Pelos resultados da última Cúpula pelo Clima, a COP 29, podemos afirmar que os ganhadores foram aqueles que não querem mudar nada. Aqueles que continuam sendo financiados pelos governos, aqueles que produzem os gases responsáveis pelo efeito estufa, aqueles que são privilegiados no planeta, aqueles que não são atingidos pelas consequências das mudanças climáticas.

Para começar, o que podemos esperar de uma reunião que, supostamente, tem o objetivo de buscar soluções para o aquecimento global, tenha entre suas delegações 1773 representantes dos combustíveis fósseis, que em conjunto significou a quarta maior delegação da Cúpula? De acordo com o Observatório do Clima, “Em Baku, há mais lobistas do que a soma de todos os delegados dos dez países mais afetados pela crise do clima: Chade, Ilhas Salomão, Níger, Micronésia, Guiné-Bissau, Somália, Tonga, Eritreia, Sudão e Mali têm juntos, 1.033 delegados, contra os 1.773 representantes da indústria fóssil. No ano passado, em Dubai, foram 2.456 lobistas credenciados. Mas, apesar do número total deste ano ser menor, a proporção de lobistas aumentou: a COP28 teve 97.372 pessoas credenciadas, enquanto a COP29 registrou 52.305 pessoas”.

E mais, quase a metade dos lobistas entrou como membros de delegações nacionais e o governo do Azerbaijão, país anfitrião, deu crachá de convidados para mais uma centena de representantes diretos da indústria petrolífera. Essa representatividade reflete o poder econômico e político desses setores, capazes de moldar o debate climático a favor de seus interesses. Ao invés de avanços significativos, a COP 29 foi marcada por um embate entre a urgência ambiental e a manutenção de lucros bilionários das empresas fósseis.

O principal ponto a ser resolvido na reunião, que tratava do financiamento climático, não teve nenhum avanço, como já tinha acontecido nas últimas cúpulas. Depois de dias e dias de conversas, se chegou a uma destinação de US$300 bilhões anuais de financiamento para ações climáticas em países em desenvolvimento, até 2035. O reivindicado era US$1,3 trilhões. De acordo com o Observatório do Clima, esse valor significa que cada um dos 45 países em desenvolvimento, mais vulneráveis às consequências das mudanças climáticas, ficaria com US$ 6,6 bilhões por ano. Para se ter uma ideia do que significa esse montante, o cálculo para a recuperação do Rio Grande do Sul – Brasil, após a devastação ocasionada pelas enchentes do começo do presente ano é de cerca de US$17 bilhões. Este é o real comprometimento dos ricos e poderosos com a transição energética e a preservação ambiental.

Os recursos financeiros continuam indo para os combustíveis fósseis

Apesar de apelos globais pela redução da dependência de combustíveis fósseis, governos e grandes corporações continuam investindo pesadamente na exploração de novas reservas de petróleo e gás. Em 2023, os subsídios diretos e indiretos a essas indústrias alcançaram recordes históricos, enquanto novas licenças foram concedidas para perfurações, até mesmo em áreas ambientalmente sensíveis, como o Ártico.

A incoerência, ou melhor, os verdadeiros interesses, podem ser vistos neste mapa abaixo:

Ou seja, enquanto os ricos do planeta e seus representantes nos enganam com cúpulas e discursos, o dinheiro está sendo destinado à fonte de contaminação e geração de gases que aumentam a temperatura da terra. De acordo com dados divulgados pela Fundação Urgewald estima-se que 96% das empresas de petróleo e gás estejam explorando e desenvolvendo novas reservas em 129 países, o que significa “o equivalente a 230 bilhões de barris de petróleo e gás inexplorados, cuja produção e queima geraria 30 vezes mais do que as emissões anuais de gases de efeito estufa da UE”.

E para completar, embora o carvão seja a fonte de energia mais poluente, sua utilização não apenas persiste, mas cresce em várias nações. Países como China e Índia ampliaram o uso de carvão para atender o crescimento de suas demandas energéticas.

Na COP 28, realizada em Dubai, em 2023, este foi o tema central. O impasse e o grande debate para a redação do documento final era justamente sobre a questão da redução gradual ou eliminação gradual do uso do carvão, petróleo e gás, as principais fontes de gases de efeito estufa e, portanto, a única maneira de conter o aquecimento global. No final da COP28 houveram comemorações com o resultado, já que, segundo os “otimistas”, haviam conseguido discutir pela primeira vez o tema dos combustíveis fósseis e haviam chegado a um acordo de estabelecer “objetivos globais para a transformação de sistemas energéticos rumo à neutralidade climática até 2050 e ao alcance do objetivo do Acordo de Paris de limitar o aumento de temperatura a 1,5ºC em relação a níveis pré-industriais”.

Ledo engano! Nem redução, nem eliminação gradual, nem investimento em técnicas para remoção de gás carbônico na atmosfera captaram recursos governamentais e privados como pode-se comprovar no quadro abaixo. Mas a expansão e exploração, sim.

Ainda que a tabela possa enganar alguns esperançosos que concentram sua visão na pequena redução de investimentos em combustíveis fósseis e um pequeno aumento em energia limpa, não nos iludimos, pois mesmo esses parcos aumentos foram com interesse no lucro, que é a base do sistema capitalista.

Sob a lógica capitalista, a suposta transição energética tem sido mais uma oportunidade de lucro do que uma resposta à crise climática. Essa farsa desvia a atenção do verdadeiro motivo do aquecimento global.

E, além disso, supondo que esse ritmo se mantenha, é impossível que ele possa cumprir com a redução necessária para chegar aos objetivos estabelecidos para manter a temperatura do planeta abaixo do 1,5º de aquecimento.

A verdadeira saída depende da organização e luta dos de baixo

O debate entre decrescentismo e produtivismo muitas vezes polariza as discussões climáticas. Por um lado, o decrescentismo defende a redução do consumo e da produção para minimizar o impacto ambiental. Por outro, o produtivismo aposta em soluções tecnológicas para conciliar crescimento econômico e sustentabilidade. A saída, no entanto, reside em um modelo que priorize a maioria, que permita que a maioria pobre e trabalhadora decida sobre a eficiência energética e o respeito aos limites planetários.

No cerne da crise ambiental está o sistema capitalista, que prioriza o crescimento infinito em um planeta finito. A lógica de acumulação e exploração é intrinsecamente oposta aos princípios de preservação ambiental. Sem uma mudança radical no sistema econômico global, as metas climáticas continuarão sendo balela e enganação, agravando os impactos das mudanças climáticas sobre a classe pobre.

A COP 29 confirmou, mais uma vez, as mesmas conclusões sobre a impossibilidade do sistema econômico capitalista permitir enfrentar a crise climática. Apesar das urgências e das demandas por ação, a conferência reafirmou que a transformação necessária depende da luta e da derrota da classe que domina as decisões e a economia no planeta. Apenas uma mudança estrutural do sistema poderá assegurar um futuro sustentável e impedir a barbárie que a cada dia cresce mais.

Publicado no Portal da LIT-QI


[1] Observatório do ClimaLobby fóssil na COP29 é maior que delegações de países mais afetados pela crise – OC | Observatório do Clima

[2] Quem está financiando a expansão dos combustíveis fósseis? – DW – 12/11/2024

[3] Governo celebra resultados da COP 28 nos Emirados Árabes — Planalto

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Last Update: 13/12/2024