Plataforma de exportação offshore de hidrogênio verde no Rio de Janeiro: uma necessidade para a economia do mar

por Mario Cordeiro de Carvalho Júnior

  1. Introdução

O Brasil tem uma grande linha costeira, e o Rio de Janeiro tem acesso a uma variedade de recursos marinhos. A nossa posição como uma das maiores economias do mundo em termos de PIB nos tornou um player na economia do mar. Com a mudança global em direção ao uso mais sustentável dos recursos, conforme estabelecido nas Metas de Desenvolvimento Sustentável da ONU, o desenvolvimento desta atividade deverá chegar a US $ 3 trilhões até 2030. E, está mudando rapidamente para uma forma mais sustentável com um modelo conhecido como Blue Economy ou Blue Ocean. Para muitos países e regiões, esta é uma das maiores oportunidades de crescimento nas próximas décadas.

Alguns países já estão captando um valor significativo da economia do mar. Mas, o momento atual é uma grande oportunidade para o Rio de Janeiro, e, sobretudo para as empresas fluminenses pensarem sobre como capturar oportunidades de negócios sustentáveis na economia do mar nas próximas décadas. Com um extenso litoral, e uma economia costeira diversificada, e uma demanda crescente por novas e inovadoras soluções de tecnologia, o Rio de Janeiro está perfeitamente posicionado para encontrar e capturar valor na economia do mar.

Hoje, há um incentivo para a gestão adequada do meio ambiente na “blue economy” por se ter a possibilidade e a disponibilidade de explorar de forma contínua e perene os recursos do oceano, tanto nas águas rasas e/ou profundas quanto nos recursos vivos e não vivos. As atividades econômicas baseadas na economia do mar podem atuar de forma conjunta numa plataforma de exportação de hidrogênio verde visto que se podem combinar indústrias convencionais, emergentes e de oceano.

Ao se constituir uma plataforma de hidrogênio verde de exportação na costa fluminense haverá demanda de insumos para a indústria convencional da economia do mar por meio do embarque e desembarque de bens nos portos, para dragagem marítima, para a reparação dos navios e embarcações, e para a construção naval. Haverá ainda uma co-criação de demanda de máquinas e equipamentos em função da exploração em plataformas distintas em termos geográficos de produção, de um lado, de hidrogênio verde, e, de outro lado, da exploração enquanto houver reservas na indústria convencional petróleo e gás em águas profundas.  

Cabe ressaltar que uma plataforma de hidrogênio verde para exportação deve estar associada às indústrias ditas emergentes em offshore, que são a aquicultura marinha, a exploração de energia eólica, solar e de ondas do mar. Todos esses equipamentos a serem implantados e desenvolvidos para gerar energia ou alimentos estarão localizados em plataformas offshore; e explorando os recursos vivos da economia do mar. Próximo ao ecossistema localizado no entorno da plataforma de hidrogênio verde poderemos também encontrar no futuro a exploração de recursos minerais marinhos – não vivos – da economia do mar, tais como: Granulados siliciclásticos; Granulados Carbonáticos; Depósitos de Pláceres (placers); Fosforita; Sais (evaporitos); Enxofre;  Hidratos de Gás; Nódulos polimetálicos; Crostas ferromanganesíferas; e  Sulfetos polimetálicos.

Isso significa que a plataforma offshore de hidrogênio verde de exportação é um ponto de apoio e de lança para a constituição de indústrias de oceano, que são a prospecção marinha e de fundo do mar para mineração. E, todas essas atividades são passíveis de serem feitas com sustentabilidade, segurança e vigilância marítima, gerando produtos e serviços de biotecnologia marinha que podem ser associados aos serviços marinhos de alta tecnologia.

A plataforma de hidrogênio verde offshore é também por si mesma uma indústria emergente para à produção, o armazenamento, e o transporte de hidrogênio verde. Essa produção poderá ser feita sob a forma de gás, amônia ou outra forma de armazenamento de energia, tipo cell fuels. Essa produção, armazenamento e transporte podem ser feitas em plataformas de óleo existentes que em breve estarão sujeitos à necessidade de haver descomissionamento devido à exaustão e ao esgotamento de poços de petróleos offshore ao longo da costa do Rio de Janeiro. Inclusive, se poderá usar desde que haja uma atividade de remanufatura  alguns dos navios que estão abandonados no fundo da baía de Guanabara.

Em outras palavras, já há um sunk cost em plataformas feito pelas empresas de óleo e gás no Estado do Rio de Janeiro. Então, com medidas de depreciação de ativos acelerada e outros incentivos fiscais e financeiros, estes ativos poderiam ser reposicionados e reconvertidos para a produção de hidrogênio verde para a produção e exportação na costa fluminense.  .

Esta categorização de plataforma de hidrogênio verde de exportação, embora não seja conclusiva, fornece orientação para a compreensão da economia do mar fluminense e sua dinâmica de co-evolução tecnológica e de complexidade econômica. De fato, se terá de buscar a convivência econômica sustentável da exploração e venda externa conjunta ao longo das próximas décadas do hidrogênio verde de exportação – produto emergente na pauta de exportação –  com o óleo, e gás – produto maduro na estrutura de exportação –  fluminense.

Essa singularidade a ser vivida nas próximas décadas e o desafio hoje a ser respondido é sugerir como transformamos o Rio de Janeiro, de uma economia do mar baseada em extração de recursos fósseis marinhos para uma economia do mar baseada na gradual redução dos recursos fosseis e na crescente produção de hidrogênio verde de exportação.  Essa co-evolução estará associada ao uso e a exploração de outros recursos marinhos com base em conhecimento, tecnologia e sustentabilidade com modelos inovadores de negócios apropriados à economia do mar.

Todavia, é preciso perceber e identificar que existem oportunidades econômicas para a região fluminense no setor de hidrogênio verde para a exportação em alto mar, que devem ser exploradas através inclusive por iniciativas colaborativas entre o setor público e o privado. Uma colaboração necessária é a união de forças em empreendimentos de pesquisa científica para mapear o potencial de exploração da área da costa fluminense para permitir planejar a produção efetiva e eficiente no futuro. 

