O sítio Esquerda Online, ligado à corrente Resistência do PSOL, publicou uma matéria intitulada De norte a sul do Brasil: as universidades vão transicionar, na qual os autores, Malena Rojas e Lucas Marques, comemoram a aprovação da reserva de vagas para pessoas transexuais na graduação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). A decisão foi tomada no dia 1º de abril pelo Conselho Universitário da instituição.

Democratização do acesso?

Os autores afirmam que “a conquista das cotas trans faz avançar o ciclo de reivindicações para democratização do acesso e melhores condições de permanência estudantil, mudando para sempre a cara de uma das melhores universidades da América Latina”.

Mas não há, com essa medida, qualquer democratização real do acesso. Na verdade, dá para dizer o contrário.

Uma pesquisa feita em 2021 pela UNESP-Botucatu apontou que apenas 2% da população brasileira se identificaria como “transgênero ou não-binária” — um número que, aliás, parece até exagerado. Mesmo se fosse exato, é fácil perceber que estamos falando de um grupo muito, mas muito pequeno da população.

Ou seja, a decisão da UNICAMP tende a piorar o acesso à universidade pública, que já é bastante restrito. Agora, parte das vagas será reservada a um grupo ínfimo, o que significa menos espaço para o restante da população.

Quando o movimento negro defendeu cotas para a população negra, no início dos anos 2000, mesmo sem resolver o problema do acesso ao ensino superior, tratava-se de uma medida que beneficiava um setor enorme da sociedade. É possível debater a efetividade das cotas para negros, mas o fato é que os negros são a maioria da população e, nesse sentido, a proposta tinha algum impacto na ampliação do acesso.

No caso das cotas para pessoas transexuais, o efeito é o oposto. Não há avanço algum. Seguindo esse raciocínio, qualquer grupo minoritário — como índios, moradores da zona rural etc. — também poderia exigir a reserva de vagas.

Vitória contra o fascismo?

O texto do Esquerda Online diz que a aprovação das cotas para transexuais representou uma vitória contra a extrema direita:

“[…] em uma conjuntura de pautas defensivas e de resistência, arrancar uma vitória ofensiva, um novo direito para nosso povo, representa a imposição de uma derrota para nossos inimigos. Na arte da guerra, as vitórias e derrotas contam.”

Mas não há vitória nenhuma. É pura ilusão dizer que essa medida representou um avanço contra a extrema direita. É verdade que o bolsonarismo é contra medidas como essa, mas isso não quer dizer que ele tenha recuado ou sido derrotado.

Na prática, o efeito é o oposto. A decisão da UNICAMP tende a fortalecer o bolsonarismo, tanto dentro quanto fora da universidade. Os movimentos identitários, que tomaram conta do movimento estudantil nos últimos anos, são um dos principais fatores que alimentam o crescimento da extrema direita. Ela avança, em partes, em reação a eles.

O identitarismo, com suas reivindicações demagógicas e métodos repressivos (cancelamento, censura, leis autoritárias etc.), não tem condições de enfrentar a extrema direita. Ao contrário: reforça o aparato policial e repressivo e se opõe aos setores que realmente podem liderar essa luta — a classe trabalhadora e os setores empobrecidos da população.

As cotas para transexuais, portanto, não representam nenhum avanço na luta contra a extrema direita, como afirma o texto do PSOL.

Por que não se defende o fim do vestibular?

Por que os identitários nunca defendem o fim do vestibular e o livre ingresso nas universidades?

O fim do vestibular derrubaria de vez a principal barreira que impede os jovens de entrarem na universidade. Seria uma medida de fato democrática, que permitiria a universalização do ensino superior. É uma reivindicação da classe trabalhadora e uma reivindicação histórica do movimento estudantil que foi simplesmente abandonada.

Mas os identitários não querem isso. Estão mais preocupados em defender suas reivindicações específicas. O identitarismo tomou conta de boa parte da esquerda e gira em torno de bandeiras particulares: o transexual, a mulher, o negro, o índio — sempre de forma individualista e demagógica.

O identitarismo é uma ideologia promovida pelo imperialismo e apoiada por setores da pequena burguesia. Sua luta não é por direitos universais, mas por privilégios. Na prática, as cotas para transexuais beneficiam a classe média, que já dominam a universidade.

Os setores mais pobres da sociedade, que vivem longe das universidades, não têm nada a ganhar com essa medida.

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Last Update: 14/04/2025