Além do ex-presidente, outros sete réus estão sendo julgados por tentativa de golpe de Estado e tentar impedir a posse do presidente Lula
Cerca de três anos após o País ser vítima de uma articulação golpista para tentar derrubar o regime democrático e impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete golpistas estão no banco dos réus no Supremo Tribunal Federal (STF), em um julgamento histórico. Em um voto técnico, mas incisivo para deixar claro a gravidade do caso, o relator do processo, ministro Alexandre de Moraes, votou, nesta terça-feira (09), para condenar Bolsonaro por liderar a organização criminosa.
O magistrado é o primeiro a votar no julgamento que ocorre na Primeira Turma. Ao longo do voto, ele descreveu o passo a passo da trama golpista e destacou que as vastas provas encontradas pela Polícia Federal, como conversas, decretos para tentar dar aparente legalidade ao golpe, e plano para matar autoridades, deixam claro que não se tratou de mera preparação, mas que de fato ocorreram tentativas violentas de tomar o poder e impedir que a escolha de milhões de brasileiros fosse respeitada. Além de Bolsonaro, estão sendo julgados Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência, Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa e Walter Souza Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro.
“O líder do grupo criminoso deixava público que jamais aceitaria uma derrota democrática nas eleições. Que jamais cumpriria a vontade popular”, destacou Moraes, se referindo a Bolsonaro. “O núcleo central também tinha integrantes militares que ocupavam cargos estratégicos dentro do Poder Executivo Federal, como o réu Augusto Heleno, que exerceu o cargo chefe do GSI; o réu Walter Souza Braga Netto, que exerceu os cargos de ministro chefe da Casa Civil e ministro da Defesa, assim como foi candidato a vice-presidente da República na chapa de Jair Bolsonaro; o réu Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, que exerceu o ministério da Defesa, também foi função central na estrutura criminosa, exercido o cargo de comandante do Exército e, posteriormente, a titularidade do ministério da Defesa. Da mesma forma, o réu Almir Garnier, que exerceu o posto de comandante da Marinha durante o mandato presidencial do líder”, completou o magistrado.
Estrutura criminosa
Moraes afirmou que Bolsonaro seria o principal beneficiado caso o golpe tivesse dado certo e que ele recebeu respaldo dos militares em suas intenções criminosas, como na intenção de intervir nas instituições democráticas. “Jair Messias Bolsonaro exerceu a função de líder da estrutura criminosa e recebeu ampla contribuição de integrantes do governo federal e das Forças Armadas, utilizando-se da estrutura do Estado brasileiro para a implementação de seu projeto autoritário de poder, conforme fartamente demonstrado nos autos”, continuou Moraes.
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O ministro ressaltou que a preparação do golpe envolveu um planejamento complexo e que durou por quase dois anos, tempo suficiente para caracterizar a existência de organização criminosa criada para atentar contra o regime democrático. “A organização criminosa narrada a denúncia pela Procuradoria-Geral da República realmente iniciou a prática das condutas criminosas com atos executórios concretos e narrados anteriormente em meados de julho de 2021 e permaneceu atuante até o dia 8 de janeiro de 2023, por integrantes do governo federal da época e por militares das Forças Armadas”, disse ele.
“Teve o claro objetivo de impedir e restringir o pleno exercício dos Poderes constituídos, em especial o Poder Judiciário por meio do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral, bem como tentar impedir, depois, o governo legitimamente eleito em outubro”, completou o magistrado. “Jair Bolsonaro exerceu o papel de líder da organização criminosa, utilizando-se da estrutura do Estado brasileiro para implementar um projeto autoritário de poder,” enfatizou.
Gabinete golpista
O ministro Alexandre de Moraes ressaltou que as investigações evidenciam que o golpe não teria fim com a deposição ou impedimento do governo do presidente Lula, mas que a estratégia seria manter Jair Bolsonaro no poder, mesmo contra a vontade do povo e que para isso seria criado um gabinete de crise.
“Havia até a previsão de gabinete de crise após a consumação do golpe de Estado”, continuou Moraes. Ele lembrou que militares seriam recrutados para manter o presidente Lula, o vice-presidente, Geraldo Alckmin e ele mesmo. “Talvez naquela conversa de bar dos kids pretos, que queriam matar autoridades, tenham falado em se montar um gabinete de crise. Não é um gabinete de crise do nada, mas que combina todos os atos executórios desde junho de 21, chefiado pelo réu Augusto Heleno e sob coordenação geral do réu Braga Netto.
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“A sequência desses atos executórios, desde junho de 2021, mostra claramente a consumação dos tipos apontados pela Procuradoria Geral da República. Mas mostra que, em virtude da reação dura e constitucional do comandante do Exército e da Força Aérea, não houve tempo hábil para um autogolpe. Tudo estava preparado, mas não houve adesão dos comandantes. O que já vinha sendo produzido, com os quartéis, com atos violentos, com o discurso violento e grave ameaça ao Judiciário, isso foi consumado no dia 8 de janeiro. O dia 8 de janeiro foi a tentativa final de concretizar o que havia sido dito pelo réu Jair Bolsonaro lá atrás”, completou.
Somadas, as penas para os crimes de organização criminosa armada, tentativa de golpe de Estado e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, imputados a Jair Bolsonaro e aos demais, podem ultrapassar 40 anos de prisão. Ao final do julgamento, os magistrados definem a chamada dosimetria da pena, e definem qual será o tempo de prisão.
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