A tentativa de tomada do Palácio Quemado por militares bolivianos atraiu a atenção da comunidade boliviana residente em São Paulo nesta última quarta-feira. Os desdobramentos da intentona militar que durou apenas cerca de duas horas continuam a ecoar, baseando-se em diferentes versões. Conversamos com algumas organizações destacadas dentro da comunidade andina da capital paulista para conhecer as diferentes visões sobre os fatos.
“Hoje, o povo boliviano enfrenta uma grave ameaça à sua democracia com a recente tentativa de golpe de estado”: assim inicia a nota do Centro Cultural Andino Amazônico (CCAA), que além de repudiar “qualquer ato que busque desestabilizar o governo legitimamente constituído”, clamou pela “unidade e apoio ao povo boliviano”.
A Associação Latino Americana de Arte e Cultura (ALAC) lançou nota de repúdio contra a tentativa de golpe de Estado contra o governo de Luís Arce, destacando a necessidade de criar-se dispositivos que garantam a soberania de países democráticos. Além de contextualizar os últimos acontecimentos na esteira do ascenso da ultradireita no mundo a partir da difusão pelas redes digitais, a ALAC menciona os recursos minerais disponíveis no país sul-americano:
“A Bolívia é um dos países com mais recursos minerais e lítio do mundo. É muito importante que as autoridades da nossa região manifestem seu apoio ao governo democraticamente eleito e ao povo boliviano, à sua democracia e à ordem democrática de direito na nossa região latino americana.”
A Associação acredita que existem interesses da elite e do mercado internacional em desestabilizar o país, sendo responsáveis por “sua política liberal de saqueio e de exclusão social, que provocou imigração massiva e conflitos sociais e armados, desigualdades sociais exacerbadas e a grave ofensiva contra a preservação do meio ambiente”.
Tânia Bernuy, coordenadora da ALAC, destaca sua preocupação quanto ao cenário político futuro. “O povo deve continuar a se mobilizar e organizar para chegar às próximas eleições ano que vem com respeito à democracia e ao processo eleitoral”, concluiu.
A Equipe de Base Warmis, formada por mulheres migrantes, soltou uma declaração condenando a intentona militar, exigindo a restauração imediata da ordem democrática, punição exemplar aos golpistas, respeito aos direitos humanos e o posicionamento firme contra esta ação por parte do governo brasileiro.
“A ação antidemocrática, liderada pelo General Juan José Zúñiga, representa um retrocesso inaceitável na luta por liberdade e justiça no país. Esta tentativa de golpe viola a soberania do povo boliviano e mina os pilares das instituições democráticas, além de desestabilizar a região e colocar em risco a paz e a segurança”
Diante da versão de que Luís Arce haveria articulado um auto-golpe com Zúñiga para elevar sua popularidade em meio às crises sociais e econômicas no país, Jobana Moya, da Equipe Base Warmis, acredita que “ainda seja muito cedo para tirar conclusões precipitadas”.
Moya ressaltou a destituição do ex-comandante do Exército boliviano poucos dias antes da tentativa de golpe desta semana, devido às declarações de cunho político proferidas publicamente pelo militar. Em meio às informações disponíveis, ela tende a pensar que o ato da última quarta-feira (26) foi “isolado, improvisado depois desse puxão de orelhas que ele foi destituído”.
Já para a diretora da Associação Cultural Folclórico Bolívia Brasil (ACFBB), Judith Sinaniz Gallegos, o ocorrido não passaria de uma “estratégia política do governo para justificar a má administração e voltar a ser favorito nas eleições de 2025, como defensor da democracia”.
Sinaniz acredita que diante da instabilidade econômica demonstrada a partir do desabastecimento de gasolina e escassez de dólares, o embate entre o ex-comandante Zúñiga e o presidente Arce teria sido um desentendimento pontual, pois “na Bolívia não tem motivo grande para golpe de Estado ou para tentativa”. “Isso não pode se considerar uma tentativa de golpe de Estado”, afirmou ao apontar que seria necessário que o Exército fosse apoiado pelos 9 estados para conseguir efetuar um golpe.