Realizada em Baku, no Azerbaijão, a conferência da COP29 revelou a profunda divisão entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento, com os primeiros insistindo em usar a demagogia ambiental para impedir o desenvolvimento econômico dos segundos, enquanto os segundos se dedicaram a denunciar as expressões da ditadura global no tema em discussão. No centro dos debates esteve o chamado Novo Objetivo Coletivo Quantificado (NCQG), um plano de financiamento climático que promete US$300 bilhões anuais às nações em desenvolvimento, mas apenas a partir de 2035. Este montante é uma fração dos US$1,3 trilhão anuais que essas nações demandaram, demonstrando a farsa da preocupação ecológica dos governos dos Estados Unidos e da União Europeia.
A delegação indiana, que lidera a luta de países como Nigéria e Bolívia, condenou o acordo como “insuficiente” e “manipulado”. A negociadora do Ministério das Finanças da Índia, Chandni Raina, afirmou que a presidência da COP impediu sua intervenção antes da adoção do acordo. “Foi um processo armado, estamos extremamente desapontados”, declarou Raina, ecoando a indignação generalizada. A crítica recebeu aplausos de várias delegações, como Malawi e Bolívia, unindo vozes que rejeitam o modelo imposto pelos países desenvolvidos.
Raheja, do Centro de Ciência e Meio Ambiente, avaliou o NCQG como “uma oportunidade perdida”. Segundo ela, “os países em desenvolvimento, incluindo Índia, Bolívia e Nigéria, manifestaram oposição, mas o acordo foi aprovado mesmo assim… A ênfase reduzida em doações e a extensão do prazo até 2035 tornaram o resultado extremamente fraco”. Aparna Roy, do Observer Research Foundation, foi ainda mais direta: “O Ocidente continua fugindo de sua responsabilidade histórica. Este acordo é um tapa na cara de quem já sofre com os impactos climáticos”.
As promessas feitas em 2009, quando os países desenvolvidos comprometeram-se a mobilizar US$100 bilhões anuais até 2020, nunca foram cumpridas. Agora, propõem um novo objetivo financeiro que não apenas é inadequado, como também transfere a responsabilidade para o setor privado.
Esta estratégia foi duramente criticada pelo G77, grupo que reúne as nações em desenvolvimento no âmbito das Nações Unidas. Um negociador do grupo afirmou: “A ênfase no financiamento privado desobriga os governos dos países desenvolvidos de prestar contas”.
A situação é particularmente grave em países africanos, que recebem apenas 3% do financiamento climático global. Nações paupérrimas como Moçambique, Zâmbia e Congo têm sofrido repetidos desastres naturais sem os recursos necessários para a reconstrução, perpetuando um ciclo de pobreza e destruição, ao mesmo tempo em que a demagogia ambiental é usada para impedir o desenvolvimento de uma indústria nesses países. Em contrapartida, os subsídios aos combustíveis fósseis nos países desenvolvidos ultrapassaram US$1 trilhão em 2022, evidenciando a hipocrisia da ditadura global.
Expressando essa radicalização crescente, um delegado africano declarou, sob aplausos das delegações dos países em desenvolvimento, que “não estamos pedindo favores; estamos pedindo justiça”. Entre os ativistas presentes, um jovem oriundo da capital do Quênia, Nairóbi, segurava um cartaz com os dizeres “vocês quebraram. Vocês consertam”. É perceptível, porém, que essa “justiça” não será conquistada com a força dos debates e nem que os países desenvolvidos “consertaram” qualquer coisa no mundo.
Além da farsa climática, a escalada de tensões globais ficou evidente nas declarações do almirante Rob Bauer, presidente do comitê militar da OTAN. Longe de Baku, em Bruxelas, Bauer destacou que as economias devem se preparar para os “tempos de guerra” e se ajustarem. O militar instou empresas desenvolvidas a repatriarem suas unidades produtivas, alegando que parcerias com Moscou ou Pequim colocam em risco a segurança das nações desenvolvidas.
Esse fracasso da COP29 reflete um desentendimento muito mais profundo do que as metas climáticas; aponta para um cenário de polarização global que caminha rapidamente para uma guerra de proporções históricas. O bloco dos países em desenvolvimento, liderado por nações como China, Rússia, Índia, Irã e Brasil representa uma frente de resistência contra a dominação mundial do imperialismo. A reforma das instituições financeiras internacionais é um passo essencial para as nações em desenvolvimento escaparem da opressão imposta pela ditadura global.
Essa rebeldia, entretanto, não se limita ao campo diplomático. As tensões militares, comerciais e tecnológicas entre o imperialismo e os blocos emergentes aumentam o risco de um conflito global. A COP29 escancarou as contradições de um mundo que se aproxima de uma ruptura definitiva.
Isso por que em outra frente da crise mundial, o imperialismo vem reforçando os preparativos para um confronto militar direto com a China, com a OTAN redirecionando suas estratégias econômicas para um possível cenário de guerra. Relatórios indicam que EUA e Japão estão desenvolvendo um plano conjunto que envolve o posicionamento de tropas e sistemas de mísseis na região do Indo-Pacífico.
O plano prevê o envio de regimentos de fuzileiros navais de elite dos EUA, equipados com sistema de mísseis HIMARS, para a cadeia de ilhas Nansei, próxima a Taiuã, com apoio logístico das Forças de Autodefesa do Japão. Além disso, bases nas Filipinas, cujo número foi ampliado em 2023, seriam utilizadas em um eventual conflito.
Esses movimentos evidenciam o cerco liderado pelos EUA e pela OTAN contra Rússia e China, com implicações globais. Moscou já sinalizou que pode reagir com o posicionamento de mísseis de curto e médio alcance na região Ásia-Pacífico, em resposta direta às provocações norte-americanas. Para o vice-ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Ryabkov, a responsabilidade pela escalada recai integralmente sobre os EUA e seus aliados, que seguem minando qualquer tentativa de estabilidade global enquanto perseguem seus objetivos hegemônicos.
Esses desdobramentos refletem não apenas a crescente militarização das relações internacionais, mas também a divisão profunda entre os países desenvolvidos e aqueles que se posicionam contra sua dominação.
A questão climática, naturalmente, é totalmente secundária em um cenário onde se intensifica a luta entre os países desenvolvidos pela manutenção do sistema mundial de opressão e as nações em desenvolvimento, que se radicalizam para não serem oprimidas. As promessas nunca cumpridas de financiamento e cooperação multilateral, feitas pelas potências desenvolvidas, são pouco mais que uma cortina de fumaça para manter sua dominação econômica e militar. Enquanto a ditadura mundial avança em sua política de exploração, os países em desenvolvimento se organizam, não mais como vítimas passivas, mas como forças dedicadas a não se submeterem ao jugo dos opressores da humanidade.