Maria Clara, do Rebeldia USP/CAELL
Após o 60º Conune (Congresso Nacional da UNE – União Nacional dos Estudantes), retornamos à USP para o segundo semestre com as eleições do DCE (Diretório Central dos Estudantes), um momento fundamental para fortalecer o movimento estudantil. Assim como fizemos na UNE, ao construir a Oposição de Esquerda (OE) unificada, é essencial que organizemos uma chapa da OE que reflita a luta contra o governismo e defenda a independência do movimento estudantil.
A situação da juventude trabalhadora na USP
O segundo semestre de 2025 começa com grandes desafios para o movimento estudantil. A USP vem sendo desmontada há anos por um projeto de privatização e precarização da educação em São Paulo e no Brasil. Isso se expressou de maneira evidente na greve de 2023 que, embora vitoriosa, deixou questões em aberto que precisam de respostas, como a própria contratação de professores, a permanência estudantil, as cotas trans, cotas PCDs (Pessoas com Deficiência), vestibular indígena e a ausência de um projeto de universidade que atenda à classe trabalhadora, aos LGBTs, mulheres e povos indígenas.
A permanência estudantil é afetada pela redução de bolsas, seu aumento irrisório que não acompanha a inflação, a situação crítica do CRUSP (Conjunto Residencial da USP) e bandejões terceirizados com condições de trabalho degradantes. A violência e insegurança atingem especialmente mulheres e pessoas trans e trabalhadoras terceirizadas. Reformas curriculares e a adesão ao ENADE (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes), impostas sem diálogo, revelam um projeto autoritário que subordina a universidade aos interesses do mercado.
Sob o pretexto de “estimular a inovação”, a USP promove eventos, parcerias e disciplinas conveniadas com bancos e multinacionais, vendendo a ideia do empreendedorismo. Diante de um mercado de trabalho precarizado, do desemprego, da escala 6×1, de Uber e iFood, em que o diploma não assegura emprego ou estabilidade, o fracasso é culpa do indivíduo e quem não “vence” é porque não se esforçou ou não inovou o suficiente.
Essa forma de ser da USP é o projeto político voltado para gerar mão de obra barata, ideias e tecnologias para o mercado, como já vemos acontecendo com o Novo Ensino Médio (NEM), que Lula não revogou. Agora, a USP dá o passo de também se adaptar à precarização geral da vida da classe trabalhadora, com uma reforma curricular sem consulta à universidade.
Privatização e orçamento: o papel de Tarcísio e Lula
Em São Paulo, o governador Tarcísio avança na privatização da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), e junto com Lula, via BNDES, vende as escolas públicas. Há um projeto mais amplo de privatização da educação que perpassa os convênios com empresas que direcionam pesquisas e tecnologias para interesses privados, como bolsas da Santander, e promoção de ideologias meritocráticas.
Para responder a pressão do movimento estudantil e de mulheres, que realizou diversas manifestações em 2024 contra a violência de gênero, a USP cria o SUA – Sistema USP de Acolhimento, via PRIP ( Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento), como ferramenta de registro e responsabilização para casos de assédio, violência e discriminação. Na verdade, a PRIP protege os agressores nas unidades, bem como propõe a instalação de grades no CRUSP. Precisamos de um projeto de segurança construído junto a todo o corpo universitário, que começa com o fim da PM no campus, não mais descaso e repressão.
O orçamento das universidades estaduais é insuficiente, porque não é assegurado o repasse de verba necessária pelo governo do Estado. Ao mesmo tempo, o orçamento da USP permanece um grande mistério: o “livro de contas” segue fechado, ou seja, não sabemos o que é feito com o dinheiro repassado à universidade – que conta com R$ 6 bilhões em caixa. Ao invés da reitoria e da burocracia da USP decidirem tudo de cima para baixo, defendemos eleições diretas para reitor e proporcionalidade nos colegiados, para que tenhamos uma universidade a serviço dos trabalhadores, controlada por nós.
Tudo isso se combina ao Arcabouço Fiscal do governo Lula, que congela investimentos sociais para garantir o pagamento da dívida e os lucros de banqueiros e empresários. Com o corte de R$ 2,5 bilhões – tendo restituído apenas R$ 500 milhões – e a presença do terceiro maior bilionário do país, Jorge Paulo Lemann, no MEC, aplica-se um projeto capitalista, contra a Educação Pública. Hoje, os currículos das licenciaturas são adaptados ao NEM para enquadrar toda a educação na precarização do trabalho.
Defendemos outro projeto: de enfrentamento aos bilionários, bancos e empresários, uma USP 100% pública. Precisamos abrir as contas da universidade e decidir coletivamente sua aplicação, barrar a privatização e lutar por mais recursos para a educação pública derrotando o Arcabouço Fiscal, pela construção de uma USP por estudantes e trabalhadores.
A UNE e o imobilismo a serviço do governismo: qual o papel do DCE USP?
