Em nove meses de governo, Trump prende 75 mil imigrantes sem antecedentes

O Serviço de Imigração e Alfândega dos Estados Unidos (ICE) deteve mais de 75 mil pessoas sem qualquer histórico criminal nos primeiros nove meses do governo de Donald Trump, segundo dados divulgados neste domingo (7) pela NBC News.

Os números fazem parte do Deportation Data Project, da Universidade da Califórnia em Berkeley, que obteve as informações por meio de uma ação judicial contra a agência.

Entre 20 de janeiro e 15 de outubro, o total de detenções chegou a 220 mil, o que indica que mais de um terço dos alvos das operações migratórias não tinha antecedentes, apesar de a Casa Branca apresentar as ações como iniciativas focadas nos criminosos mais perigosos.

Os dados correspondem apenas às prisões efetuadas pelo ICE e não incluem as operações da Agência de Alfândega e Proteção de Fronteiras (CBP), que neste ano mobilizou equipes em grandes centros urbanos como Los Angeles. 

A exclusão sugere que o número de imigrantes sem histórico criminal detidos pelo governo é ainda maior do que o conhecido até agora.

Segundo o levantamento, cerca de 90% dos detidos pelo ICE até meados de outubro eram homens, com predomínio de mexicanos, guatemaltecos e hondurenhos. Aproximadamente 23 mil pessoas foram classificadas na categoria de deportação voluntária, embora não esteja claro quantas já deixaram o país.

As operações mais amplas, conduzidas em cidades democratas como Los Angeles, Chicago, Washington, D.C. e Boston, registraram proporções muito superiores à média nacional: enquanto o índice de detidos sem qualquer acusação criminal gira em torno de 30% no país

Em Washington, por exemplo, 84% dos detidos nas batidas federais não tinham antecedentes. Em Illinois, o percentual chegou a 66% no período analisado. Em todos os casos, o índice de prisões de pessoas com condenações violentas permaneceu abaixo de 5%.

A proporção de detidos com histórico criminal caiu de 46%, em janeiro, para 28% em outubro, ao mesmo tempo em que o governo ampliou ações de rua após a decisão da Suprema Corte, em setembro, que autorizou agentes federais a usar fatores como raça, etnia, idioma e local de residência para efetuar abordagens.

Organizações de direitos civis apontam que o tribunal, ao validar a política conhecida como roving patrols, institucionalizou o perfilamento racial em todo o território norte-americano.

Desde então, multiplicaram-se relatos de prisões em escolas, aeroportos, tribunais, entrevistas de green card e até em barracas de comida de rua. Em bairros latinos de Los Angeles, moradores denunciam que agentes aparecem mascarados, cercam quarteirões inteiros e detêm pessoas por “aparência estrangeira” ou por falarem espanhol.

A ofensiva nas ruas tem sido acompanhada por uma retórica cada vez mais agressiva do próprio Trump. Em reunião de gabinete na última semana, o presidente afirmou que “somalis são lixo” e que migrantes de “todos os países do Terceiro Mundo” deveriam ser barrados. 

Ele também sugeriu deportar qualquer pessoa considerada “incompatível com a civilização ocidental”. O discurso foi celebrado por assessores, incluindo o vice-presidente JD Vance e a porta-voz Karoline Leavitt, que descreveu o momento como “épico”.

A escalada verbal acompanha medidas administrativas mais amplas. Desde o ataque a dois membros da Guarda Nacional na capital federal na véspera do feriado de Ação de Graças — atribuído a um cidadão afegão, sem motivação estabelecida —, o Departamento de Segurança Interna suspendeu pedidos de imigração de 19 países. 

O Serviço de Cidadania e Imigração reduziu de cinco anos para 18 meses o período de validade de autorizações de trabalho para solicitantes de asilo.

Apesar das justificativas de segurança, especialistas observam que as mudanças tiveram impacto imediato na redução da imigração legal. Para Doris Meissner, ex-diretora da agência de imigração no governo Clinton, “é assim que se reduz a imigração legal sem mudar a lei”.

As diretrizes adotadas por Trump têm sido comparadas por historiadores ao nativismo da década de 1920, quando a Lei Johnson-Reed estabeleceu cotas raciais que restringiram a entrada de judeus, italianos, asiáticos e africanos. 

Para o autor Daniel Okrent, a diferença central é que “os xenófobos daquele período disfarçavam o discurso”, enquanto o atual governo atua de forma aberta e explícita.

A expansão das batidas migratórias tem alterado a rotina de cidadãos norte-americanos, incluindo aqueles com cidadania plena. 

Centenas de relatos reunidos por organizações comunitárias e pela imprensa mostram pessoas dormindo com o passaporte ao lado da cama, carregando certidões de nascimento no carro e evitando espaços públicos por medo de detenções.

Apesar do aumento das operações, autoridades locais afirmam que as batidas não resultaram em maior segurança pública. 

Em diversos estados, prefeitos e líderes comunitários relatam a desestruturação de serviços, queda na confiança da população em denunciar crimes e o surgimento de “zonas de medo” em regiões inteiras.

Artigo Anterior

Cada vez mais xarope, Carlos Bolsonaro detona o Centrão

Próximo Artigo

Organize-se pelo fim da violência contra a mulher e de todo o tipo de opressão!

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter por e-mail para receber as últimas publicações diretamente na sua caixa de entrada.
Não enviaremos spam!