Finalmente, saiu das sombras a contratação do italiano Carlo Ancelotti como treinador da Seleção Brasileira de futebol.

Os capítulos da novela davam a pista do desfecho, uma vez que a permanência do técnico no Real Madrid seguia indefinida e a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) mantinha silêncio em torno do assunto.

O desfecho da trama acabou sendo tumultuado, dada sua coincidência com o fim da temporada europeia.

Pegou mal para o treinador italiano ter seu nome anunciado como técnico da nossa Seleção na véspera do maior clássico do campeonato espanhol, Real Madrid vs. Barcelona, quando o time madrileno ainda tinha chances de ­disputar o título nacional – que, agora, parece “cair nos braços” do Barça.

Obviamente, não há nada demais no fato de Ancelotti receber – e aceitar – propostas para mudar de equipe.

Mas o anúncio precipitado pela entidade brasileira, a duas rodadas do fim do ano no clube europeu, deixou o técnico em “maus lençóis”.

E não podemos deixar de atribuir esse timing complicado à situação instável do presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues, cuja permanência no cargo está sob ameaça judicial.

O fato é que foi mesmo ruim o capítulo final da novela do técnico com o Real Madrid e o início de sua nova fase de vida no futebol brasileiro.

O mais valorizado treinador do momento no futebol mundial vai ter problemas em seu início no futebol brasileiro exatamente pela instabilidade da direção da CBF, há muito tempo envolvida em problemas com a Justiça.

Essa situação vem de longe, mas, por conta da supervalorização do futebol, ninguém quer deixar a “mina de ouro” e tudo vai sendo conduzido pelas sombras.

Se tudo estivesse correndo às mil maravilhas, não haveria mal em se contar com um treinador reconhecido como o mais vencedor da atualidade para dirigir a seleção mais vencedora do mundo. Mas não é esse o caso.

Fica a sensação de que se está começando a construir um palácio pela colocação das antenas. Isso sem mencionar aqui os tão comentados custos astronômicos dessa contratação.

A equipe mais vencedora deste lado do mundo é, neste momento, a da Argentina. A meu ver, isso se deve também ao fato de ser um país que mantém os pés no chão, sem se meter nessa onda de megalomania que marca o futebol contemporâneo.

Agora caberá ao próprio Ancelotti conseguir trabalhar em meio a esse ambiente inseguro da Seleção. Se der certo, deu. Se não der, adeus, e ficamos nós no meio dessa guerra.

De qualquer modo, o novo treinador, ganhador de cinco títulos da Champions League, já demonstrou sua sagacidade ao começar por fazer contato com seus velhos conhecidos Casemiro e Neymar – com o primeiro ele tem proximidade, e o segundo é o maior nome entre os jogadores brasileiros do momento.

Ou seja, ele começa a costurar a consistência do grupo de jogadores. Como já declararam alguns comentaristas, Ancelotti acaba por ser a esperança no meio do caos.

Carlos Eduardo Mansur, em seu blog no Globo Esporte, escreveu: “Ancelotti foi contratado para tentar entregar o mais incerto e incontrolável dos objetivos: ganhar uma Copa. Ele e Ednaldo serão julgados por resultados. A Seleção pode ser campeã e, ainda assim, o futebol brasileiro pode não sair vencedor”.

O que ele quer dizer é que, dadas as circunstâncias, não teremos encarado erros históricos que nos impedem de avançar em termos de consistência.

O mesmo Mansur, antes, havia escrito que “a Seleção se tornou um lugar em que todos parecem piores do que realmente são”. A instabilidade se reflete também nos nossos campeonatos internos.

Seguem por aqui as discussões em torno das relações entre dirigentes e treinadores. Os números ajudam a dimensionar a confusão: apenas nas oito rodadas iniciais do Brasileirão, sete cartolas ou técnicos foram demitidos.

É com esse cenário nebuloso que Carlo Ancelotti terá de aprender a lidar. •

Publicado na edição n° 1362 de CartaCapital, em 21 de maio de 2025.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Em maus lençóis’

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Last Update: 15/05/2025