A União Nacional dos Estudantes atualmente não cumpre o papel histórico que poderia ter na organização estudantil frente aos desafios das universidades. A direção majoritária da entidade, composta pela UJS/PCdoB, coletivos do PT, Levante Popular da Juventude e agrupamentos vinculados ao PDT, PSB e Rede Sustentabilidade, com a incorporação da Juventude Sem Medo (Afronte, Rua, Travessia, Fogo no Pavio), transformou a UNE em correia de transmissão e apoio do Governo Federal. Seu projeto é imobilista e governista, incapaz de enfrentar o governo e a extrema direita. No 60º Conune, com a presença de Lula, a majoritária se comprometeu com o apoio ao governo que promove cortes na educação via arcabouço fiscal, privatização e mantém relações com Israel. Essa mesma majoritária já foi gestão do DCE da USP de 2017 a 2022, derrotada em 2022 e 2024 pela chapa da Oposição de Esquerda (OE).
Atualmente, o DCE da USP é uma gestão híbrida: conta com a OE (Correnteza e Juntos), campo que compomos na UNE, e também inclui a JSM (Afronte), recentemente incorporada à Majoritária. Como um híbrido, a gestão atual do DCE é marcada pela falta de coesão, sem conseguir dar resposta à altura na USP ou uma ação que vá além da universidade.
Apesar de alguns avanços, como a luta por cotas trans, a ocupação do Bloco K em prol da pauta e a criação da Sala Lilás, essas ações foram realizadas fundamentalmente pelo Correnteza. Opinamos que deveriam ser construídas com os coletivos e centros acadêmicos dos cursos, juntando toda a base do movimento estudantil, o que de fato não ocorreu pela direção do DCE. É fundamental que o movimento estudantil esteja firmemente ancorado em sua base, com a criação e fortalecimento de comissões formadas pelos próprios estudantes, realização constante de assembleias. Apostamos no princípio da democracia de base e auto-organização, para construir um movimento estudantil com unidade e ação ampla nas lutas.

Ocupação do bloco K na luta por cotas trans
Pela unidade da OE da UNE no DCE!
Assim como na UNE, defendemos que ter uma gestão do DCE da OE fortalece, apesar das nossas diferenças, um campo político na USP de independência e luta, que pode fazer uma gestão superior, ancorada na maioria dos Centros Acadêmicos. Nós, do Rebeldia, achamos que a atual gestão do DCE foi insuficiente diante das tarefas que o movimento estudantil precisa enfrentar e fomos oposição à gestão no último ano. Nossa crítica é sempre no sentido de buscar a unidade nas lutas, e não de fragmentar ainda mais o movimento, o que só favorece o governismo. Temos diferenças com os setores da OE que definem apoiar criticamente o governo Lula ou se omitem em criticar seu projeto de conjunto, mas achamos que essas diferenças não impedem nossa aliança para o DCE.
No CAELL (Centro Acadêmico de Estudos Linguísticos e Literários), estamos dando desenvolvimento às comissões de base criadas durante a grave, com o fórum de letras, envolvendo os diferentes departamentos, que aprovamos no último congresso do curso. Propusemos e realizamos a primeira paralisação climática na USP, um marco na universidade para darmos respostas à crise ambiental. Também enfrentamos a proposta de reforma curricular, contra a adaptação do currículo às exigências do mercado de trabalho precarizado,
Temos sido, além disso, protagonistas na construção e defesa de coletivos anti-opressão nos cursos, reconhecendo a importância da permanência de setores historicamente marginalizados e oprimidos. Na EACH (Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo), fomos parte da luta política de justiça por Bruna e realizamos uma oficina de autodefesa junto do Movimento Mulheres em Luta (MML) pela auto-organização dos setores oprimidos. Na Sanfran, temos batalhado pela retomada do movimento estudantil contra a gestão governista e institucional do XI, tendo realizado mesas de debate sobre a Palestina com Soraya Misleh (Frente Palestina/PSTU) e fortalecido espaços de auto-organização estudantil. No maior ato de rua em São Paulo pela Palestina do último período, em 15 de junho, construímos um bloco independente, junto com outras organizações, como a UJC/PCBR, unindo ESPPs e CAs da FFLCH em uma ação política que reflete nosso compromisso com a solidariedade internacionalista e com a luta para que Lula rompa relações com Israel.
A Faísca/MRT, sem nenhuma autocrítica, deu um giro de 180° na sua política. Após insistirem num chamado para a construção da “oposição da oposição”, passam a defender a unidade da OE. Acreditamos que é um passo importante, já que a constante demarcação enfraquece o combate ao governismo e imobilismo da majoritária e confunde sobre quais os campos em disputa. Agora, precisam demonstrar que se trata de uma política séria que podemos confiar, já que até então igualavam a OE à majoritária e, contra nós, sustentam uma postura de calúnias, provocações e mentiras.
Nossa prioridade é construir um programa coletivo que una as diversas forças de oposição. Nas eleições do Conune, a majoritária não ganhou por 100 votos. Se tivermos à frente do DCE uma gestão governista, significará uma lástima para a luta por nossas pautas. Estamos por superar a fragmentação das eleições do Conune, por isso, fazemos o chamado para uma chapa comum da oposição de esquerda na UNE – Juntos, Correnteza, UJC/PCBR e Rebeldia – com o objetivo de construir um ME que represente verdadeiramente as demandas dos estudantes, em especial os jovens trabalhadores, com independência para enfrentar a extrema direita e o governo Lula.
Por uma chapa unificada da Oposição de esquerda!
Construir uma gestão de DCE com independência da reitoria e governos!
Por um movimento estudantil que enfrente Tarcísio, a extrema direita e o governo Lula!
Por uma universidade a serviço da classe trabalhadora!