Inicialmente, se faz necessário que o Governo do Estado faça um levantamento geológico do mar na costa fluminense, usando os equipamentos disponíveis nas universidades estaduais. Sabemos das restrições orçamentárias impostas pelo atual regime de regularização fiscal por que passa o Estado, assim uma solução passível para se executar esse projeto é realizar certames lotéricos específicos da Loterj, desde que houvesse efetiva campanha publicitária dizendo a importância desse levantamento para o futuro da sociedade fluminense. E, se deveria ter total transparência no uso e no destino do recurso financeiro a ser arrecado com o(s) certame(s) lotérico(s).

Associado a esse levantamento geológico marinho um projeto piloto conjunto entre o Governo Estadual, Agencia Nacional de Petróleo, Petrobrás, Governo Federal, e sociedade civil deveria ser realizado com vistas a montar sistemas de devices de monitoramento e controle perene e diário para medir os fluxos de produção e a variação dos estoques das reservas de óleo extraídos nas atuais plataformas de óleo e gás, e nas futuras plataformas de hidrogênio para fins de gestão tributária federal e estadual. Isso é necessário num contexto de transição energética de longa duração que acompanhará as mudanças na incidência de tributos indiretos e diretos em função das reformas tributárias em curso. Dado os problemas de restrição fiscal enfrentados pelo Estado do RJ, é possível sugerir o uso de certames lotéricos específicos da Loterj, desde que houvesse efetiva campanha publicitária dizendo a importância desse tributo no orçamento publico estadual.

É preciso ainda mostrar que para se desenvolver um sistema de operações de negócios abrangente na economia do mar se faz necessário que se proponha estruturas legais, regulamentares e institucionais para orientar a utilização eficaz dos recursos naturais na costa fluminense. Para que as atividades da economia do mar prosperem na região fluminense uma rota possível e viável e agregadora é ter um projeto de desenvolvimento econômico e social no momento presente para incentivar a constituição de uma PLATAFORMA DE EXPORTAÇÃO OFFSHORE DE HIDROGÊNIO VERDE NO RIO DE JANEIRO.

Incentivar a criação de plataforma com esse corte seria uma demonstração significativa do compromisso público do RJ com a Agenda 2030 das Nações Unidas e seus Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, e os princípios fundadores da Rio-92. Uma plataforma de exportação de produtos e serviços é uma solução de um sistema produtivo para uma missão orientada de inovação da política pública de transição energética e digital de corte federal. O primeiro ponto para formular essa missão é conhecer e identificar as vantagens comparativas estáticas existentes que são os fundamentos da plataforma, que está exposta na segunda seção.  A seguir, se sugere aspectos de como tornar dinâmicas as vantagens comparativas a serem desenvolvidas na plataforma, sendo essa sugestão descrita na terceira seção. E, finalmente são feitas algumas considerações finais acerca de como elaborar e analisar projetos de hidrogênio verde de exportação para a neoindustrialização, voltado para o desenvolvimento sustentável na quarta seção.

II- As vantagens comparativas estáticas existentes como fundamentos da plataforma de hidrogênio verde de exportação

A história econômica fluminense é um bom case para mostrar que a partir de uma base de recursos naturais não renováveis – descoberta de óleo no final dos anos setenta e início dos oitenta do século passado – construímos e organizamos espaços geográficos – na costa fluminense do Atlântico – com capacidade para se produzir, armazenar, comercializar, transportar e exportar petróleo, e alguns dos seus derivados.  Esses espaços geográficos no mar se organizaram sob a de forma de estruturas “empresariais” de plataformas de extração de óleo controladas por empresas petrolíferas. Elas fazem uma combinação ótima entre: a existência e intensidade de exploração de recursos naturais não renováveis; o diferencial do custo e da produtividade entre o trabalho doméstico e externo; a abundancia relativa e o diferencial entre o custo de capital domestico e internacional; e a maquinaria, a técnica e a tecnologia disponível para extrair óleo bruto e transformar esses materiais da natureza em bens para serem – majoritariamente – comercializados no exterior.

Essa transformação produtiva incentivou a geração de economias de escala e escopo no setor; e o peso da história local e nacional – refletido na estória e na presença da Petrobras, do Cenpes, da relação Universidade-Indústria como Coppe/Petrobras, Instituto de Quimica UFRJ/Petrobras, e todas as empresas de óleo e gás, nacionais e estrangeiras, associadas à Onip (organização da Indústria de Petróleo) e à Firjan – que potencializaram as fontes de vantagens comparativas estáticas desde os anos oitenta da década passada para conformar a atual produção e exportação de óleo pelo Estado do Rio de Janeiro.

Graças e essa evolução econômica, hoje, na pauta fluminense de exportações há a presença de bens intensivos em recursos naturais não renováveis como petróleo e alguns de seus subprodutos. A performance estadual nessas exportações pode ser medida e mensurada em torno de quatro dimensões, a saber: a) o nível, o crescimento, e a market share das exportações de recursos naturais não renováveis como petróleo e alguns de seus subprodutos estaduais, conhecida como margem intensiva; b) a diversificação desses produtos e seus mercados ou margem extensiva; c) a qualidade e a sofisticação das exportações de óleo ou a margem de qualidade; e d) o padrão de entrada e sobrevivência das empresas exportadoras ou margem de sustentabilidade.

A exportação e o escoamento de petróleo, derivados e gás natural explicam o crescimento desses bens de US$ 697,86 milhões (média anual do período), no triênio de 2000 a 2002, para US$20,4 bilhões (média anual do período), no triênio que contempla os anos de 2019, 2020 e 2021. Isto reflete num padrão de especialização do RJ nesse complexo – distinto do resto do Brasil – e com potencial de expansão futura se houver agregação de exportação de hidrogênio verde na pauta de exportação fluminense.  

Interessa reter do ponto de vista de análise de comércio exterior desses bens que as margens intensiva, extensiva, de qualidade e sustentabilidade empresarial, entre 2000 e 2024, apresentam uma evolução positiva e favorável ao longo do tempo. De fato, óleo bruto se torna o principal bem exportado pelo Estado do Rio de Janeiro, e a qualidade e o padrão do óleo são considerados bons pelos clientes internacionais. E, em função dos leilões da Agência Nacional de Petróleo, ao longo daquelas duas décadas se observa um gradual aumento de players notadamente estrangeiros que processam, armazenam e transportam óleo do Estado do Rio de Janeiro para o exterior. Do exposto, se pode asseverar que essas são as vantagenscomparativas estáticas existentes que permite potencializar os fundamentos de uma plataforma de exportação de hidrogênio verde no Rio de Janeiro. 

