Como a Copa do Mundo de 1950 uniu o Carnaval e o futebol

A Seleção Brasileira, diferentemente dos clubes de futebol do País, não tem um hino próprio. Quando a “equipe canarinho” disputa uma partida, executa-se o Hino Nacional, conforme a tradição receitada pela Fifa (Federação Internacional de Futebol) e pelo COI (Comitê Olímpico Internacional). Afinal, para evocar a definição poética de Nelson Rodrigues, trata-se da “pátria de chuteiras”.

Lupicínio Rodrigues compôs o admirável hino do Grêmio, enquanto Lamartine Babo, num único dia, criou cânticos para os seis maiores times do Rio de Janeiro (Flamengo, Fluminense, Vasco da Gama, Botafogo, América e Bangu). No caso da Seleção Brasileira, nenhum gigante da MPB ousou propor um hino.

Houve, sim, canções que caíram no gosto popular ao celebrarem conquistas nacionais. Quando vencemos pela primeira vez a Copa do Mundo, em 1958, na Suécia, Wagner Maugéri, Maugéri Sobrinho, Victor Dagô e Lauro Muller lançaram A Taça do Mundo É Nossa, que associava futebol e música. Conforme sua letra, o Brasil “é bom no samba, é bom no couro”, já que “ganhou a taça do mundo sambando com a bola no pé”.

Doze anos depois, às vésperas do tricampeonato conquistado no Mundial-1970, no México, uma canção ufanista, Pra Frente Brasil, embalou a Seleção Brasileira. Com letra de Miguel Gustavo e melodia de Raul de Souza, a marchinha logo foi incorporada por uma ditadura militar que, no auge da repressão e do arbítrio, tentava promover o “Brasil do milagre”.

Mas foi numa Copa “para ser esquecida” que o Carnaval se uniu em definitivo ao futebol. Em 1950, a Fifa levou seu mais importante torneio para seis cidades brasileiras. A Copa não contou com um hino oficial, mas sobraram canções alusivas ao torneio, como as duas marchinhas lançadas naquele ano por Rubens Peniche – Colosso do Maracanã e Marcha da Torcida.

Outro compositor a seguir o rastro do Mundial foi o próprio Lamartine Babo. Por ocasião da disputa da Taça Jules Rimet, uma parceria entre Babo e Jorge Goulart resultou na Marcha do Scratch Brasileiro: “Eu sou brasileiro, tu és brasileiro / Muita gente boa brasileira é / Vamos torcer com fé / Em nosso coração / Vamos torcer para o Brasil ser campeão” (…) / Salve, salve / O nosso Estádio Municipal / No campeonato mundial / Salve a nossa bandeira / Verde, ouro e anil / Brasil, Brasil, Brasil”.

Quando a bola rolou, a torcida, de forma espontânea, converteu a marcha Touradas em Madri, de 1938, numa espécie de música extraoficial da Copa-1950. Tudo por conta da goleada de 6 a 1 da Seleção Brasileira sobre a Espanha, em 13 de julho, já no quadrangular decisivo.

Ainda no primeiro tempo, com o placar em 3 a 0 para o Brasil, os mais de 152 mil espectadores presentes no Maracanã passaram a cantar os versos de João de Barro, o Braguinha, e Alberto Ribeiro, consagrados nas vozes de Almirante e Carmen Miranda: “Eu fui às touradas em Madri / Pararatimbum, bum, bum / Pararatimbum, bum, bum / E quase não volto mais aqui (…) / Eu conheci uma espanhola / Natural da Catalunha / Queria que eu tocasse castanhola / E pegasse touro à unha”.

Ary Barroso – que, além de músico, era radialista, locutor esportivo e vereador – não ficou de fora. Confiante no desempenho do País no Campeonato Mundial, o autor de Aquarela do Brasil lançou mais um samba-exaltação, O Brasil Há de Ganhar, gravado em abril de 1950 por Linda Batista: “O Brasil há de ganhar / Para se glorificar / Bota a pelota no gramado / Palmas pro selecionado / Deixa a moçada se espalhar”.

No último jogo da Copa, o Uruguai venceu o Brasil por 2 a 1, de virada, e ficou com o título mundial. Em vez de música, os minutos finais do torneio foram marcados pelo “maior silêncio do mundo” – o Maracanã, tomado por mais de 200 mil pessoas, emudeceu após o segundo gol uruguaio. Mas a tradição de hinos, marchas, sambas e outras canções sobre a Copa do Mundo nunca mais se perdeu.

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