A derrubada, pelo Congresso Nacional, dos decretos presidenciais que aumentavam as alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) gerou forte reação do governo federal e de sua base aliada. A avaliação entre governistas é que a medida representa uma derrota da justiça tributária, ao impedir a taxação de setores mais ricos da sociedade e transferir a conta para os mais pobres, por meio de bloqueios em programas sociais e investimentos públicos.
Com a decisão, o Executivo perde uma estimativa de R$ 10 bilhões em arrecadação neste ano, obrigando o Ministério da Fazenda a ampliar os cortes no Orçamento de 2025, já pressionado pela meta de déficit primário zero. Segundo a ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, a revogação do IOF mais alto “prejudica programas sociais e investimentos importantes para o país”.
Governistas: “Revogação é vitória dos sonegadores”
Parlamentares da base do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmaram que a proposta de aumento do IOF era progressiva e justa, pois visava taxar mais quem tem mais — especialmente empresas, grandes investidores e operadores do sistema financeiro.
A deputada Érika Kokay (PT-DF) acusou os autores do projeto de defender “os interesses dos mais ricos” e afirmou que a revogação impede que o Brasil avance em uma reforma tributária com caráter redistributivo. “O que eles não conseguem admitir é que os ricos possam contribuir com o País”, criticou.
No mesmo tom, o deputado Tarcísio Motta (Psol-RJ) defendeu que o IOF proposto atingia pessoas jurídicas e grandes operações financeiras, e não o trabalhador comum. “Quem está lutando contra este decreto está a serviço de sonegadores e fraudadores”, disse.
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), foi enfático ao dizer que a derrubada do decreto “é um desserviço para o Brasil”. Segundo ele, o aumento do IOF seria uma forma legítima de tributar atividades pouco ou nada reguladas, como apostas, operações financeiras especulativas e grandes investimentos internacionais. “Não queremos tirar dinheiro dos pobres, e sim dos privilegiados do sistema”, afirmou.
Impacto bilionário no orçamento e risco de cortes sociais
O IOF mais alto havia sido anunciado como uma das principais medidas de arrecadação da equipe econômica, com expectativa de gerar R$ 61 bilhões em dois anos. Diante da forte pressão política, o governo recuou parcialmente nas alíquotas, mas ainda assim previa arrecadar R$ 30 bilhões com a versão final do decreto.
Com a revogação pelos parlamentares — por 383 votos na Câmara e maioria também no Senado —, a equipe econômica será forçada a buscar novas fontes de receita ou ampliar o bloqueio de gastos. O contingenciamento já anunciado é o maior desde 2019, somando R$ 31,3 bilhões.
Segundo o líder do PT, deputado Lindbergh Farias (RJ), a derrubada dos decretos deve levar a um contingenciamento extra de R$ 12 bilhões, afetando áreas sensíveis como educação, saúde e infraestrutura. “Quem votou pela derrubada terá de explicar ao povo por que faltam verbas para políticas públicas”, afirmou.
Oposição celebra vitória contra impostos e pressiona por corte de gastos
Na oposição, o tom foi de comemoração. Para os opositores, o aumento do IOF foi atacado como uma forma de onerar o setor produtivo e penalizar o empresariado.
O autor do projeto de decreto legislativo, Zucco (PL-RS), líder da oposição, disse que o governo “não quer cortar na carne” e prefere aumentar impostos a rever o tamanho do Estado. “Não falta receita, falta gestão”, declarou. Para ele, Lula precisa cortar nos serviços públicos para a população, em vez de taxar empresários, uma retórica típica da direita.
Deputados como Luiz Lima (Novo-RJ) argumentaram que o aumento do imposto atingiria diretamente empreendedores e prestadores de serviço. “Um ‘trabalhador’ que pega R$ 30 mil de crédito no ano teria que pagar R$ 300 a mais com o novo IOF”, criticou.
O líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), disse que “o povo brasileiro” foi quem “ganhou o presente” com a derrubada da medida. Já o deputado Pedro Lucas Fernandes (União-MA) apontou que o IOF encarece prestações e impacta quem compra no crédito.
Governo tenta salvar arrecadação com novas medidas
Para compensar a perda com o IOF, o Ministério da Fazenda já editou a MP 1303/25, que trata da taxação de investimentos e apostas online, além de propor medidas como a tributação de criptoativos, o fim da isenção sobre juros sobre capital próprio e a unificação do Imposto de Renda sobre investimentos.
A expectativa é recuperar cerca de R$ 10 bilhões, mas a proposta também encontra resistência no Congresso. Se a nova MP for rejeitada, o risco de um contingenciamento ainda maior se torna inevitável.
O embate escancara o impasse entre o discurso da austeridade e a busca por um sistema tributário mais justo. Para o governo, a derrota no Congresso representa o esvaziamento de um esforço para tornar a carga tributária menos regressiva e menos dependente do consumo da população mais pobre.