Nesta segunda-feira (17), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Flávio Dino, declarou à imprensa que sua Corte não cederá às pressões políticas e eleitorais ao julgar a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por tentativa de golpe de Estado.

O acórdão que decidirá o destino de Bolsonaro, tornando-o réu na suposta tentativa de golpe, será proferido no dia 25 de março. Com tempo recorde de tramitação e questionamentos sobre a violação do devido processo, o procedimento está sendo denunciado como uma condenação sumária.

Avacalhação superior

Qualquer leigo que acompanhe minimamente um procedimento dentro da nossa tradição jurídica estranharia um litígio sem a devida segregação entre as partes, expondo nitidamente o interesse daqueles que julgam no próprio resultado da ação — e, ao mesmo tempo, constam como vítimas no processo.

O que juristas mais comedidos caracterizavam como um relaxamento e extrapolação do STF tornou-se, atualmente, uma desmoralização inquestionável. No “bate-boca” de Dino, temos uma avacalhação aberta do Judiciário, sustentada principalmente pela campanha imperialista com o apoio da esquerda pequeno-burguesa.

A manifestação pública do ministro, por si só, demonstra a adesão do STF a uma posição política. Um julgamento verdadeiramente imparcial não emitiria juízo antes das preliminares. Quando o faz, apenas reafirma sua parcialidade.

“Ninguém ali, ninguém vai arriscar a sua biografia, a sua ética profissional, julgando casuisticamente pessoas. O que haverá é o julgamento de fatos e provas nos autos, afirmo a vocês, porque o Supremo tem uma tradição que, independentemente de você gostar de uma ou outra decisão, que é legítimo, mas o Supremo tem um código de conduta. E ninguém vai violar esse código de conduta por conta de calendário eleitoral ou interesses políticos”, declarou Dino a alunos do SESI, em um evento em São Paulo.

Celeridade do procedimento

Uma das queixas de Bolsonaro sobre o procedimento — e que motivou a resposta pública de Dino — foi a celeridade do trâmite.

“A PF ficou mais de dois anos investigando. Se for contar o inquérito-mãe das fake news, que está lá no pacotão também, ficaram seis anos investigando. Deram 15 dias para razões de defesa, incluindo carnaval. Tem mais de cem mil páginas”, denunciou Bolsonaro em entrevista ao podcast Flow.

Sobre essa indagação, Dino contestou: “Os mesmos que, hoje, especulam que uma ação determinada está andando ou andará, ou andaria mais rapidamente, são os mesmos que diziam que os inquéritos, que baseavam essas ações sobre o relatório do ministro Alexandre [ministro do STF Alexandre de Moraes], estavam demorando demais. Então decidam. Ora dizem que o Supremo está demorando demais, ora dizem que o Supremo está demorando de menos. Isso, meu amigo, é uma prova da idoneidade do Supremo, porque é a prova de que não há casuísmo”.

Dino não esclarece a denúncia, apenas desqualifica o denunciante pela falta de coerência. Mas, deixando de lado a obscuridade da extrema-direita — que, indiferente a direitos democráticos, defende apenas a própria pele —, esse é o trâmite natural de um procedimento?

Império dos desejos

Muitos consideram pitoresco o cenário em que o insólito se torna cotidiano. Essa é a imagem do nosso sistema judiciário: uma ditadura confusa, ao mesmo tempo, uma selva de leis e uma árida restinga, onde os desejos do imperialismo são satisfeitos, limitados tão somente pelo medo da mobilização da classe trabalhadora.

O STF é uma dinastia sem qualquer representação popular, cujos desejos são sempre atendidos, desde que não contrariem os mestres imperialistas. A própria Corte determina sua competência de foro, decidindo se julgará ou não determinados réus.

A vara que aplica a penalidade é a mesma que decide se a mesma é cabível ou não. Inexiste qualquer segregação de poderes e funções e, consequentemente, qualquer resquício de imparcialidade. O mesmo agente oferece a denúncia, produz provas, interfere no inquérito, consta como parte no polo passivo e ainda pretende julgar o mérito. Se não há suspeição nesse caso, certamente não haverá em nenhum outro no universo.

Acima de qualquer suspeita

Diversas instituições do direito são violadas neste procedimento, mas nenhuma de forma tão vil quanto as regras de suspeição e impedimento. A presunção de parcialidade deveria, por si só, excluir a participação de qualquer magistrado no julgamento, mas, infelizmente, essa não é a realidade.

No mesmo processo, estão presentes julgadores que deveriam ser impedidos, como Alexandre de Moraes, que figura como parte direta no litígio — algo que configura, objetivamente, presunção absoluta de parcialidade.

Entretanto, esse não é o único caso. Mesmo que de forma relativa, os ministros Cristiano Zanin e Flávio Dino são publicamente interessados no resultado da ação e, portanto, deveriam estar sob suspeição para apreciar a matéria. Todavia, ambos já manifestaram que participarão do julgamento.

A quem recorrer?

Um questionamento fundamental a ser feito neste caso é: quando um processo se inicia na última instância, a quem recorrer? Se o julgamento começa diretamente na instância máxima do Judiciário, não há possibilidade de recurso, suprimindo parte do direito constitucional à ampla defesa.

É importante ressaltar que Bolsonaro não ocupa mais nenhum cargo público eletivo. Diante desse fato, ele deveria ser julgado na primeira instância adequada, com seus direitos à apelação devidamente garantidos.

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Last Update: 18/03/2025