Em meio ao ‘tarifaço’, comércio entre Brasil e EUA marca recorde

A corrente de comércio entre Brasil e Estados Unidos alcançou o recorde de US$ 20 bilhões para os três primeiros meses do ano, de acordo com a Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil), com dados divulgados nesta segunda (14). O crescimento é de 6,6% em relação ao mesmo período de 2024. A notícia contrasta com o atual momento de política externa adotada pelo presidente Donald Trump, que tem sobretaxado as importações feitas ao seu país, o que pode prejudicar a continuidade das relações comerciais.

O Brasil recebeu uma taxa horizontal para todos os seus produtos de 10%, excluindo aço e alumínio, que já estavam com uma taxa ainda maior, de 25%. O ‘tarifaço’ de Trump chama a atenção em relação ao Brasil porque os EUA registraram superávit de US$ 654 milhões no trimestre, segundo a Amcham.

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Tarifaço pode frustrar Trump e abrir oportunidades para emergentes como o Brasil

E esta foi a principal argumentação da diplomacia brasileira na negociação das taxas: os EUA obtêm vantagem em relação ao Brasil, a despeito de os norte-americanos terem prejuízo com outros países, em especial à China.

Ainda que o Brasil tenha ficado na faixa dos países que receberam a menor taxação, é questionável gerar um ruído em uma relação em que se tem vantagem. Pois é isso que Trump tem feito e pode resultar em um verdadeiro ‘tiro no pé’ caso os outros países encontrem soluções entre si para substituírem as relações com os EUA.

No caso brasileiro, até mesmo o Congresso Nacional de tendência conservadora e, em partes, subserviente à política dos EUA, deu celeridade à aprovação de mecanismos que oferecem ao governo Lula o poder de retaliar países com taxas abusivas de importações.

Ao Portal Vermelho, o professor de economia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Marcelo Fernandes, avalia que o ‘tarifaço’ de Trump pode prejudicar a corrente comercial entre os países.

“É provável que haja uma redução, sim. Se de fato isso ocorrer [o tarifaço] é ruim tanto para os Estados Unidos quanto para o Brasil. É preciso esperar os efeitos desta medida e observar se Trump irá manter. É preciso frisar que esta política é um nonsense do ponto de vista de Washington. Os Estados Unidos têm restrição externa zero porque suas importações e dívidas são liquidadas em dólares. É o único país nesta condição porque emitem a moeda-chave do sistema. Por isso, sem maiores problemas, os Estados Unidos vêm apresentando déficits em transações correntes do seu balanço de pagamentos há décadas”, diz o professor.

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A situação de déficit dos EUA, ainda que não seja em relação ao Brasil, é uma questão que Trump agora quer reduzir. Mas como lembra Fernandes, por deter o monopólio do dólar, o país tem um endividamento de décadas que não pode ser resolvido de forma intempestiva.

“Por exemplo, entre 1982 e 2024, somente em 1991 apresentou um pequeno superávit de US$ 2,9 bilhões nesta conta.  Quanto à balança comercial, a última vez que ele apresentou superávit foi em 1975. Ou seja, há cinquenta anos! E mais: desde 2021 este déficit tem sido superior a US$ 1 trilhão. É claro que estamos falando de uma questão estrutural que não pode ser resolvida de uma hora para outra, mesmo que os Estados Unidos realmente precisassem, o que não é o caso dado papel singular que o dólar desempenha no sistema internacional”, explica Fernandes.

Marcelo Fernandes. Foto: Arquivo

Para ele, é necessário aguardar como os preços passarão a se comportar nos próximos meses para fazer uma avaliação mais concreta sobre como a relação com o Brasil irá ficar.

“É preciso observar os preços das commodities no mercado internacional nos próximos meses, já que este é um item essencial para as exportações do Brasil, e se realmente acontecerá uma redução do fluxo comercial bilateral, em quanto será a redução e observar se o Brasil consegue aumentar seu fluxo de comércio com outros países”, entende.

Sobre a postura da diplomacia brasileira no tema, o professor da UFRRJ avalia que a condução realizada “sem estardalhaço” tem sido o melhor caminho: “O mecanismo utilizado pelo Brasil é o melhor instrumento, eu diria o único se o objetivo é resolver pelas vias diplomáticas.”

Para Fernandes, Trump acena com essas tarifas ao seu eleitorado extremista, porém tende a recuar com a pressão feita por produtores que tem a perder com a situação: “Mas o que quer Trump? Desconfio que esta loucura toda seja para atender parte do seu eleitorado. O problema é que certos setores produtivos norte-americanos têm muito a perder com isso. Daí a tendência é que aos poucos ele vá desmontando esta política que, aliás, ele já está fazendo ao excluir o setor de eletrônicos da China das tarifas”, conclui.

Produtos

Conforme a Câmara Americana, no trimestre as exportações brasileiras se destacam em Sucos (com alta de +74,4% em relação ao mesmo trimestre de 2024); Óleos combustíveis (+42,1%); Café não torrado (+34%); Aeronaves (+14,9%) e Semiacabados de ferro ou aço (+14,5%). Outro destaque é a carne bovina que voltou a aparecer entre os dez produtos mais comercializados, na nona colocação e alta de 111,8%.

Já as importações de produtos dos EUA pelo Brasil se destacam por bens manufaturados (alta de 89,2%), com destaque para máquinas, medicamentos, petróleo e equipamentos de processamento de dados, além de petróleo bruto.

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