O artigo Tarcísio derreteu em 2025; e 2026 promete ser ainda pior, de Maurici de Morais, publicado no Brasil 247 nesta terça-feira (2), é mais um texto que lida mais com desejo e futurologia do que com os dados concretos da realidade.
Outra característica do texto, e pode-se dizer que está se espalhou pela maioria da esquerda, é a mania de tratar a política como caso de polícia.
Em seu parágrafo inicial, Morais diz que “o ano de 2025 foi para o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, riscar da memória. Poucas vezes se viu um político tropeçar tanto em tão pouco tempo. Resta saber se a máscara de ‘gestor público eficiente’, construída ao custo de muito marketing pessoal, resiste até 2026. Se eu tivesse que apostar, diria que não”.
Quem aposta arrisca perder. Tarcísio governa para a burguesia, para o sistema financeiro. Sendo assim, para quem sua imagem derreteu? Tudo indica que esteja em alta, visto que aparece como forte candidato da burguesia para as próximas presidenciais, de quem está negociando apoio de Bolsonaro.
Ilusão
Em seu segundo parágrafo, Morais escreve que “a crise mais recente envolve a prisão de Daniel Vorcaro, dono do Banco Master. A instituição entrou em liquidação e vai deixar um rastro de prejuízo. Mas há um detalhe nessa história sobre o qual pouco se falou: a proximidade do governador com essa turma, que agora está na mira da Polícia Federal”.
Temos aí a primeira ilusão do articulista: a de que a Polícia Federal seja uma entidade neutra que existe para combater o crime. Por outro lado, para que fique algum “rastro de prejuízo”, será necessário que a imprensa dê muita visibilidade às eventuais falcatruas de Tarcísio, e isso só vai acontecer dependendo que estiver em jogo. Prevalecerão os interesses do grande capital.
Crimes e crimes
O deputado petista gasta boa parte de seu artigo explicando crimes e atividades suspeitas envolvendo Daniel Vorcaro, dono do Banco Master, com Tarcísio de Freitas.
São doações para campanha, privatizações, contribuições generosas, Faria Lima, mais gente na “mira” da Polícia Federal, fintechs, PCC etc.
Não bastasse tudo isso, segundo o texto, “outra bomba pronta para explodir está na Secretaria de Finanças do governo Tarcísio. Em agosto, uma investigação do Ministério Público descobriu o que pode ser um dos maiores escândalos de corrupção da história de São Paulo: um esquema bilionário de liberação ilegal de créditos de ICMS”.
Se existe uma bomba pronta para explodir, também existe muita gente pronta para a desativar. O próprio autor escreve que “Sidney Oliveira, dono da Ultrafarma, e Mário Otávio Gomes, diretor da Fast Shop, chegaram a ser presos”. Porém, ambos já foram soltos, ao contrário do “auditor fiscal, Artur Gomes da Silva Neto”, que “também acabou atrás das grades e agora negocia um acordo de delação premiada que deve revelar bastidores do esquema”.
Maurici poderia se perguntar do porquê de dois figurões terem sido soltos, exceto o auditor. Será que o propósito é mesmo revelar os “bastidores do esquema”, ou fazer uma “delação” que garanta que nada de importante seja dito?
Maurici de Morais tem a esperança de que se o auditor “cumprir a promessa, a expectativa é que a investigação se aproxime ainda mais do núcleo de confiança de Tarcísio. A liberação de créditos de ICMS não é feita sem aval político. Se teve autorização, a decisão partiu de alguém, no mínimo, próximo ao governador”.
É curioso notar a ênfase que o articulista dá a escândalos. O Brasil já teve políticos cujo slogan era o de “rouba, mas faz”. E políticos não são presos necessariamente por cometerem crimes. Na ausência de algum, o Judiciário inventa. Basta ver o que acontece com Lula na Operação Lava-Jato.
Apoio de Bolsonaro
Jair Bolsonaro foi preso não porque tivesse de fato tentado um golpe de Estado. Sua prisão também não tem nada a ver com crime ou justiça; tem a relação com as próximas eleições. A burguesia está tentando um acordo com o ex-presidente, pois este acumulou muito capital político e, ao lado de Lula, é quem mais tem votos no País.
Em vez de focar nos acordos, nas movimentações da burguesia, Morais diz apenas que “com o novo revés de Bolsonaro, Tarcísio se apressou em reafirmar suas juras de fidelidade ao padrinho político, como parte da estratégia para herdar o eleitorado radical da extrema direita e manter viva a ambição de voos mais altos. Pode ser que os dois afundem juntos nessa barca furada”.
Não fica explicado em que seria uma “barca furada”. Também não faz sentido sua afirmação de que “busca por apoio na ‘familícia’ já corroeu a imagem de moderação que Tarcísio tentava vender. E que “ao mesmo tempo, os escândalos policiais que se acumulam ao seu redor ainda vão cobrar um preço alto do governador”.
Ainda falta muito para as eleições. A “corrosão” da imagem de um político significa pouco. Na verdade, para Tarcísio, ou quem quer que seja de fato o candidato da burguesia, basta chegar ao segundo turno das eleições para que tenha boa chance de se eleger. Se o candidato petista não vencer no primeiro turno, pode ser que não sobreviva, pois a tendência é que a direita toda se una em uma segunda rodada.
A história cobra?
Maurici de Morais que “Tarcísio chega ao último ano de mandato com um governo fraco, que mais errou do que acertou, e ficará marcado na história por privatizar a rodo o patrimônio público”. Fernando Henrique Cardoso, que privatizou e destruiu a indústria brasileira, é muito bem tratado pela grande imprensa, que o tem como “grande intelectual”.
A esquerda precisa parar de fazer análise política usando o desejo, e não dados concretos, como base para seus prognósticos.
Dizer que “o ano de 2025 foi devastador para Tarcísio de Freitas. E, diante do que ainda está por vir, 2026 tem tudo para ser ainda pior”. Não passa de achismo. A burguesia foi capaz de prender Bolsonaro e alguns generais, ou seja, está determinada a atingir seus objetivos: colocar na presidência alguém privatize e arrase a economia brasileira em prol dos interesses do grande capital. Se não for Tarcísio, será outro, tudo vai depender de como se desenvolverão as negociações.
“Derreter” Tarcísio não vai solidificar a candidatura de Lula. Se o PT pretende reeleger o presidente vai ter que fazer muito mais. E é bom que se prepare para a guerra, pois é disso que se trata.