E o segundo livro, como foi?
por Izaías Almada
Há algumas semanas tive a oportunidade de escrever aqui sobre o meu primeiro livro (A Metade Arrancada de Mim/1988), cuja narrativa tem me animado – pelos dias que correm no país – a reeditá-lo.
Três anos depois (1991), ainda apoiado pela Editora Estação Liberdade e pelo professor e editor Jiro Takahashi, após extensa pesquisa sobre a Inconfidência Mineira, consegui que fosse editado o meu segundo livro: “O Medo Por Trás das Janelas”.
Ao escolher o tema, deparei-me com um desafio que – na minha ingenuidade de escritor noviço – não me dera conta. Qual?
Nascido nas Minas Gerais eu tinha, como muitos de meus conterrâneos aquele orgulhozinho de pertencer a um Estado que foi palco da mais célebre tentativa de independência em relação a Portugal: a Inconfidência Mineira.
A literatura sobre esse marco histórico da formação do nosso país, incluída a didática, era extensa, mas minha intenção era criar uma obra ficcional, uma narrativa baseada sim em fatos históricos, mas condimentada com o sabor do pensamento e da ação de seus principais intervenientes no dia a dia de suas atividades mais comezinhas.
Metido eu, não caro leitor? Como fazer?
Foi quando me dei conta do desafio acima citado…
Para que a ficção, nesse caso, fizesse sentido seria preciso ler, estudar, refletir sobre as relações Portugal/Brasil. Sobre o que queria a coroa portuguesa e o que pensavam os portugueses já abrasileirados, em tempos de Revolução Francesa. O ano: 1789.
Dois séculos depois, dediquei-me, durantes os anos de 1989 e 1990, a ler o que mais pudesse sobre a Inconfidência Mineira. A descoberta e a leitura de um livro me levaram à leitura de outros.
Obras que iam de “A Época Colonial” de Sérgio Buarque de Holanda a “Tiradentes, a Áspera estrada para a Liberdade”; de “Poesias/Cartas Chilenas”, publicação do Instituto Nacional do Livro ao “Romanceiro da Inconfidência” de Cecília Meireles; de “Um médico do Brasil Colônia”, escrito por José Thomaz Nabuco a “A Devassa da Devassa” do historiador inglês, o brasilianista Kenneth Maxwell… E mais alguns.
Fui aos poucos dando tratos à bola, mesmo inseguro, anotando ideias que me dessem um caminho a seguir…
Descoberta a trilha por onde seguir fui ganhando confiança e misturando personagens fictícios com alguns dos nomes sonantes e reais de Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antonio Gonzaga, Alvarenga Peixoto e sua mulher Bárbara Heliodora, Oliveira Rolim, Silvério dos Reis e o mais conhecido deles, Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.
Qual não foi meu alívio ao ler o texto do professor de Linguística e Literatura na Unicamp e também na Georgetown University em Washington DC, Haquira Osakabe, ao escrever numa das orelhas do livro o seguinte texto: “Um escritor que não minta, mas não diga a verdade (ou vice-versa) está fadado ao silêncio. Assim é que se pode pensar a escrita ficcional como resultante deste impulso paradoxal: compreender-se com um mal apenas presumível, vale dizer, comprometer-se com uma mentira viável”.
“O caso mais patente desse paradoxo está na clássica relação entre a História e a ficção. De fato, modulando a História que, no sábio dizer da grande escritora portuguesa Agustina Bessa Luís, é uma “ficção controlada”, a ficção histórica vem a ser a ficção dessa ficção. Portanto vem a ser a História sem as amarras da averiguação. Como fazê-la – essa História que se nega sua, no entanto, deixar de ser História?”.
“Izaías Almada nos dá com este seu “O Medo por Trás das Janelas” uma excelente resposta: tomando como reais presumíveis um relatório secreto, o processo da produção das Cartas Chilenas e uma bem concebida entrevista de Tomás Antonio Gonzaga, o autor monta a estória mais comezinha e cotidiana que poderia ter sustentado o mítico episódio da Inconfidência”.
“Uma História sem grandezas? Sim. Mas com uma alma que densifica as fraquezas e dá algum sentido a qualquer fracasso. Com isso, o autor acaba por efetuar aí uma contundente análise dos fatos e do caráter humanos que, por definição, a História não alcançaria”.
“Com Izaías, neste romance, tem o leitor brasileiro a saudável impressão de que temos uma literatura com História, com o estofo que só a sábia sedimentação do tempo poderia consistir. É como em Portugal o fazem com maestria um Saramago e a já citada Agustina Bessa Luís”.
Além disso, esta obra vem confirmar as qualidades de ótimo narrador de Izaías Almada, já revelada em seu primeiro romance “A Metade Arrancada de Mim”.
(CONTINUA)
Izaías Almada é romancista, dramaturgo e roteirista brasileiro nascido em BH. Em 1963 mudou-se para a cidade de São Paulo, onde trabalhou em teatro, jornalismo, publicidade na TV e roteiro. Entre os anos de 1969 e 1971, foi prisioneiro político do golpe militar no Brasil que ocorreu em 1964.