
O deputado italiano Angelo Bonelli apresentou uma interpelação ao governo da Itália questionando por que a deputada federal licenciada Carla Zambelli (PL-SP) ainda não foi presa no país, apesar do mandado internacional de prisão expedido contra ela. A cobrança foi formalizada nesta quarta-feira (11) e encaminhada aos ministérios das Relações Exteriores e Cooperação Internacional, do Interior e da Justiça. O DCM teve acesso ao documento.
Bonelli estruturou seu questionamento em cinco pontos. Um deles trata da entrada de Zambelli na Itália pelo aeroporto de Fiumicino. Ele quer saber por que a polícia não deteve a deputada no momento de sua chegada, mesmo com o Ministério do Interior já informado sobre o caso desde o dia 4 de junho.
O deputado também questiona por que o mandado de prisão internacional não foi cumprido e se existe algum tipo de cobertura ou apoio institucional que esteja permitindo a permanência de Zambelli na Itália, mesmo na condição de foragida.
Outra cobrança feita no documento envolve a possível revisão da Lei 1992/91, para que seja possível revogar a cidadania italiana de pessoas condenadas por crimes como tentativa de golpe de Estado, crimes contra a humanidade, incitação à subversão violenta ou repressão política e jurídica.
Segundo Bonelli, a expectativa é que o governo italiano responda às perguntas já na manhã desta sexta-feira (13). A pressão pública na Itália coincide com o avanço do processo de extradição movido pelo Brasil.

Leia a íntegra da interpelação:
O abaixo-assinado requer a interpelação do Ministro das Relações Exteriores e Cooperação Internacional, do Ministro do Interior e do Ministro da Justiça — para saber — considerando que:
Em 4 de junho de 2025, o subscritor apresentou uma interrogação sobre o caso de Carla Zambelli, deputada federal por São Paulo eleita em 2022 pelo PL-SP, mesmo partido de Jair Bolsonaro;
Em 14 de maio de 2025, o Supremo Tribunal Federal do Brasil a condenou, por unanimidade, a 10 anos de prisão pela invasão do sistema do Conselho Nacional de Justiça, em colaboração com o hacker Walter Delgatti-Neto, com o objetivo de inserir documentos falsos, entre eles um mandado de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo;
Durante as eleições de 2022, ela divulgou fake news sobre as urnas eletrônicas e sobre o aplicativo e-Título, sugerindo manipulações contra o então candidato eleito Lula. Por isso, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) impôs-lhe multas pesadas e ordenou a remoção dos conteúdos;
Em 2022, perseguiu armada um opositor político em São Paulo, apontando-lhe uma arma, fato pelo qual responde a processo judicial;
Em janeiro de 2025, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) cassou seu mandato e a declarou inelegível por oito anos, por divulgar desinformação sobre o sistema eleitoral nas eleições de 2022;
Para fugir da Justiça brasileira, Zambelli deixou o Brasil em 25 de maio rumo a Miami (EUA), onde, em entrevista à CNN, declarou: “Tenho passaporte italiano, podem até acionar a Interpol, mas não vão me tirar da Itália”… “Sou cidadã italiana e sou intocável lá, a menos que a Justiça italiana me prenda”, concluindo que viria à Itália porque “o sistema de saúde aqui nos Estados Unidos é muito caro… na Itália é mais barato”;
A Interpol emitiu o alerta vermelho de prisão internacional contra Zambelli no dia 5 de junho, às 12h45;
Em 5 de junho, Zambelli desembarcou às 11h10 no aeroporto Roma-Fiumicino, vinda de Miami, fato confirmado por fontes da polícia nacional italiana, pela agência de notícias Ansa e pela CNN Brasil;
Apesar de já ser de conhecimento público desde 2 de junho que a foragida Zambelli viria da Flórida para a Itália, ela passou pelos controles no aeroporto sem ser detida e atualmente está em paradeiro desconhecido;
