O Opinião conversou com Vanessa Mendonça, moradora da ocupação Queixadas, em Cajamar, região metropolitana de São Paulo, que está ameaçada de despejo.

Vanessa é militante do PSTU e é da direção do Luta Popular, movimento por moradia filiado à CSP-Conlutas que assina a convocação da mobilização que vai acontecer em São Paulo, no próximo dia 11, como parte da campanha ‘Despejo Zero’.

Desde a pandemia, os despejos aumentaram muito. Como vocês tem articulado a resistência?

Vanessa Mendonça – Desde a pandemia, movimentos por moradia e do campo se uniram na campanha ‘Despejo Zero’. Conquistamos vitórias, como a ADPF 828 do Supremo Tribunal Federal, que dificultou despejos coletivos na pandemia, exigiu critérios rigorosos e criou o Grupo de Apoio às Ordens Judiciais de Reintegração de Posse (Gaorp) para mediação e alternativas como regularização fundiária.

Porém, essas medidas falharam. O Gaorp virou ferramenta para organizar despejos “humanizados”, mas não há humanidade em expulsar pessoas de suas casas.

Em São Paulo, o governador Tarcísio declarou guerra aos pobres, como temos visto nas ações da polícia nas periferias. Como vocês avaliam a política de moradia desse governo?

Tarcísio intensificou os despejos para favorecer a especulação imobiliária. Vem impondo uma política de higienização urbana, principalmente na área central da capital. As ocupações antigas, como a Favela do Moinho, tendem a ser removidas para dar espaço a projetos que visam “embelezar” a cidade. Faz isso com muita repressão e violência. O mesmo ocorre com as pessoas em situação de rua na Cracolândia, onde a guarda municipal e a PM agem com extrema violência.

Depois que Lula assumiu, algo mudou na situação dos sem-teto?

Os movimentos contabilizam mais de 1,5 milhão de famílias ameaçadas de despejo no Brasil, mas esse número é ainda maior, pois existem ocupações independentes. Enquanto a reforma agrária, uma das promessas do governo Lula, não sai do papel, a reforma urbana sequer é discutida. Enquanto isso, o Congresso criou o grupo ‘Invasão Zero’, formado por parlamentares ligados ao agronegócio, que têm promovido projetos para criminalizar os movimentos, legitimando ataques a territórios indígenas, quilombolas e comunidades rurais, com apoio de fazendeiros e grileiros. O governo federal se omite e ignora esses ataques. Não dá para governar para os de baixo fazendo acordos com o centrão, banqueiros e latifundiários. Lula já escolheu seu lado: governa para os de cima, enquanto os de baixo seguem lutando pela sobrevivência.

Com a possibilidade de Guilherme Boulos ser ministro de Lula, você acha que algo pode melhorar para o movimento?

O MTST teve papel crucial nas lutas por moradia, mas hoje, na Secretaria das Periferias (com Guilherme Simões), e está mais alinhado com as políticas do governo do que em defesa da quebrada. Não combateu a exigência de renda mínima de quase R$ 3 mil no Minha Casa Minha Vida — excludente para a periferia — nem a privatização da regularização fundiária (terceirizando ruas, água e energia). Tornou-se gestor do governo Lula, privilegiando negociações institucionais sobre lutas diretas. No Minha Casa Minha Vida e Entidades, o MTST ficou com 70%-80% das unidades, marginalizando outros movimentos. Se Boulos virar ministro, agirá para desmobilizar lutas com promessas de diálogo institucional, reforçando seu papel como braço do governo.

Quais os próximos passos da campanha Despejo Zero?

A campanha está se fortalecendo, especialmente após a resistência das famílias da Favela do Moinho em São Paulo. No próximo dia 11 vamos realizar uma forte mobilização. Será realizado um ato, às 14h, na Praça da República, no centro da capital paulista, para exigir o fim dos despejos e a violência policial contra toda a quebrada. Queremos unir diversos movimentos e organizações políticas em um grande ato, para mostrar que o povo unido pode conquistar políticas concretas. Será o início de uma jornada de lutas. Queremos expandir as mobilizações para outros Estados, transformar em uma luta nacional.

A ocupação dos Queixadas está ameaçada de despejo?

Sim. Local onde moro é alvo de despejo por uma ordem judicial que pode ser emitida a qualquer momento. Cajamar é uma cidade rica, mas ignora as necessidades da periferia. A prefeitura, mostrando total descaso com as famílias, já preparou o plano de despejo com caminhões, ambulâncias e até a polícia. Querem despejar 100 famílias que construíram suas vidas e um bairro numa área que não cumpre nenhuma função social há mais de 40 anos. Para resolver essa situação é simples, basta que o prefeito Kauãn Berto (PSD) assine um ofício para incluir nossas famílias no programa Cidade Legal, o que nos garantiria o direito à regularização urbana. Estamos em mobilização para pressionar o prefeito a assinar esse ofício e precisamos de todo apoio. Chamamos todos a enviar apoio à campanha, gravando enviando vídeos e marcando o prefeito nas redes sociais para pressioná-lo a agir.

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Last Update: 05/06/2025