O Supremo Tribunal Federal (STF) deve dedicar boa parte da sua semana ao tratamento de ações trabalhistas que podem, no futuro, trazer mudanças importantes no que se refere aos direitos dos trabalhadores.
Na pauta de julgamentos, o principal tema de análise dos ministros será o trabalho intermitente, autorizado pela reforma trabalhista promovida pelo governo de Michel Temer (MDB). Ao todo, são três ações que discutem o modelo de trabalho.
As ações foram propostas pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI) e por entidades de trabalhadores de postos de combustível e de operadores de telemarketing.
O trabalho intermitente, em resumo, estabelece que os períodos de trabalho não precisam, necessariamente, ser contínuos. É diferente, por exemplo, de contratos de trabalho que estabelecem uma jornada fixa, como 35 ou 40 horas semanais.
Na prática, o empregador pode formalizar um contrato de trabalho intermitente remunerando o trabalhador por hora trabalhada. O valor da hora de trabalho não pode ser menor que o valor horário do salário mínimo e o empregado precisa ser avisado com antecedência sobre quando o empregador precisará dos seus serviços.
Os contratos de trabalho intermitente ainda são raros no País. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), menos de 1% de todos os trabalhadores ocupados formalmente o fazem por meio da modalidade.
Por outro lado, segundo o Ipea, o número de ações trabalhistas que questionam os contratos de trabalho intermitente cresceu 116%, entre 2021 e 2023. O volume de ações gira, atualmente, na casa dos 3 mil processos.
Essa modalidade não se restringe a um tipo específico de trabalho, mas costuma ser usada para o contrato de atendentes, serventes de obras, cozinheiros e vendedores, em geral.
Segundo as entidades que acionaram o Supremo, regimes flexíveis de trabalho violam princípios consagrados na Constituição, como o da dignidade humana e o do valor social do trabalho.
O caso é analisado há anos pelo STF. O relator, ministro Edson Fachin, já votou para declarar a modalidade inconstitucional, assim como a ministra aposentada Rosa Weber. Alexandre de Moraes e Nunes Marques, por outro lado, votaram a favor da constitucionalidade.
Um pedido de destaque feito pelo ministro André Mendonça, em 2022, interrompeu o julgamento, que deve ser retomado nas sessões do tribunal desta semana.
Omissão do Congresso
Na próxima quarta-feira 21, a Corte também começará a julgar uma ação que questiona se o Congresso Nacional foi ou não omisso sobre a regulamentação da proteção de trabalhadores à automação.
A ação foi apresentada em 2022 pela Procuradoria-Geral da República (PGR), que considera que o Legislativo não cumpriu a determinação de um trecho da Constituição que estabelece que os trabalhadores devem ser protegidos dos processos de automação.
Na prática, a automação é o fenômeno em que o trabalho humano é substituído por dispositivos mecânicos e eletrônicos, como robôs e máquinas. O atendimento bancário feito por robôs é um dos exemplos do processo de automação.
Como o Legislativo jamais criou uma lei para regulamentar a proteção ao trabalhador prevista na Constituição, segundo a PGR, a situação provoca uma redução arbitrária e injustificada do nível de proteção do direito social prevista na referida norma constitucional, infringindo o princípio da proporcionalidade.
Na pauta do STF, também está previsto o julgamento de uma ação apresentada no ano 2000 pelo PT, PCdoB, PDT e PSD. As siglas questionam as mudanças feitas no regime de trabalho de servidores públicos, durante a reforma administrativa promovida no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC), no final dos anos 1990.
À época, a reforma fez com que a União, os estados e municípios não precisassem mais estabelecer planos de carreira para servidores públicos, nem estabelecer um regime jurídico único, que prevê a estabilidade para o servidor após dois anos de atividade e a admissão por concurso público.
Em 2007, porém, uma decisão liminar do Supremo suspendeu os efeitos da norma que eliminava o regime jurídico único.
As siglas questionam a forma como a mudança no texto constitucional foi feita, argumentando que não houve aprovação em dois turnos na Câmara e no Senado.