III – As vantagens comparativas dinâmicas como fundamentos da plataforma de hidrogênio verde de exportação

Para dotar, no futuro, o Estado do Rio como uma plataforma de exportação de hidrogênio verde se tem de transformar as vantagens comparativas existentes em dinâmicas como forma de potencializar os fundamentos e incentivar a transformação das forças produtivas para fazer a co-evolução numa economia do mar baseada em extração de recursos fósseis marinhos para uma economia do mar com base na produção de hidrogênio verde de exportação. Isso tem de ser feito associando o uso e a exploração de  energia eólica, solar, dos ventos e marés do  mar para através de um processo de eletrólise a ser feito numa  plataforma reconvertida de óleo do offshore fluminense se produza hidrogênio.

Assim, num primeiro momento é preciso compreender que no processo de eletrolise para obter hidrogênio verde se precisa de água “doce” ou “potável”. Numa plataforma offshore, esta virá de um processo de desasilinilização da água marinha para ser usada no processo de eletrólise para obter hidrogênio.  Obviamente, ao transformar agua marinha em agua doce há um resíduo – sal – fruto do processo de manufatura subtrativa necessária e presente na eletrólise. Esse rejeito produtivo – sal – poderá ter os seguintes usos: (a) na reinjeção direta ou em solução aquosa nos canais ou grutas ou fulcros ou depósitos já explorados de petróleo no passado; (b) no uso de parte desse sal como insumo para se criar uma atividade econômica capaz de produzir composto de recurso mineral marinho ou uso na aquicultura, e assim se explorar os recursos marinhos – vivos e não vivos – da economia do mar; e (c) e, em menor proporção na criação de cavernas – submersas, semi ou em alguma plataforma remanufaturada – de sal para se tornar spas turísticos e de rejuvenescimento terapêutico – como ocorre em algumas cavernas de sal na região do Himalaya.

Nesse ponto, importa e cabe ressaltar duas coisas. A primeira é que na produção de hidrogênio verde na costa fluminense o uso e o consumo da agua não sairão de aquíferos em terra e desse modo não haverá competição com o uso e o consumo (necessário) de água potável pelos seres humanos fluminenses que habitam e trabalham nas comunidades, nas residências ou no setor primário, secundário ou terciário do Estado do Rio de Janeiro. A segunda é que no processo de usar a eletrólise a partir da água para obter o gás de hidrogênio verde se demanda “muita energia”.  Assim, o hidrogênio verde de exportação é um bem eletrointensivo.

Em linhas gerais, uma plataforma de hidrogênio verde de exportação é composta por um sistema de produção, armazenamento e distribuição. O espaço de produção é apropriado para compreender e identificar como e aonde transformar as vantagens comparativas existentes em dinâmicas como forma de potencializar a exportação de hidrogênio verde. De fato, esse lócus dever ser objeto de uma missão orientada à inovação. Esta inovação tem de ser perseguida para reduzir o custo de capital (CAPEX) e o custo operacional (OPEX) do projeto e da operação da plataforma. No subsistema de produção, a missão orientada de inovação a ser adotada pelo Governo Federal deve ser focada em incentivar tecnologia para melhorar a performance do  eletrolisador, pois este é  principal fator para a redução os custos do projeto.

Isso porque nesse subsistema da produção, o eletrolisador  tem de ser construído em subestruturas flutuantes. E, a viabilização da geração de economias de escala se dará  pelo  uso desse equipamento, o que o  torna condição   necessária e suficiente para se reduzir custos operacionais e de capital do projeto. Vale lembrar que o eletrolisador separa os átomos de hidrogênio e oxigênio da molécula de água por meio de um processo químico de reação, gerando oxigênio e hidrogênio de alta pureza. Embora diferentes tecnologias para eletrolisadores operem de maneiras ligeiramente diferentes, todos têm um ânodo e um cátodo que são separados por um eletrólito.

Atualmente, existem duas tecnologias utilizadas em aplicações comerciais para a produção de hidrogênio: Eletrolisador Alcalino (AL) e Eletrolisador de Membrana de Troca de Prótons (PEMEL). Existe outra tecnologia que ainda está em processo de intensa pesquisa e desenvolvimento que é o Eletrolisador de óxido sólido (SOE). Esta tecnologia promete alta eficiência e flexibilidade, mas ao mesmo tempo exige em tese um custo maior por necessitar altas temperaturas para operação (700 a 900 graus celsius) e durabilidade dos materiais. Por outro, o eletrolisador do tipo PEMELs são mais recentes que os AELs; e apresentam diversas vantagens, como  tempos de inicialização mais rápidos, e densidades de corrente elétricas mais altas que levam a dimensões menores do eletrolisador. Para obter maior pureza de hidrogênio (>99,8%), se exige operação que combine potência de energia nominal, e pressão para obter produção de hidrogênio. Atualmente, um AEL (PEMEL) consome em média 51 kWh (58 kWh) de eletricidade para produzir 1 kg de hidrogénio. Há previsão é que esse número caia para 49 kWh/kg até 2030. Reforçando o já mencionado, isso mostra que a produção de hidrogênio verde é eletrointensiva, e esse avanço tecnológico deveria ser uma missão orientada de inovação para ser apoiada pelo BNDES, FINEP e FAPERJ.  

Ao se produzir hidrogênio verde se tem de analisar a forma de armazenar. Uma abordagem consiste em armazenar hidrogênio líquido em tanques metálicos, num processo semelhante ao que é amplamente utilizado para o Gás Natural Liquefeito (GNL). A principal vantagem é a alta densidade no estado líquido de 70 kg/m3, que é quase 10 vezes a densidade de hidrogênio em estado gasoso. No entanto, a liquefação do hidrogênio é um processo que consome muita energia, sendo necessários entre 6 e 10 kWh de eletricidade para liquefazer 1 kg de hidrogênio. As razões para a baixa capacidade de liquefação são o elevado investimento inicial associado às plantas de liquefação e o alto consumo de energia para liquefazer o hidrogênio.

