A eliminação da produção de fibras de amianto no Brasil é uma batalha que se arrasta há cerca de meio século e pode terminar no dia 14 de agosto de 2024, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) voltar a analisar o tema. O mineral, prejudicial à saúde e de difícil controle ambiental, é também apontado como o responsável por aproximadamente 50% das mortes de trabalhadores por câncer em todo o mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). O amianto teve a sua extração, industrialização, utilização e comercialização banidas em todo território nacional por decisão do STF em 29 de novembro de 2017.
As fibras de amianto podem atingir os pulmões, causando lesões cujas cicatrizes vão se calcificando, como ocorre na doença conhecida como asbestose ou fibrose pulmonar crônica. O processo pode durar décadas e terminar, quase que invariavelmente, com a incapacidade de o portador respirar. O amianto é uma fibra reconhecidamente cancerígena, podendo causar câncer na laringe, nos pulmões, no estômago, no ovário e até formas mais complexas e sem tratamento, como o mesotelioma, cuja sobrevida após o diagnóstico raramente ultrapassa dois anos.
Passados sete anos da decisão do STF, a questão volta a ser analisada pela Corte em razão da Lei do Estado de Goiás nº. 20.514, aprovada pela Assembleia Legislativa e promulgada pelo governador Ronaldo Caiado em 16 de julho de 2019. O dispositivo, que permite a extração de amianto para exportação, contraria o posicionamento anterior do próprio Estado de Goiás, que foi autor de uma antiga ação direta de inconstitucionalidade contra a primeira lei do Estado de São Paulo, de 2001, que proibia a exploração do mineral. Naquela ocasião, alegou-se que os estados não poderiam legislar sobre mineração, tema privativo da União. A tese foi vencedora e derrubou a lei paulista.
Anos mais tarde, em medida que se choca com a decisão do STF em 2017 e contradiz os argumentos sobre a competência para legislar em mineração, Goiás aprovou lei que permite a extração de amianto em seu território. A medida favorece a única mineração de amianto no Brasil, a mina de Cana Brava, em Minaçu (GO), de propriedade do grupo Eternit, para fins “exclusivamente de exportação”. Foi o que permitiu sobrevida do último empreendimento de exploração do mineral da morte nas Américas.
Os ministros do STF apreciarão, no próximo dia 14 de agosto, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6200) ajuizada pela Associação Nacional dos Procuradores e Procuradoras do Trabalho (ANPT). O debate sobre a abolição do amianto, porém, já foi superado pela Corte nos julgamentos das ADIs 3356, 3357, 3937, 3406, 3470 e na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 109. O banimento do amianto no país, decidido em 2017, está em sintonia com a Convenção 162 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que, desde 1986, alerta que o produto compromete a saúde de trabalhadores e de todos que têm contato com a fibra, até mesmo eventualmente, bem como a OMS, que defende que a única forma de se evitar as doenças relacionadas ao amianto é a descontinuidade do seu uso.
O que está em discussão é o direito de uma empresa seguir nessa atividade nociva, que gera danos ao meio ambiente, à saúde e à vida de trabalhadores e trabalhadoras, população e ao meio ambiente.
A luta dos trabalhadores contra a morte pelo amianto se arrasta desde o final da década de 1970. Ela se apoia na criação de diversas associações regionais de vítimas do amianto, coordenadas pela Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea), que estimularam a criação de uma série de leis estaduais e municipais que proíbem desde o uso, exploração, industrialização e até mesmo a circulação de produtos de amianto em seus territórios.
Afinal, a única medida conhecida para prevenir o desenvolvimento das doenças é o banimento definitivo do amianto. Essa é a questão que se apresenta à Corte Suprema do Brasil e que, espera-se, siga o entendimento pacificado por muitos outros países.