Estudo revela que ganhos do 0,1% mais ricos cresceu acima do PIB da China no período; proposta do governo de mudança no IR combaterá essa desigualdade
Um estudo recentemente publicado analisou as declarações do Imposto de Renda da última década e revelou que a concentração de renda no Brasil disparou no pós-pandemia de Covid-19. Entre 2017 e 2023, a renda do 0,1% mais rico cresceu 6,9% ao ano, enquanto a renda média das famílias brasileiras avançou apenas 1,4% ao ano. No topo absoluto da pirâmide, o 0,01% mais rico registrou aumento de 7,9% ao ano, superior ao do PIB da China no mesmo período. “Quanto mais se sobe na pirâmide, maior esse crescimento”, afirma Sérgio Wulff Gobetti, um dos autores do documento.
Realizado pelos economistas Frederico Nascimento Dutra e Priscila Kaiser Monteiro, além de Gobetti, o trabalho revela que metade da renda do 1% mais rico está concentrada no 0,1% do topo, e metade da renda do 0,1% está no 0,01%. Ou seja, apenas 160 mil pessoas passaram a deter uma fatia da riqueza superior à de 80 milhões de brasileiros, que correspondem aos 50% mais pobres e compartilham apenas 10% da renda nacional.
Renda dos milionários cresce a ritmo chinês (6,9% ao ano), enquanto renda do brasileiro mediano cresce apenas 1,4%, fazendo concentração de renda no topo aumentar muito no pós-pandemia, como mostramos no estudo divulgado pelos principais jornais do país.https://t.co/JOzcfC4taN pic.twitter.com/rIszYKCOO2
— Sergio Wulff Gobetti (@swgobetti1) August 19, 2025
Lucros e dividendos explicam grande parte do avanço. Para o 0,1% mais rico, 66% do aumento da renda veio desse tipo de rendimento. No restante do 1%, a participação da renda salarial diminuiu, enquanto os dividendos cresceram, indicando um forte processo de “pejotização”, quando trabalhadores ou sócios transformam renda de salários em rendimentos de empresas para reduzir a tributação. O estudo ressalta que esse fenômeno se intensificou no período pós-pandemia, impulsionado por inflação doméstica e alta dos preços de commodities, beneficiando grandes empresas e exportadores.
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Justiça fiscal: antídoto
Para reverter essa situação, que ficou ainda mais evidente com a pesquisa, o governo Lula enviou ao Congresso, na última segunda-feira (18), o projeto de lei que amplia a isenção do Imposto de Renda para brasileiros que ganham até R$ 5 mil por mês, a partir de 2026.
A medida será compensada pela maior tributação de quem recebe mais de R$ 600 mil por ano, chegando a 10% para rendimentos acima de R$ 1,2 milhão. Atualmente, os contribuintes desse topo pagam, em média, apenas 2,54% de IR.
A proposta é neutra do ponto de vista fiscal. Ou seja: não traz gastos extras para o governo. Os 141 mil brasileiros mais ricos passarão a contribuir mais para que 10 milhões de pessoas deixem de ser taxadas. Um sócio de empresa que recebe R$ 985 mil por ano passará a pagar 3,72% a mais de imposto, enquanto uma professora que recebe o piso de R$ 4.800 economizará quase R$ 4 mil por ano. Isso é justiça fiscal concreta.
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“O de cima sobe e o de baixo desce”
Segundo o estudo, o crescimento da renda no topo aconteceu em um período de baixo crescimento do PIB. Mas como? Os pesquisadores levantam uma hipótese: a inflação doméstica e a alta das commodities turbinaram os lucros, enquanto o restante da economia ficou para trás. Com essa fórmula, “o de cima sobe e o de baixo desce”, como já denunciava o cantor Chico Science, há mais de 30 anos.
Os autores reforçam que, além das transferências sociais e programas de proteção, é necessário reposicionar a tributação da renda no centro da política econômica, revisando isenções e privilégios, reduzindo incentivos à “pejotização” e tornando o Imposto de Renda progressivo e justo.
A proposta de Lula é essencial para equilibrar uma economia em que o topo cresce cinco vezes mais rápido que a média da população. O Brasil não pode mais sustentar privilégios travestidos de mérito. É hora de virar essa página.
Da Redação da Agência PT