Nesse contexto, o eletrolisador do tipo  PEMELs representa a melhor escolha para este sistema devido ao menor tamanho e manutenção mais fácil. Isso significa que numa plataforma offshore esta pode ser desenhada para dimensões reduzidas e as viagens de manutenção podem planejadas para ocorrer em momentos distantes do tempo. Vale lembrar que para dimensionar o PEMEL, a potência nominal não precisa ser igual à do parque eólico ou solar, uma vez que o parque eólico ou solar pode não precisar operar a plena capacidade por grandes períodos de tempo em potência nominal.

Do ponto de vista económico, a abordagem mais interessante poderá ser subdimensionar o tamanho do eletrolisador, uma vez que a receita perdida quando o parque eólico e solar estiver na potência nominal poderia ser inferior ao custo adicional de ter um eletrolisador mais potente. Além disso, a energia usada na purificação da água e na compressão do hidrogênio para transmissão junto com as perdas reduz a potência real disponível para o eletrolisador. Isso significa pensar numa fonte de energia de reserva para ser fornecida para o eletrolisador durante períodos de desligamento, ou quando o eletrolisador for consumir uma pequena quantidade de energia para permanecer em modo de espera. Os períodos de paralisação não são comuns e não dura muito, e devido à capacidade do PEMEL este pode começar a operar com 1% da potência nominal, embora com baixa eficiência produtiva. Isso torna o seu uso e difusão recomendável.

Cabe observar que para produzir hidrogênio verde se necessita de oferta de energia de fontes renováveis. Essas podem ser oriundas de fonte hídrica, solar, eólica, biomassa, ou dos ventos e marés do mar. E, se deve atentar que o processamento de agua em hidrogênio é um processo produtivo continuo – tipo 7/7 dias, dia e noite. Isso requer uma oferta contínua, constante, e confiável de energia renovável. Porém, ainda que sejam observados avanços tecnológicos e redução nos custos da oferta de energia solar e eólica um fato a constatar é que por haver variabilidade de incidência do sol e dos ventos, a capacidade nominal de geração de energia renovável dessas duas fontes é variável. Logo, essa oferta deve ser completada pelas outras fontes de renováveis – hídrica,  mar ou biomassa. Essa combinação é condição necessária e suficiente para se conseguir ter hidrogênio verde de exportação “puro” ou “certificado”.

Isso significa que para haver uma plataforma de hidrogênio verde de exportação se terá de desenvolver um sistema de potência de energia elétrica – de fontes renováveis – único e especifico para transformar as vantagens comparativas existentes em dinâmicas como forma de potencializar a exportação de hidrogênio verde. De fato, esse lócus – sistema de potência próprio para hidrogênio verde – dever ser objeto de uma missão orientada à inovação. Essa inovação pode ser feita mediante chamadas públicas do MCTI – Finep para o desenvolvimento de soluções e de programas de software e soluções de digital twin capazes de montar um grid de energia – em volta das plataformas de hidrogênio – que apresentem características únicas e singulares visto que demandará a oferta e a gestão de energia de diversas fontes renováveis, e, que, por hipótese e necessidade locacional e econômica terão de estar próximas das plataformas.     

Isso – a proximidade da fonte de energia ao seu processamento – deverá ser observado no projeto básico de engenharia para que se possa estabelecer um volume de capacidade instalada de energia numa plataforma para produzir hidrogênio verde de exportação. Por isso, se deverão ter estimativas de quanto se poderá dispor de energia oriunda de fonte eólica, solar e das ondas do mar. Pelas condições da natureza – pois poderá ter dias ensolarados e dias nublados, dias de ventos e dias de calmaria, e dias de marés altas e baixas -, a oferta de energia dessas fontes tem um componente de incerteza e de risco a ser incorrido pelo “dono do projeto” para se justificar economicamente a produção de hidrogênio verde de exportação.

A incerteza e o risco de fornecimento perene de energia renovável de origem solar, eólica e mar em projetos offshore acaba requerendo de um “mercado buffer” para se dispor de oferta de energia de origem hídrica para produzir hidrogênio verde. E, do ponto de vista tecnológico, numa plataforma offshore, quanto mais próximo geograficamente o uso – produção de hidrogênio verde – estiver da fonte de energia renovável – eólica, solar ou mar – menores serão os custos a serem incorridos para ser ter cabos, e linhas de transmissão entre si, e, baterias se houver necessidade de eletricidade. Enfim, ter um sistema de potencia bem desenhado para a plataforma de hidrogênio é uma fator de vantagem comparativa dinâmica. Em outras palavras, o custo de geração de energia renovável para compor o Capex/Opex numa plataforma de hidrogênio será mais reduzido se o sistema de potência e suas fontes estiverem aglomerados em torno da plataforma de hidrogênio verde de exportação.

Nesse sentido, para compreender e identificar como e aonde transformar as vantagens comparativas existentes em dinâmicas do sistema de potencia com base em energia renovável numa plataforma de hidrogênio verde de exportação é preciso compreender o conceito Power-to-[X] (PtX).   As tecnologias derivadas da ideia Power-to-[X] (PtX) podem não só desempenhar um papel substancial no mix energético global, mas também podem mitigar o impacto do aquecimento global. Estas tecnologias podem ajudar a alcançar a meta do Acordo de Paris de manter o aumento da temperatura da Terra abaixo de 1,5 – 2,0 graus Celsius. O uso do conceito de PtX para produzir especialmente hidrogênio (H2) e amônia podem contribuir para a descarbonização dos setores energético, industrial e de transportes.

Esses bens – hidrogênio e amônia – podem ser produzidos, armazenados e transportados e exportados do RJ notadamente e prioritariamente para a Europa. E esse hidrogênio ou amônia pode ser usado como insumo em bens eletrointensivos produzidos e exportados, por exemplo, na siderurgia, e na petroquímica fluminense, e da região Sul e Sudeste do Brasil. Devido a estas razões, as tecnologias PtX têm ganhado cada vez mais atenção das empresas e dos bancos de investimento.

Segundo Lins e Spandergole (2023), a PtX visa utilizar o potencial ambiental e económico das energias renováveis. O termo PtX surgiu devido ao crescente número e grande diversidade de aplicações relevantes para a descarbonização.  PtX como energia renovável  para a produção de hidrogênio verde e/ou amônia se refere a diferentes processos que transformam eletricidade de fontes de energia renováveis do tipo eólica, biomassa, solar ou elétrico  que pode ser exportado e  utilizado para reduzir a emissão de gases em diversos setores de atividades econômicas exportadoras e eletrointensivas..

