O golpe de Estado na Síria foi uma vitória do imperialismo, uma catástrofe para o povo sírio e uma derrota importante do Eixo da Resistência. No entanto, a forma como ele se desenvolveu mostra que foi muito mais uma política improvisada, surgida do desespero do imperialismo, do que de uma operação organizada para tomar controle do regime político da Síria. A maior demonstração disso é que a organização usada para dar o golpe foi a Al-Qaeda renomeada de Haiat Tahrir al-Sham. A Síria está longe de se estabilizar como lacaio do imperialismo.
Primeiro é preciso lembrar como aconteceu o golpe. Com a vitória do Hesbolá no Líbano, que derrotou a ofensiva israelense com o cessar-fogo de 27 de novembro, o imperialismo precisava de uma nova operação no Oriente Médio para segurar a crise de “Israel”. Ela se deu por meio de um ataque da Al-Qaeda a cidade de Alepo, segunda mais importante da Síria. Conforme essa ofensiva militar se desenvolveu com muito sucesso o imperialismo chegou a conclusão de que havia a margem para o golpe de Estado. Só esse primeiro fator já demonstra o improviso, o golpe foi decidido durante os acontecimentos.
A Al-Qaeda era uma ferramenta importante para desestabilizar a Síria. A CIA fez uma operação para que eles tomassem a cidade de Idlib e a usassem como base de desestabilização, mas isso não significa que ela deveria tomar o poder. O grupo que o imperialismo criou para tomar o poder era o Exército Livre da Síria. A imprensa burguesa os chamava de “rebeldes moderados”, em oposição ao Estado Islâmico (Al-Qaeda), que seriam os “rebeldes radicais”. Nenhum dos dois era de fato “moderado” mas isso mostra quem era a oposição que eles preparavam para tomar o poder.
Abu Al-Jolani, o líder da Al-Qaeda que avançou até Damasco era um dos “rebeldes radicais”, um homem procurado pelo governo norte-americano como um terrorista perigoso, ele chegou a ser o vice-líder do Estado Islâmico. Ou seja, uma pessoa terrível para tomar o poder no quesito propaganda. Durante o avanço militar a imprensa burguesa transformou a Al-Qaeda em “rebelde moderado”. O nome utilizado é HTS e Jolani virou o “jiadista defensor da diversidade”. Essa operação totalmente absurda mostra que o golpe foi muito improvisado. Colocar a Al-Qaeda no governo de um país árabe é uma desmoralização completa da política de guerra ao terror.
O desespero do sionismo
Toda a operação na Síria começou como uma cobertura para a derrota gigantesca que “Israel” sofreu no Líbano. A derrubada de Assad foi o melhor resultado possível pois tirou completamente a atenção do feito do Hesbolá, mas ainda assim é clara a preocupação do Estado de “Israel”. O primeiro-ministro Netaniahu em suas tradicionais bravatas foi para as Colinas de Golã, o território sírio ocupado pelos sionistas em 1967, e anunciou uma nova invasão da Síria. Foi tomado um território militar importante e agora o exército está próximo a Damasco.
Essa operação teve dois objetivos: é um golpe de propaganda para tentar demonstrar força de “Israel” e ao mesmo tempo coloca Damasco como refém do sionismo. Ou seja, o imperialismo não está nem um pouco seguro do sucesso do golpe, está deixando o exército sionista de prontidão para tomar ação caso a situação saia de controle. Caso o golpe fosse muito bem realizado a política correta seria envolver “Israel” o mínimo possível, assim a legitimidade do novo governo seria muito mais forte. Mas o pior não foi a invasão por terra, foram os bombardeios.
Imediatamente após o golpe de Estado, “Israel” inciou uma campanha gigantesca de bombardeios na Síria. As posições bombardeadas foram principalmente bases e instalações militares, ou seja, toda a infraestrutura militar do país está sendo destruída. Os sionistas não confiam no governo da Al-Qaeda para ter o controle de armamento pesado, ou não confiavam que esse governo de fato é estável. Em comparação a operação semelhante a essa foi a do golpe na Líbia em 2011. O que o imperialismo fez com as armas de Gadafi naquele momento? Realizou uma operação de contrabando para os mercenários na Síria.
Ou seja, as armas após a queda do regime são muito úteis para o imperialismo. A queda da URSS e dos países do leste europeu também deu origem a esse fenômeno. Mas no caso da Síria a confiança no novo governo é nula, então é melhor destruir completamente os depósitos de armas. É uma demonstração de desespero gigantesca. O golpe na verdade não é para tomar controle do país, o imperialismo não considera que tem essa capacidade, é apenas para derrubar Assad e neutralizar a Síria como uma nação.
Por fim, vale citar a crise com os curdos. A operação golpista bem feita já teria um plano de transição para a região da Síria que era dominada pelos EUA por meio dos curdos organizados nas FDS (Forças Democráticas da Síria). Mas a situação do Curdistão Sírio é caótica. De um lado a Turquia avança tomando território, a Al-Qaeda já tomou a segunda cidade mais importante, Deir Ezzor. Ninguém sabe o que acontecerá com esses curdos. As próprias FDS foram um improviso para impedir que Assad vencesse a guerra contra o Estado Islâmico e retomasse o importante território do rio Eufrates. Ou seja, é uma camada de improviso em cima de outro improviso.
Analisando o quadro geral está claro que a política do imperialismo é de desespero. Eles têm a força bruta e conseguiram derrubar Assad, mas esse golpe não parece ter lhes garantido controle maior sobre a região. Perderam um inimigo e em troca ganharam o caos e em meio ao caos a resistência pode muito bem ocupar o vácuo de poder.