Demografia e o País que Envelhece Antes de Amadurecer
por Henrique Morrone
O Brasil se aproxima da velhice sem rito de passagem.
Envelheceu antes de amadurecer: tornou-se país adulto sem completar o ciclo formativo da industrialização, da produtividade, da inovação e da proteção social robusta.
É uma biografia acelerada, porém incompleta — cabelo branco e musculatura frágil. Falta-lhe a sabedoria.
Enquanto os países centrais envelheceram depois de consolidar sua estrutura produtiva, nós o fizemos enquanto desmontávamos a nossa.
O bônus demográfico — aquela rara estação histórica em que há mais trabalhadores do que dependentes — visitou-nos sem planejamento e partiu de costas, sem adeus.
Quando poderíamos ter investido em densidade tecnológica, educação emancipadora, política industrial contínua, complexidade exportadora e urbanização coordenada, fomos enganados por um atalho sedutor, porém perturbador: liberalização econômica extrema, desindustrialização precoce e consumo importado banalizado como sinônimo de modernidade.
Confundimos abertura com abdicação, estabilidade com projeto, acesso a bens estrangeiros com adultez econômica.
A demografia não é destino; é janela.
Abre-se por um instante e não repete horário. A nossa fechou-se antes de concluirmos os andares superiores do edifício. Envelhecemos sem alcançar renda capaz de preservar-nos com conforto.
A produtividade do trabalho — pedra basilar do desenvolvimento — regrediu.
Chegamos à maturidade sem perspectiva para a velhice; a indústria que sustentaria esse avanço é solapada diariamente.
Seremos, assim, o país que demanda cuidados sem ter construído a capacidade de provê-los; que exige produtividade sem ter acumulado lastro; que necessita de inovação com cadeia produtiva rarefeita.
O envelhecimento, em si, não é tragédia — tragédia é envelhecer sem ter amadurecido a economia.
A idade cronológica nos alcançou, mas a produtiva nos faltou. Tornamo-nos adultos estatísticos com arquitetura econômica ainda adolescente.
Não precisamos temer a velhice;
precisamos temer a velhice sem chão, sem músculo, sem sistema, sem planejamento.
O Brasil não ficou velho —
mas, se a toada persistir, envelhecerá antes de amadurecer.
Henrique Morrone é economista e professor associado da UFRGS.
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