A escolha da Europa como mercado alvo para a exportação do hidrogênio a ser produzido na costa fluminense é função dos problemas advindos da Guerra da Ucrânia e dos conflitos Geopolíticos na Europa. Hoje, há uma decisão da União Europeia mediante sua política de Renew Power de reduzir o uso de gás natural oriundo do material fóssil (petróleo), originário da Rússia, por Hidrogênio Verde ou amônia. O consumo do hidrogênio verde ou amônia irá ser demandado principalmente para aquecimento residencial, e nas indústrias petroquímicas, siderúrgicas e de papel europeias.

Para fazer essa transição energética, inicialmente até 2030, e depois até atingir os objetivos do Net Zero de 2050 do acordo de Paris, os países europeus – notadamente Alemanha, França e Holanda – estão envidando esforços para desenvolver novas fontes de oferta e suprimento de hidrogênio verde e amônia, tanto nos países da África, do Oriente Médio e da América Latina. Importa ressaltar que a Europa será uma importadora líquida desses produtos – hidrogênio Verde e/ou Amônia – nas décadas vindouras.

Na América Latina, investidores europeus estão identificando oportunidades para desenvolver projetos de produção, armazenamento e transporte de hidrogênio verde e/ou amônia para a exportação. O Brasil, devido à abundância de recursos naturais renováveis tem vantagens comparativas atuais e ainda pode desenvolver competências e habilidades empresariais, técnicas e, sobretudo sua força de trabalho para obter vantagens comparativas criadas e dinâmicas de modo a inserir hidrogênio e amônia produzidos no Brasil na União Europeia.

O Estado do Rio de Janeiro é candidato natural de ser um hub de exportação para a Europa, tendo em vista; (i) o descomissionamento de plataformas de petróleo no offshore; (ii) da distancia náutica do Estado das plataformas offshore aos portos europeus (iii) dos  ventos apropriados para a produção de energia eólica; (iv) da  incidência solar apropriada para a produção de energia solar; (v) do fato que em termos de segurança da indústria e do trabalho se irá e processar, armazenar e distribuir hidrogênio ou amônia para exportação num ponto offshore. Além disso, esses produtos podem ser usados como insumo nos bens eletrointensivos produzidos e exportados, no Rio de Janeiro, em especial na siderurgia, tornando o aço mais verde por meio de green technology. Recursos do governo federal e de instituições europeias existem para gerar inovações de produto e processo e há chamadas públicas abertas, só não há ainda projetos em análise por não temos, nem empresas, nem pesquisadores com espirito inovador schumpeteriano no Rio de Janeiro.

 Os outros obstáculos a uma eventual neoindustrialização numa plataforma orientada para a exportação com base no hidrogênio verde no Rio de Janeiro podem residir na necessidade de maquinaria a ser importada do exterior ou adquirida no sul e sudeste do Brasil, e, sobretudo, de aspectos tributários associados aos regimes aduaneiros especiais e da capacitação dos trabalhadores.

Os aspectos cruciais que podem reduzir a velocidade desse processo de neoindustrialização são no projeto a gestão da água e do eletrolisador;  e o transporte para o mercado doméstico e internacional, bem como a capacitação de trabalhadores para manipular carga perigosa. Em relação à agua, investimentos em cooperação e transferência de tecnologia árabe para dessalinização pode ajudar a estabelecer um equilíbrio hídrico para essa nova atividade de exportação na região. Por sua vez, o eletrolisador já foi apontado acima a importância de se ter uma missão orientada para inovação.

No tocante à cadeia de suprimento se deve verificar como o hidrogénio verde vai ser exportado e transportado. Se o hidrogênio verde for liquefeito a forma de transportar hidrogênio seria por meio de navios. Esse produto de exportação pode sair do estado de forma liquefeita ou pode ser convertido em amônia ou líquido para serem armazenados e movimentados em transportadores orgânicos de hidrogênio (TOH) – tipo containares específicos – para obter maior conteúdo energético por volume.

Em função disso, será preciso readequar as unidades de FPSO que eventualmente estão em plataformas ou áreas a serem descomissionadas no offhore fluminense. Essa é uma possibilidade econômica e de logística a ser cuidadosamente avaliada. Também se deve analisar os navios de longo curso que transportam carga química e /ou óleo para se constatar a viabilidade de se transportar hidrogênio verde a grandes distâncias. Porém, cabe ressaltar que a existência da Transpetro que está localizada no Rio de Janeiro – com sua habilidade e com o seu core business – permite inferir que transportar e manipular carga perigosa são passíveis de ser transportada do RJ para a Europa.

Para viabilizar as unidades de produção, armazenamento e transporte de hidrogênio verde de exportação é preciso formar mão de obra. De fato é preciso no RJ promover um curso de corte técnico para jovens entre 18 e 25 anos com o objetivo de desenvolver habilidades e competências relacionadas à gestão da produção, armazenamento e embarque para transporte destinado para a exportação do hidrogênio verde ou amônia.  .

Todavia, o preenchimento da vaga para este tipo de trabalho requer qualificação. Atualmente tem sido feito um investimento em inovação na pós-graduação com hidrogênio verde, somente na Bahia e no Piauí, porém a formação do técnico de nível médio para a exportação não está sendo enfocada, apesar de necessária. Neste sentido, considerando as perspectivas para o Rio de Janeiro, a sugestão aqui apresentada tem como objetivo central a qualificação de jovens, compreendendo o ensino multidisciplinar, abrangendo o desenvolvimento pessoal, profissional e ambiental,  promovendo a compreensão da importância da transição para fontes de energia mais limpas.

Ao identificar, conhecer e trabalhar com tecnologias de hidrogênio verde, os jovens podem aumentar a conscientização ambiental e contribuir ativamente para a construção de um futuro mais sustentável e com menor impacto ambiental, além de se inserirem no mercado de trabalho e gerarem renda e prosperidade.

