A Comissão Europeia apresentou nesta quarta-feira (3) o acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul para aprovação formal no bloco. O tratado, concluído em dezembro passado após 25 anos de negociações, é considerado o maior já assinado pela UE em termos de redução tarifária e precisará passar pelo crivo do Parlamento Europeu e de uma maioria qualificada entre os governos – pelo menos 15 dos 27 Estados-membros, representando 65% da população da União.
França resiste, mas abre brecha
O principal obstáculo continua sendo a França, maior produtora de carne bovina da Europa e crítica histórica do pacto. Paris já classificou o acordo como “inaceitável”, temendo a concorrência de carnes sul-americanas a preços mais baixos. A Polônia, outro peso pesado agrícola, também se manteve contrária.
Para suavizar a oposição, a Comissão propôs um mecanismo de salvaguarda: caso as importações do Mercosul aumentem mais de 10% ou provoquem queda equivalente nos preços, o acesso preferencial poderá ser suspenso temporariamente. O dispositivo permitiria reagir em até três semanas após uma reclamação. Além disso, Bruxelas anunciou um fundo de crise agrícola de € 6,3 bilhões para apoiar produtores europeus.
O ministro francês do Comércio, Laurent Saint-Martin, admitiu que a cláusula de defesa “é um passo na direção certa”. Já o primeiro-ministro polonês, Donald Tusk, afirmou que seu país seguirá contrário ao pacto, mas reconheceu que a falta de aliados torna “essencial” a adoção de medidas de proteção.
Trump e o reposicionamento europeu
A Comissão ressalta que o acordo com o Mercosul é peça central do esforço da UE para diversificar mercados diante das tarifas impostas pelo presidente dos EUA, Donald Trump, e da forte dependência da China para minerais estratégicos. Alemanha e Espanha lideram o grupo de países favoráveis, que enxergam na parceria uma oportunidade de expandir exportações de carros, máquinas, químicos e alimentos processados, além de garantir acesso ao lítio e outros insumos vitais para a transição energética.
Desde a vitória eleitoral de Trump em novembro de 2024, Bruxelas acelerou a busca por acordos comerciais, retomando tratativas com Índia, Indonésia e Emirados Árabes Unidos, e consolidando parcerias já existentes com Reino Unido, Canadá e Japão. No mesmo pacote apresentado nesta quarta, a Comissão também submeteu a revisão do acordo com o México, concluído em janeiro.
Pressão de agricultores e ambientalistas
Do lado contrário, agricultores europeus continuam mobilizados contra a ratificação, alegando que o tratado abrirá espaço para commodities sul-americanas “baratas e de baixa qualidade”, especialmente a carne bovina, que segundo eles não respeita padrões ambientais e sanitários da UE. A Comissão refutou as acusações.
Grupos ambientais reforçam a resistência. A ONG Amigos da Terra classificou o acordo como “destruidor do clima”, denunciando riscos de desmatamento e aumento das emissões. No Parlamento, os Verdes e parte da extrema-direita prometem votar contra.
Chances de aprovação
Apesar da resistência, fontes em Bruxelas avaliam que dificilmente se formará uma aliança de governos grande o bastante para vetar o acordo. Com as concessões agrícolas em negociação, a expectativa é que o Parlamento se torne o campo decisivo da disputa.
Se aprovado, o pacto UE–Mercosul criará uma zona de livre comércio com mais de 700 milhões de consumidores, abrindo espaço para uma das maiores integrações econômicas do planeta.