Na sequência dos ataques que derrubaram as Torres Gêmeas em Nova Iorque, duas reuniões — uma em Telavive e outra em Washington — decidiram que o Iraque seria o próximo campo de batalha do imperialismo. O então primeiro-ministro israelense Ariel Sharon reuniu seu gabinete de segurança nacional e viu no acontecimento uma oportunidade estratégica: instrumentalizar os atentados para justificar uma guerra contra Saddam Hussein.
Do lado norte-americano, a engrenagem já estava montada. Figuras próximas a “Israel” no governo Bush, como Paul Wolfowitz, ocuparam posições-chave para conduzir essa agenda. O então secretário de Defesa, Donald Rumsfeld, e seu vice, Wolfowitz, iniciaram discussões internas para redirecionar o foco da resposta ao 11 de Setembro, desviando-o do Afeganistão e colocando o Iraque no centro das atenções — mesmo sem qualquer vínculo entre Saddam Hussein e os ataques.
O próprio Colin Powell revelou à Comissão do 11 de Setembro que Wolfowitz foi o primeiro a insistir que o Iraque era a origem do “problema terrorista”. Já no dia 11, mesmo com a Al-Qaeda sendo responsabilizada, o diretor da CIA George Tenet, autorizava a criação do Grupo de Operações no Iraque (IOG), liderado por veteranos das operações clandestinas na América Latina e Ásia Central. Em menos de 24 horas, o plano de desestabilização estava em andamento — o nome era DB/ANABASIS.
Essa operação secreta previa ações que iam muito além do “inteligenciamento”: incluía sabotagem, desinformação, guerra psicológica, incitação a levantes e assassinatos seletivos — tudo antes mesmo de qualquer declaração formal de guerra. A justificativa para invadir o país, baseada na falsa existência de armas de destruição em massa, viria depois, cuidadosamente construída para a opinião pública.
Veteranos como Luis Rueda e John Maguire, especialistas em desestabilizar governos considerados hostis aos interesses norte-americanos, voltavam ao jogo. Com apoio dos EUA, conseguiram cooperação de lideranças curdas em troca de promessas futuras. Enquanto o mundo acreditava que a guerra contra o terrorismo mirava o Afeganistão, o Iraque já estava sendo “amaciado” por dentro, quebrado sistematicamente por uma campanha de terror silencioso.
Do Iraque ao Irã: o roteiro imperialista da destruição
Em janeiro de 2002, Bush discursava sobre o “Eixo do Mal”, igualando Iraque e Irã. A retórica belicista não era improvisada: o texto foi redigido por David Frum, neoconservador ligado a círculos sionistas, seguidor da visão estratégica delineada por Ariel Sharon e seus aliados.
O raciocínio seguia a lógica do relatório “A Clean Break”, elaborado em 1996 para Benjamin Netaniahu por Richard Perle, Doug Feith e David Wurmser, entre outros. O plano original mirava o Iraque, o Irã e a Síria. Para disfarçar as digitais israelenses, a Coreia do Norte foi inserida como distração.
O plano era direto: derrubar o Iraque, depois o Irã, em seguida a Síria e o Hesbolá. A inserção da Coreia do Norte no discurso foi apenas uma manobra para encobrir a origem israelense do roteiro. Em 2003, o Iraque caiu. A Síria foi engolfada por guerra civil. O Irã agora é o alvo final — e a ANABASIS original, usada para fragmentar o Iraque, ganha uma nova versão.
Os mesmos métodos usados para destruir o Iraque estão sendo reciclados contra o Irã: sanções asfixiantes, assassinatos seletivos, sabotagens industriais e ataques psicológicos que visam desestabilizar o país desde dentro. O imperialismo busca provocar colapsos internos, minar a coesão social e gerar desconfiança generalizada — preparando o terreno para uma eventual intervenção direta ou para uma explosão social que favoreça uma mudança de regime submetido ao imperialismo.
Elementos centrais da nova ofensiva incluem o uso de grupos opositores iranianos, como os Mujahideen-e-Khalq (MEK), retirados da lista de organizações terroristas dos EUA por Barack Obama e realocados na Albânia, de onde operam ataques cibernéticos e terroristas. Também há cooperação com grupos separatistas curdos e balúchis, enquanto operações de assassinato são atribuídas ao MOSSAD, muitas vezes em colaboração direta com a CIA.
Casos como os assassinatos de cientistas como Mohsen Fakhrizadeh e os atentados em Teerã (2017), Ahvaz (2018), Chabahar (2019) e Shah Cheragh (2022, 2023) indicam uma estratégia contínua de eliminação de figuras-chave do Estado iraniano. O atentado em Kerman, em 2024, se encaixa no mesmo padrão. Até protestos legítimos, como os que se seguiram à morte de Mahsa Amini, são rapidamente infiltrados por agentes externos com objetivos de inflamar o conflito e promover o caos.
A sabotagem é um componente psicológico tanto quanto militar. Apagões, incêndios em infraestruturas estratégicas e ataques a civis têm como objetivo principal quebrar a confiança da população em seus líderes. Durante o apagão em Karaj, a aparição do ex-presidente do parlamento Ali Larijani na televisão foi usada para reforçar a narrativa de impotência estatal. O recado é claro: “ninguém pode protegê-los”.
Essas ações geram pânico interno e abalam o tecido social. Agentes da segurança nacional passam a suspeitar uns dos outros, caçam “traidores” e mergulham em ciclos de paranoia — exatamente como a CIA sofreu nos anos 1960 durante as “caças às toupeiras” que corroeram sua própria estrutura. O modelo agora é replicado no Irã, com precisão cirúrgica.
O que está em jogo não é apenas geopolítica: é a imposição de uma ordem internacional baseada na força, no desequilíbrio e na destruição planejada de nações que ousam desafiar o eixo Washington-Telavive. A guerra contra o Iraque, justificada por mentiras, agora serve de modelo para repetir a ofensiva contra o Irã.
Dentro do Pentágono, ainda há ressentimento pela resistência iraniana à ocupação do Iraque e pelo apoio de Teerã à insurgência contra as tropas americanas. O uso de IEDs sofisticados, como os penetradores de carga moldada (EFPs), é frequentemente atribuído à tecnologia iraniana — com a inteligência israelense sempre pronta para reforçar a acusação.
Esse ressentimento se mistura ao alinhamento incondicional à política israelense, particularmente em figuras como Mike Waltz, defensor de uma política de confronto direto com o Irã. Segundo a revista norte-americana Foreign Policy, há uma disputa entre a ala realista do “America First” e os neoconservadores entrincheirados que promovem sistematicamente mudanças de regime no Oriente Médio.