Para isso potencializar o capital humano como fonte de vantagem comparativa dinâmica para uma indústria a ser implantada se deveria capacitar jovens por meio de dois cursos no Rio de Janeiro, a saber.  Um primeiro curso seria composto por seis módulos que abordariam: a) Formação Política em uma sociedade em transição energética; b) Cooperação Internacional e formação de alianças entre jovens do RJ e da Europa (https://youthenergy.eu/, : https://gceurope.org/; : https://yeenet.eu/ para incentivar uma complementaridade de produção e fornecimento de matéria prima entre ambas as regiões de modo a haver uma situação de ganha-ganha nas duas regiões; c) Produção, Tecnologia, Armazenamento e Transporte como fonte de prosperidade e distribuição de renda no Brasil e na Europa; d) Formulação de agenda de políticas publica para hidrogênio pelos jovens; e e) Formas e ações democráticas de pressão política pela juventude. Esses módulos deveriam ser apresentados em um total de 300 horas.

A matriz teórica desse curso é discutir as novas formas de organização política da juventude, de formação de agenda de política pública, de movimentos de revolta e contestação, e, sobretudo, dos mecanismos de pressão e de se fazer ouvir pelos jovens num cenário cada vez maior de descrença na democracia e na dificuldade de resolução de crise capitalista planetária e na crescente ainda que saudável polarização política.  

O outro curso também de 300 horas seria realizado também com seis módulos e visa capacitar os jovens a saberem: a) a identificar os riscos e incertezas envolvidos na movimento de carga perigosa nas etapas de produção, processamento, carga e descarga do hidrogênio de exportação na sua cadeia de valor global; b) a saber gerir as certificações, normas e procedimentos envolvidos nas etapas de produção, armazenamento e transporte de hidrogênio ou amônia; c) a saber gerir as rotinas e os procedimentos de exportação de hidrogênio, no Brasil, e, no destino na Europa; d) saber gerir e identificar e conhecer aspectos relativos ao HC Protocol, as tarifas sobre carbono, as métricas e metodologias do CBEAM europeu e as due dilligence a serem exigidas pelas empresas importadoras europeias; e) a ter noções básicas de negócios internacionais, geopolítica de recursos naturais renováveis, e gestão de supply chain e sustentabilidade na cadeia de valor de hidrogênio verde; e f) a ter noções intermediárias de cultura exportadora, boas maneiras e práticas no comercio internacional, e noções sobre o ambiente e o intercâmbio turístico entre o Rio de Janeiro e a União Europeia.

Do exposto até aqui, também agora é hora que as empresas de offshore nacional, as agencias e os bancos desenvolvimento federais ou estaduais façam roadshow na Europa para mostrar a potencialidade de vantagens comparativas existentes na região fluminense para produzir hidrogênio verde para a exportação, sobretudo para a Europa. Aliás, a Europa é o alvo estratégico para a exportação de hidrogênio verde pelo Rio de Janeiro.

Segundo Lins e Spandergole (2023), o primeiro fato a destacar é que esta em curso a politica publica europeia de RePowerEU, que visa reduzir a dependência geopolítica da energia fóssil vinda da Rússia, fruto do conflito com a Ucrânia. Esta durará até 2030. E, muitos dos projetos desse plano se centram na infraestrutura de hidrogénio verde. Por exemplo, a espinha dorsal do hidrogénio (EHB) é uma nova e importante infraestrutura de gasodutos formada por 11 Sistemas Europeus de Transmissão Operadores (Tesos). Até 2030, o EHB ligará clusters emergentes de hidrogénio com uma rede inicial de gasodutos de 11.600 km.

Para cumprir as metas de procura de hidrogénio para 2030 definidas pelo plano RePowerEU, estão previstos cinco corredores de gasodutos de grande escala. Os corredores irão inicialmente ligar a oferta e a procura locais em diferentes partes da Europa, antes de expandir e conectar a Europa com regiões vizinhas com potencial de exportação. A certeza sobre a implantação desta infraestrutura permitirá que os atores intervenientes no mercado desenvolvam a oferta e a procura mais rapidamente.

Estes corredores de abastecimento permitirão a criação de um mercado pan-europeu de hidrogénio até 2030. Nesse caso é preciso mostrar que o Rio de Janeiro  tem condições de produção e de logística para vender CIF aos operadores privados desses corredores. Isso significa fazer road show para expor pré- projetos de engenharia aos seguintes atores do EHB, a saber: Amber Grid, Bulgartransgaz, Conexus, CREOS, DESFA, Elering, Enagás, Energinet, Eustream, FGSZ, FlusSwiss, FluxysBelgium, Gas Conect Austria, Gasgrid Finland, Fasco, Gasunie, Gascade, Gas Network Ireland, GRT gaz, National Gas Transmission, NET$GAS, Nordion Energi, OGE, Ontras, Plinarco, Plinodi, Rem, Snam, Tag, Térega, Transgas, Transitgas AG e TSO of UA (https://ehb.eu/).

Todavia, ainda que haja uma análise positiva de prospectiva futura do mercado de hidrogénio verde para a exportação focado na Europa, este pode não ser alcançada sem uma abordagem dos incentivos econômicos e fiscais a outorgar e regulamentar no Brasil. Esse é o elemento mais essencial a considerar. O novo marco regulatório aprovado recentemente pode de fato promover, direta ou indiretamente, a produção e a exportação do hidrogênio verde tanto sobre a forma de gás liquefeito ou amônia ou como insumo de produtos finais destinados a exportação. Esse novo marco começar a dar segurança jurídica para poder formar um preço competitivo do hidrogênio verde que é condição necessária para se estruturar projetos de produção e exportação. Ao proceder dessa forma se pode tanto atrair novos players privados, quanto, sobretudo, apoiar, incentivar e potencializar que as vantagens comparativas existentes no Rio de Janeiro se tornem dinâmicas para implantar e desenvolver uma plataforma de hidrogênio verde de exportação, que também atenderá ao mercado doméstico.

IV- Considerações Finais sobre Elaboração e Análise de Projetos de Hidrogênio Verde de Exportação para a Neoindustrialização

A singularidade a ser vivida nas próximas décadas e o desafio hoje a ser enfrentado é sugerir como transformamos o Rio de Janeiro, de uma economia do mar baseada em extração de recursos fósseis marinhos para uma economia do mar baseada na gradual redução dos recursos fosseis e na crescente produção de hidrogênio verde de exportação.  Essa co-evolução estará associada ao uso e a exploração de outros recursos marinhos com base em conhecimento, tecnologia e sustentabilidade com modelos inovadores de negócios apropriados à economia do mar. Logo, nessa etapa é preciso perceber a importância da elaboração e da analise de projetos de hidrogênio verde de exportação também como instrumento para a neoindustrialização. Isso tem de ser feito sob a perspectiva de um sistema de produção, armazenamento e transporte.

