Os governos federal, estaduais e municipais desembolsaram, no ano passado, 554 bilhões de reais na compra de bens e serviços de uso comum — itens essenciais para o funcionamento da máquina pública, como cadeiras, veículos, pinturas, geladeiras e reparos em geral. Uma bolada que o governo Lula vê como alavanca para pequenos negócios — e, para impulsioná-los, acaba de lançar uma plataforma digital de compras públicas.

Batizada de Contrata+Brasil, a iniciativa funciona como um marketplace, aproximando clientes (os governos) e fornecedores (vendedores de bens e prestadores de serviço). No início, apenas microempreendedores individuais (MEIs) poderão se cadastrar. Esse grupo é composto por negócios com faturamento anual de até 81 mil reais (ou 6.750 reais por mês).

As transações serão limitadas a 12,5 mil reais por contrato. No ano passado, compras desse porte somaram 6 bilhões de reais, o que representa pouco mais de 1% do total gasto em bens e serviços comuns. O governo federal acredita que é esse montante que poderá ser movimentado pela nova plataforma.

O teto das transações foi definido com base na Lei de Licitações, que estabelece o valor máximo para contratações diretas, sem necessidade de licitação. Hoje, essas compras ocorrem via pregão eletrônico, que, segundo o secretário de Gestão e Inovação do Ministério da Gestão e Inovação, Roberto Pojo, custa cerca de 35 mil reais para ser realizado. Com o Contrata+Brasil, o governo espera reduzir custos e burocracia.

Para participar, órgãos públicos e fornecedores precisarão se cadastrar na plataforma. Quando um órgão quiser, por exemplo, trocar azulejos de um banheiro ou consertar uma cerca, publicará um anúncio na ferramenta. Os fornecedores do setor serão notificados via WhatsApp e poderão apresentar orçamentos. O vencedor não será escolhido apenas pelo menor preço — o prazo de entrega também será um critério, como já ocorre no pregão eletrônico.“O marketplace amplia a cadeia de fornecedores, enquanto o pregão restringe”, afirma Pojo.

Esse modelo pode facilitar o acesso dos pequenos empreendedores às compras governamentais. Hoje, o Brasil tem 16 milhões de MEIs, sendo 3 milhões no setor de serviços. Porém, apenas 70 mil estão cadastrados como fornecedores do governo federal.

Pagamento rápido e estímulo à economia local

Uma das principais barreiras para MEIs no mercado de compras públicas é a demora no pagamento. Tadeu Alencar, secretário-executivo do Ministério do Empreendedorismo, da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, destaca que muitos microempreendedores não têm fôlego financeiro para esperar meses até receber.

No Contrata+Brasil, os pagamentos serão realizados em até cinco dias após a entrega do serviço, segundo o governo.

Outro diferencial é o uso de geolocalização para priorizar fornecedores da cidade ou região onde o serviço será prestado. “O objetivo primeiro é ativar a economia local”, diz Alencar.

O projeto tem um precedente: em julho de 2024, a prefeitura do Recife lançou o “Go Mei”, plataforma digital semelhante ao “Contrata+Brasil”. Ambas foram desenvolvidas pela Empresa Municipal de Informática (Emprel).

O prefeito da capital de Pernambuco, João Campos (PSB), participa do anúncio da iniciativa federal nesta terça-feira 11. Recife será a primeira cidade a cadastrar-se na plataforma, durante o lançamento dela em um encontro de autoridades federais com gestores municipais empossados em janeiro. O encontro ocorre em Brasília até a quinta 13. O presidente Lula esteve na abertura dele.

Apesar da inspiração pernambucana, a ideia de um marketplace governamental surgiu antes do “Go Mei”. Clarice Calixto, procuradora-geral da União, explica que a complexidade das compras públicas sempre foi um desafio. “Compras públicas são um grande pepino por causa do arcabouço jurídico”, diz Calixto.

Por isso, em 2023, a Advocacia-Geral da União (AGU) buscou o Ministério da Gestão para encontrar formas de desburocratizar essas transações.

Modelos semelhantes já foram adotados em países como Chile e Reino Unido. No caso britânico, a implementação de um marketplace fez o número de fornecedores de tecnologia da informação saltar de 20 para 5 mil. “Nossa plataforma é a iniciativa mais inovadora do governo desde o Concurso Nacional Unificado (CNU)”, diz Calixto.

Incentivos à indústria e agricultura

Outro aspecto da iniciativa é a implementação de um dispositivo legal que favorece empresas brasileiras. A Lei de Licitações permite que o governo pague até 10% a mais por produtos ou serviços de fornecedores nacionais, caso haja concorrência de empresas estrangeiras. Essa margem sobe para 20% se o produto ou serviço for fruto de inovação e tecnologia desenvolvida no Brasil.

Esse tipo de mecanismo não é exclusividade do Brasil. Nos Estados Unidos, políticas semelhantes são adotadas para proteger e estimular a indústria local.

Além de simplificar compras de bens e serviços, o governo planeja usar o Contrata+Brasil para facilitar a aquisição de alimentos da agricultura familiar. A legislação brasileira determina que 30% dos alimentos comprados pelo setor público sejam adquiridos de pequenos produtores, e a plataforma ajudará a cumprir essa meta a partir de julho deste ano.

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Last Update: 11/02/2025