Essa situação levanta dúvidas sobre possíveis proteções de que goza em território italiano, especialmente considerando que a Justiça brasileira bloqueou todos os seus bens e contas bancárias;
O tratado de cooperação assinado em Roma entre os governos do Brasil e da Itália em 17 de outubro de 1989 estabelece os procedimentos para extradição de pessoas entre os dois países, sendo que a Lei 144/1991 autorizou sua ratificação e execução;
Enquanto isso, no Brasil, o ministro Alexandre de Moraes abriu nova investigação contra Zambelli por supostos crimes de coação no curso do processo e de obstrução às investigações;
Em março, o Supremo Tribunal Federal decidiu processar o ex-presidente Jair Bolsonaro, líder do partido de Zambelli, acusado de ter planejado um golpe de Estado para permanecer no poder mesmo após perder as eleições de 2022;
A Procuradoria-Geral da República o denunciou por cinco crimes, pelos quais pode ser condenado a até 43 anos de prisão;
Segundo a acusação, Bolsonaro teria sido o responsável pelo ataque às instituições brasileiras em 8 de janeiro de 2023, quando o Congresso, o Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Planalto foram invadidos em Brasília;
A acusação aponta que o plano era ainda mais amplo e previa o uso das Forças Armadas para impedir a transição democrática após a vitória de Lula, além da prisão ou execução de Lula, de seu vice, Geraldo Alckmin, e do ministro Alexandre de Moraes;
Imediatamente após a derrota eleitoral, dois dos quatro filhos de Bolsonaro — o deputado Eduardo e o senador Flávio, ambos eleitos pelo mesmo partido de Zambelli — procuraram a embaixada da Itália em Brasília para acelerar o processo de reconhecimento da cidadania italiana, iniciado em 2019 com base numa antiga ascendência italiana da família;
Ambos estariam envolvidos em investigações judiciais;
Em resposta à interrogação urgente n. 2-00021 de 25 de novembro de 2022, o subsecretário da Cultura, Mazzi, ao ler a resposta preparada pelo Ministério das Relações Exteriores (MAECI), informou que: “em 2020, Flávio e Eduardo Bolsonaro, filhos do presidente do Brasil Jair Bolsonaro, solicitaram formalmente à representação italiana o reconhecimento da cidadania iure sanguinis. Não há registro de pedido semelhante por parte do presidente Bolsonaro”;
O reconhecimento da cidadania iure sanguinis é disciplinado pela Lei 91/92 e pela circular n. K 28.1/1991 do Ministério do Interior;
Pergunta-se, portanto:
Quais foram os motivos que impediram a polícia de deter ou ao menos aplicar medidas de vigilância e monitoramento à foragida Zambelli no momento em que entrou no território italiano pelo aeroporto de Fiumicino, mesmo com a situação sendo de conhecimento do Ministério do Interior desde 4 de junho, data em que alertei os ministros por meio da interrogação?
Por que o governo italiano não executou o mandado de prisão internacional contra Zambelli?
Se há pessoas, entidades ou recursos que estejam sustentando ou protegendo a estadia de Zambelli em solo italiano durante sua condição de foragida?
Quais medidas urgentes os ministros interrogados, cada um conforme sua competência, pretendem adotar para dar cumprimento à Lei 144/1991, que define os procedimentos de extradição entre Itália e Brasil, especialmente no caso de Zambelli?
Se o ex-presidente da República Federativa do Brasil, Jair Bolsonaro, pediu ou obteve cidadania italiana, e quais membros de sua família — Eduardo, Flávio, Carlos e Renan Bolsonaro — já solicitaram ou conseguiram esse reconhecimento?
E se não consideram necessário modificar, na primeira oportunidade legislativa, a Lei 91/1992 para prever a revogação da cidadania italiana daqueles condenados por crimes de golpe de Estado, tentativa de golpe, crimes contra a humanidade ou incitação à subversão violenta das ordens econômica ou social do Estado, ou ainda à supressão violenta da ordem política e jurídica do Estado.