Do lado da oferta de hidrogênio a ser disponibilizada para o mercado, cumpre observar que no subsistema de produção – conforme já apontado – há duas questões a serem analisadas na elaboração do projeto físico, a saber: o eletrolisador e o sistema de potencia de energia renovável. Esses são pontos relevantes, pois sem inovação de tecnologia pode não haver reduções no custo de operações e de capital ( opex/capex) do projeto. Para que os equipamentos – bens de consumo e bens de capital – a serem usados na reconversão, na remanufatura e na montagem das plataformas de exportação estes dependerão de política do governo federal, notadamente de regimes aduaneiros especiais.

Com relação à oferta na etapa de armazenamento, na maioria dos casos, pequenas quantidades de hidrogênio podem ser armazenadas, com pressão, na forma gasosa ou líquida. Outros métodos de armazenamento podem ser utilizados para permitir o uso direto do hidrogênio. Mas, o hidrogênio é altamente inflamável em quase todas as concentrações no ar, por isso é uma carga perigosa para ser transportada. A forma mais segura de transporte em longas distâncias e em melhores condições de armazenamento é a liquefação do hidrogênio em amônia (NH3). A amônia é conhecida por ter uma alta densidade de hidrogênio e pode ser armazenada em condições normais a moderadas como líquido. Embora elimine as condições perigosas para transporte, como temperatura e pressão, para obter o gás hidrogênio, a amônia deve sofrer uma reação catalítica para se decompor e ser usada no destino final.

Portanto, os potenciais compradores internacionais estão na Europa e são quem poderá estimular o negócio internacional para a produção e exportação de hidrogênio verde a partir do Brasil, em especial, no Rio de Janeiro. O hidrogênio verde produzido no offshore, no Brasil e no RJ será então exportado para mercados prontos se as condições de produção e dos regimes aduaneiros e tributários forem adequadas. E com um selo e certificação verde existente na instalação da produção, a difusão externa do hidrogênio verde produzido pelo sistema offshore do Brasil e do RJ combinando eólica e solar e marés pode tornar-se muito mais viável em termos tecnológicos e econômicos, especialmente porque a produção de hidrogênio verde no setor offshore pode ser construída a partir da reconversão industrial das plataformas já existentes e que já é gerido pelo setor privado nacional por meio de empresas de óleo e gás.

Para convencer essas empresas offshore nacionais a prospectarem, e a buscarem a exportação, é preciso analisar e avaliar como o hidrogênio verde deve chegar até o utilizador ­final no mercado internacional, realizando exportações CIF do Brasil. Segundo Lins e Sponagle (2023) signifi­ca que os estudos e as inovações de P&D e as políticas tributárias em curso estão sendo concentrados na produção, logo se deve adicionar à dimensão externa do projeto o transporte internacional e o armazenamento do hidrogênio verde produzido no offshore do Brasil para o cliente no mercado internacional. Nesse caso, a infraestrutura é essencial para atrair produtores locais e internacionais e reduzir o custo da logística. Isso eventualmente levará a um custo mais baixo do hidrogênio verde e irá incentivar os investidores locais e não locais a participarem de projetos de exportação de hidrogênio verde.

Na exportação, serão necessárias várias formas de infraestrutura para transportar e armazenar hidrogênio verde ou combustíveis sintéticos à base de hidrogênio. Se for liquefeito, a forma de transportar hidrogênio seria por meio de navios. Deve ser transportado  liquefeito ou convertido em amônia ou líquido por transportadores orgânicos de hidrogênio (TOH) para obter maior conteúdo energético por volume. Readequar as unidades de FPSO que eventualmente estão em plataformas ou áreas a serem descomissionadas no offshore brasileiro é uma possibilidade econômica e de logística a ser cuidadosamente avaliada. Deve-se, também, analisar os navios de longo curso que transportam carga química e /ou óleo para constatar a viabilidade de transportar hidrogênio verde a grandes distâncias. Mas, um ativo importante que se pode contar é a Transpetro. Essa poderá viabilizar a conexão e a entrega do hidrogênio verde do Brasil, e do Rio de Janeiro, para a Europa.

De fato, considerando que a grande maioria das plataformas a serem descomissionadas que estão na costa fluminense pertence à Petrobras é preciso pensar na criação de um tipo de empresa de proposito específico – tipo SPE que seja preponderantemente exportadora – que busquem outros sócios privados que possam tocar e desenvolver essa plataforma de hidrogênio verde de exportação. De fato, o controlador principal da Petrobrás poderia criar uma comissão interministerial – composta pelo MDIC, Minas e Energia, e Fazenda, e até meio ambiente – para sugerir um modelo de negócios para acelerar a transição energética com sustentabilidade dessa SPE preponderantemente exportadora com forte presente de acionistas privados como um exemplo de parceria público e privada em prol da transição energética.       

A justificativa para a sugestão acima deriva do fato de temos de olhar para o mercado domestico e externo e vermos como estabelecer modos de entrada no mercado internacional, principalmente o europeu. Segundo Lins e Sponagle (2023) há na Europa cinco corredores de abastecimento de hidrogênio a serem estruturados que são: a) Norte de África e Sul da Europa; b) Sudoeste da Europa e Norte de África; c) Mar do Norte; d) Regiões Nórdicas e Bálticas; e) Europa Oriental e Sudeste. Esses cinco corredores abrangem países nacionais e importadores, mercados fornecedores, consistentes com os três corredores de importação identi­cados pelo plano RePowerEU, incluindo um corredor através do Mediterrâneo (Corredores A e B), outro pelo Mar do Norte (Corredor C) e um via Ucrânia (Corredor E). Esses cinco corredores de abastecimento permitirão a criação de um mercado pan-europeu de hidrogênio até 2030.

