Brasileiros e brasileiras estarão submetidos à interferência inédita da inteligência artificial (IA) durante as eleições municipais de outubro. A partir desta sexta-feira (16), começam as propagandas eleitorais em todo o país, com encerramento previsto para o fim de setembro. Ainda sem regulação pelo Congresso Nacional, o uso disseminado da nova tecnologia preocupa autoridades e especialistas.
Levantamento feito pelo site Aos Fatos – em parceria com o Instituto Conhecimento Liberta (ICL) e com o Centro Latinoamericano de Investigação Jornalística (Clip) – revelou que 32% dos casos relacionados à utilização de IA e apreciados pela Justiça Eleitoral, no primeiro semestre de 2024, continham irregularidades. Tais números expõem as vulnerabilidades das regras firmadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em fevereiro, ainda carentes de jurisprudência.
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“A gente não tem uma linha de conduta ainda muito clara. A gente não tem sequer doutrina, um material escrito e pesquisadores já consolidados, menos ainda decisões judiciais. Esse é um problema com o qual nós vamos ter que nos deparar”, pondera Elton Ghersel, subprocurador-geral da República e coordenador do Grupo Executivo Nacional da Função Eleitoral (Genafe).
Frente a falta de disposição do parlamento para regulamentar as big techs, o governo Lula tem adotado as medidas possíveis no intuito de mitigar os impactos negativos da IA na democracia brasileira. Chefiada por Wadih Damous (PT), a Secretaria Nacional do Consumidor emitiu, na semana passada, nota técnica exigindo das grandes empresas de tecnologia o mesmo nível de transparência e publicidade que são obrigadas a praticar na Europa.
Recentemente, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) lançou o Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA). São R$ 23 bilhões em investimentos para tornar o país referência mundial em IA, especialmente no setor público. O PBIA prevê a construção de um supercomputador capaz de processar grandes volumes de dados e de desenvolver algoritmos avançados.
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“[O filme] revelou, por exemplo, o quanto a política de privacidade praticada pelas gigantes corporações tecnológicas estrangeiras encontra-se subordinada aos interesses das próprias potências mundiais”, pontuou. “Escancara, assim, a realidade das nações dependentes acomodadas na posição passiva do mero consumismo importador”, completa.
O presidente do IBGE considera o PBIA “uma excelente oportunidade do país deixar de ser mais um simples mercado consumidor-importador de bens e serviços digitais e produtor-exportador de dados brutos às big techs assentadas no modelo de negócio da datificação”.
“Iletramento digital”
Estudo concluído pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) coloca o Brasil em último lugar na lista de populações com mais capacidade de discernir notícias falsas de verdadeiras. A pesquisa da OCDE entrevistou 40 mil pessoas de 21 países, entre eles, Estados Unidos, Japão, Austrália, Reino Unido, Finlândia, Noruega, Itália, Portugal e Países Baixos.
“No último quarto do século 20, o Brasil assumiu a condição de sociedade urbana de massa com ampla parcela de sua população analfabeta, cujo acesso generalizado à indústria cultural resultou nas consequências que ainda marcam a realidade da democracia brasileira”, explica Pochmann, para quem as fake news minam as instituições democráticas. “A União Europeia já se deu conta disso, possuindo importante política de combate às mentiras e às notícias falsas.”
A União Europeia (UE) estabeleceu novas regras para fornecedores e utilizadores de IA. O bloco reconhece os benefícios da tecnologia, mas pretende garantir que o uso seja seguro, transparente, rastreável, não discriminatório e sustentável. A chamada “Lei de IA” deve entrar em vigor em 2026.
Rédeas soltas
Há quase uma semana, o Google foi considerado um monopólio das buscas online pela justiça estadunidense, que deve decidir com quebrá-lo em breve. Na avaliação do advogado Caio Machado, pesquisador da Universidade de Oxford e especialista em direito digital, o caso deve abrir precedentes para se questionar as políticas de privacidade das empresas de tecnologia, algo que ele vê como necessário.
“É muito importante esse escrutínio aumentar sobre todas elas. O escrutínio é essencial, porque a assimetria de poder é muito grande em todos esses mercados”, afirma Machado, em entrevista ao Estadão. “Abrir precedente com essa decisão contra o monopólio de busca do Google abre margem para outros questionamentos, ainda mais considerando o momento social e político de maior antipatia em relação às big techs, algo que não existia há 10 anos”, conclui.
No Brasil, o Congresso Nacional trata o tema com rédeas curtas. O Projeto de Lei (PL) 2.338/23, de autoria do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), segue parado na Comissão Temporária Interna do Senado sobre Inteligência Artificial. Enquanto a ala bolsonarista tenta derrubá-lo, o lobby das empresas de tecnologia trabalha para convencer deputados e senadores de que o PL garante direitos em excesso aos usuários das plataformas.
Da Redação, com MCTI, ICL Notícias, Agência Brasil, Senado, Nexo, Estadão, União Europeia