, ambos governados pela direita. Cada um, prefeitura e governo, deu R$ 15 milhões para o evento, que ao todo teria custado R$ 92 milhões. Realmente a revolução custa dinheiro.

Um artigo do portal Brasil 247, chamado Multidão histórica celebra Lady Gaga em Copacabana: ‘que artista!’ exalta o evento, terminando assim o texto: “No encerramento do show, durante ‘Vanish to you’, Gaga desceu até a grade de segurança, pegou bandeiras e flores oferecidas pelos fãs e apertou as mãos de diversos admiradores. Ao lado dos bailarinos, puxou um coro efusivo de ‘Brasil, Brasil, Brasil’, selando com emoção uma noite que já entrou para a história dos grandes shows internacionais em solo brasileiro”. Yes, nós temos Lady Gaga!

Não que a cantora pop não possa gostar do Brasil, talvez ela realmente goste, mas certamente recebendo uma parte desses R$ 92 milhões, como ele recebeu, fica bem mais fácil amar essas terras tupiniquins.

Não é nenhum crime trazer uma cantora pop para cantar no Brasil, menos ainda porque sabemos que se trata de uma jogada para movimentar a cidade. Mas não é necessário se transformar em bajulador de gringo. A cantora veio, fez seu negócio – e não se trata de mais nada além de negócio – e foi embora.

Outro artigo também no Brasil 247, uma coluna assinada por Sara York, e publicada antes do show de Gaga, revela bem as confusões de um setor da esquerda sobre essas coisas e como esse setor, de classe média, é facilmente enganado pela propaganda que os grandes monopólios da cultura fazem.

A chamada “indústria cultural” fabrica produtos. Cada produto tem seu público foco. Lady Gaga é um desses produtos, e seu foco é nas pessoas pseudo alternativas, esquisitas, ou qualquer coisa assim. Hoje em dia, isso dá bastante dinheiro porque ser esquisito não é mais de fato ser esquisito, é ser a norma. Então, 2,1 milhões de pessoas que se pensam que anormais, mas que na verdade são convencionais, teriam ido assistir a Gaga.

Não há nenhum problema em gostar de nada. Cada um ouve o que quer. O problema é quando o gosto – bom ou mau – se torna uma ideologia. É o que faz a colunista do 247.

“Mais do que uma diva pop ou fenômeno midiático, Lady Gaga representa uma chave simbólica para entender nossa era marcada por hipervigilância, solidão e resistência estética. Sua arte transcende o entretenimento e toca em questões existenciais, sociais e políticas que se tornam cada vez mais urgentes também por aqui. Hipervigilância, isolamento e arte – Lady Gaga é, desde o início de sua carreira, um corpo estranho à normatividade”

O que a colonista não percebeu é que não ser “normativo” hoje é a coisa mais “normativa” que se possa ter a ponto de que a prefeitura e o governo do Rio gastarem 30 milhões para ter um evento como esse. Isso, sim, é “normatividade”.

“Gaga transforma esse processo em arte. Seu piano é trincheira. Sua performance, armadura. Sua imagem, linguagem política. Ao chamar seus fãs de ‘little monsters’, Gaga escancara o espelho da monstruosidade imposta pela norma. E nessa monstruosidade compartilhada, cria-se um laço, uma comunidade  -  talvez um refúgio”.

Não há trincheira, não há armadura, não é contestação à norma, nada disso. A colunista, assim como os 2,1 milhões que foram à Copacabana, tem todo o direito de gostar de música pop que, aliás, do ponto de vista musical é a coisa mais “normativa” que a indústria fonográfica produz. Mas para gostar dessa música pop não precisa criar toda uma justificativa ideológica. Não precisa criar uma grande contestação onde há apenas senso comum, não precisa inventar uma revolução onde o que tem não é nada mais do que conservadorismo e reacionarismo produzido por grandes monopólios imperialistas. Apenas assuma seu gosto!

“Porque a revolução de Lady Gaga não está apenas na música. Está, sobretudo, no direito de cada ‘monstro’ ser reconhecido como parte da cidade”. Difícil saber quem são esses “monstros”, mas uma coisa é certa, não é que a “revolução de Lady Gaga” não está só na música, sua música é justamente o primeiro lugar onde não tem revolução nenhuma. Como dissemos, sua música pop é a mais comum que a indústria fonográfica criou e vem reciclando há décadas. Mas não há revolução em nada disso, tudo não passou de um grande empreendimento milionário.

Ah se fosse um cantor sertanejo do “agro” que tivesse recebido R$ 30 milhões do governo…

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Last Update: 05/05/2025