Nos últimos meses, a crise no governo israelense e nas Forças Armadas de Israel tem sido cada vez mais evidente. Com os conflitos internos, a crise se agrava enquanto o Hamas, o movimento político que lidera a resistência na Faixa de Gaza desde 2007, continua a demonstrar resiliência e capacidade operacional, desafiando as declarações de vitória iminente por parte do governo israelense que, a esta altura, demonstram ser nada mais do que o brado desesperado de um animal acuado.

A divisão entre o primeiro-ministro Benjamin Netaniahu e os altos comandantes das forças de ocupação veio à tona recentemente, com um relatório do jornal norte-americano The New York Times destacando a crescente discordância sobre a direção da guerra contra o povo palestino. Os generais israelenses, preocupados com os estoques esgotados de munições e a possibilidade de uma escalada com o Hesbolá no Norte, parecem estar inclinados a buscar uma trégua como única forma de garantir a libertação dos 120 reféns ainda mantidos em Gaza, podendo ser vista, também, como a única forma de prolongar sua própria existência.

Netaniahu, no entanto, rejeitou essa perspectiva, insistindo que Israel não cederá ao que chamou de “ventos do derrotismo”. Essa postura foi criticada pelos generais, que anteriormente atribuíram a ele a culpa por não concordar com uma força alternativa em Gaza para preencher o vácuo deixado pela destruição da estrutura militar do Hamas – algo que não ocorreu.

Desde outubro de 2023, quando militantes do Hamas lançaram um ataque que desmistificou a lenda da impenetrabilidade do sistema de defesa israelense, Israel intensificou suas operações militares em Gaza e na Cisjordânia. Segundo os militares sionistas, foram eliminados 15 mil combatentes do Hamas, metade da força original do grupo, de acordo com a imprensa israelense que, conforme denunciado pelo próprio Hamas, traz números inverídicos, tanto sobre o número de combatentes mortos (dos quais a maioria são civis), quanto o número original de combatentes palestinos. No entanto, não só o Hamas, mas toda a Resistência Palestina liderada pelo partido sunita tem conseguido recrutar novos combatentes, muitos deles jovens de 18 anos, mantendo sua capacidade de desafiar Israel.

Apesar das intensas operações israelenses que destruíram algumas estruturas do grupo em meio ao genocídio do povo palestino, o Hamas continua a lançar foguetes e manter áreas de Gaza sob seu controle, resistindo à invasão e provocando perdas humanas e, sobretudo, políticas e econômicas a Israel. Isso foi demonstrado recentemente quando militantes dispararam 20 foguetes de Khan Yunis em direção às comunidades do sul de Israel, demonstrando que ainda são capazes de montar operações ofensivas significativas e aumentar significativamente a escalada.

Politicamente, o Hamas está mais forte do que nunca. Uma pesquisa recente do Centro Palestino de Pesquisa Política e de Opinião mostrou que 67% dos palestinos acreditam que o Hamas estava certo ao lançar o ataque de outubro, e 61% desejam ver o partido palestino continuar no governo de Gaza após o fim da guerra. Esses dados refletem uma aprovação significativa da população palestina, tanto na Cisjordânia quanto em Gaza, endossando, por fim, as ações heroicas do partido.

Internamente, o Hamas não é apenas uma força militar. Derivado da Irmandade Muçulmana, o grupo estabeleceu uma base social sólida em Gaza, administrando escolas, hospitais e instituições de caridade, provocando maior qualidade de vida ao povo palestino na mesma medida em que liderando a resistência contra o inimigo comum, o que o torna uma parte indispensável da sociedade local. Essa dimensão social do Hamas, embora enfraquecida pelos bombardeios israelenses, lhe confere uma legitimidade significativa entre o povo gazense.

A recusa de Israel em ceder à pressão para buscar uma trégua, por sua vez, mesmo diante das críticas internas, reflete seu medo de que qualquer admissão de que a guerra está chegando ao fim com um desfecho que possa desestabilizar seu governo. Observadores notam que os generais podem estar jogando nas mãos de Netaniahu ao criticarem-no publicamente, mas a situação interna revela uma profunda crise de confiança entre a liderança civil e militar.

Além disso, a recente visita do Ministro da Defesa Yoav Gallant a Washington D.C., onde ele criticou Netaniahu indiretamente, destaca um cisma ainda maior. Gallant agradeceu à administração Biden pela assistência, mas enfatizou que as discordâncias deveriam ser resolvidas a portas fechadas, uma clara crítica à abordagem pública e conflituosa de Netaniahu.

Analistas comparam a situação atual com o envolvimento dos EUA no Afeganistão, onde a tentativa de desmantelar o Talibã e estabelecer um governo local pró-imperialista falhou após duas décadas de conflito e atrocidades cometidas contra o povo afegão. Miriam Wardak, ex-assessora do conselheiro de segurança nacional do Afeganistão, destaca que a estratégia militar pesada de Israel, sem um plano político sustentável, pode levar a um resultado semelhante ao dos EUA no Afeganistão: uma retirada forçada e o retorno ao poder do grupo que se tentou destruir.

Enquanto Netaniahu se prepara para discursar no Congresso dos EUA, buscando apoio e tentando mostrar força, a realidade no terreno é que o Hamas continua a resistir, crescer, se estabelecer enquanto a maior liderança do povo palestino e a ocupação sionista enfrenta uma crise severa, de liderança e também de estratégia.

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Última Atualização: 05/07/2024