A União Europeia, com esses corredores, poderá: a) conectar oferta e demanda substancial de hidrogênio em regiões europeias e aproveitar o armazenamento subterrâneo para fornecer fornecimento estável; b) assegurar grandes volumes de hidrogênio doméstico com custos competitivos e abastecimento com importações de hidrogênio de regiões vizinhas geograficamente; c) promover a criação de um mercado de negociação de hidrogênio líquido e pan-europeu; d)) proporcionar reduções de emissões substanciais e econômicas; e) acelerar a implantação e integração de energias renováveis e apoiar a expansão de indústrias europeias verdes e inovadoras; e f) aumentar a resiliência do sistema energético europeu e contribuir para a independência energética europeia, com diversidade de oferta de hidrogênio verde.

A análise prospectiva do negócio de mercado de hidrogênio verde para a exportação centrado no Estado do Rio de Janeiro e focado na Europa não pode ser alcançada sem uma abordagem dos incentivos econômicos e ­fiscais para outorgar e regulamentar no Brasil. Esse é o elemento mais essencial a considerar. Esse quadro regulatório é que deve promover, direta ou indiretamente, a produção e a exportação do hidrogênio verde tanto sob a forma de gás liquefeito ou amônia ou como insumo de produtos ­destinados à exportação.

Dar segurança jurídica para poder formar um preço competitivo do hidrogênio verde é condição necessária para se estruturar projetos de produção e exportação. Como haverá o uso de insumos nacionais que serão usados na reconversão de plataformas de óleo e gás, e FPSO, sugere-se que se decida que o regime de drawback, normal ou integrado, é mais apropriado para a realidade de um projeto de exportação de hidrogênio verde. A análise e a decisão de política quanto à generalização do regime aduaneiro de drawback  para o caso de uma atividade de powershoring de exportação com base em hidrogênio verde e seus subprodutos deve levar ainda em consideração o uso de amônia na produção de fertilizantes, por haver pouca oferta nacional desse bem e se usar esse insumo no bem exportado pelo agronegócio e, também, no uso como insumo na produção de aço e outros produtos eletrointensivos exportados pelo Brasil. Estabelecer a generalização do drawback nesse momento de formulação de projetos de exportação de hidrogênio verde fará que o custo Capex ou Opex seja competitivo em comparação ao praticado no exterior. Vale lembrar que o custo de produção de hidrogênio verde é relativamente elevado (2 a 2,5 vezes) em comparação com o custo de produção de hidrogênio cinzento.

O custo do hidrogênio verde também depende do custo de investimento do sistema de eletrólise, seus fatores de capacidade e custo de produção de eletricidade. No entanto, com a queda global do preço da energia solar e eólica, espera-se também que os preços do hidrogênio verde acabem por cair. Isso é normal, uma vez que a economia do hidrogênio mudaria com o tempo devido à economia de escala e escopo, ao aumento da demanda e avanços tecnológicos que tornam a tecnologia mais barata.

Mais ainda com uma(s) empresa(s) de proposito especifico nacional preponderante exportadora que conte com investidores nacionais e estrangeiros para produzir, armazenar e transportar hidrogênio verde da costa fluminense – e sendo esta empresa na realidade e de fato uma spin off das empresas de óleo e gás que tem tradição de décadas em operar com eficiência um sistema de produção de óleo continua para atender o mercado externo – isso vai gerar uma confiança nos consumidores europeus e nos policy makers da União Europeia.  

De fato, de um lado, essa empresa de proposito específico preponderantemente exportadora  poderá mostrar que ela estará dotada de core competence para vender o hidrogênio verde CIF ou door to door, em solo europeu. Inclusive poderá alugar áreas, nos portos europeus, para escoar e entregar o hidrogênio ao consumidor intermediário europeu. Essa subsidiaria dessa empresa brasileira localizada na Europa criará reputação na produção e entrega num mercado em formação – que é o hidrogênio verde.

Mas, como os policy makers europeus não estarão seguros que haverá um conjunto de ofertantes locais na UE ou no exterior capaz de atender a demanda estimada por hidrogênio verde, estes estarão cada vez mais usando leilões de energia para assegurar que ao se ter uma demanda esperada de compra de hidrogênio; do outro lado, haverá uma oferta de produção de hidrogênio a ser ofertada por outros players. A subsidiaria da empresa de proposito específico brasileira poderá abrir uma subsidiária na Europa, e poderá aproveitar a singularidade de produzir no Rio de Janeiro e transportar hidrogênio para a Europa para definir ex-ante uma demanda externa e um preço CIF competitivo com um bom transfer price que atenda a sua produção, e com lucratividade para repartir os seus resultados com os investidores nacionais e estrangeiros. Isso significa que há uma estratégia ganha–ganha para implantar e gerir uma plataforma de hidrogênio verde para a exportação a partir da costa fluminense. 

Do exposto, podemos ver que o conceito de tecnologias Power-to-[X] (PtX) associado à elaboração e a analise de projetos de hidrogênio verde de exportação usando energia eólica associada, solar e marés com base numa estrutura de regimes aduaneiros apropriado para a exportação é um exemplo de “conversão industrial verde” focada na Europa que ajudará a diversifi­car a pauta de exportações do Brasil, notadamente do Rio de Janeiro. Assegurados Opex e Capex compatíveis à rentabilidade esperada dos investidores domésticos e estrangeiros, ações complementares para a extração de recursos minerais não vivos da economia do mar poderiam ser desenhadas para atuar próximos às plataformas de hidrogênio verde. Inclusive soluções de aquicultura poderiam também ser desenhadas e estruturadas para que a(s) empresa(s) de proposito específico a ser criadas para operar na costa fluminense sejam sustentáveis, ajudem a transitar de uma explotação de recursos fosseis para um com base em recursos renováveis. Essas ações ainda poderão ajudar a limitar o aquecimento global a 2oC e alcançar a neutralidade de carbono até 2050. Logo, uma plataforma de exportação de hidrogênio verde é uma necessidade para a economia do mar do Estado do Rio de Janeiro, e para a Cidade símbolo histórica da COP!

  • Mario Cordeiro de Carvalho Júnior, Professor da FAF-UERJ

Bibliografia

Power-To-Floating Wind para hidrogênio verde de exportação Miguel Lins e Evan Sponagle, RBCE Nº 156 – Julho, Agosto e Setembro de 2023

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Última Atualização: 03/08/2024