O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou nesta quarta-feira (23), durante entrevista coletiva, que a área técnica do governo concluiu os trabalhos para mapear os possíveis cenários e desenhar um plano de contingência contra a sobretaxa de 50% imposta pelos Estados Unidos a produtos brasileiros.

Os detalhes do plano serão apresentados a Haddad nesta quinta-feira (24) e, na semana seguinte, levados ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O objetivo é subsidiar uma decisão política embasada tecnicamente, segundo o chefe da equipe econômica.

“Nós estamos fazendo um trabalho de desenho de cenários para que o presidente possa estar bem apropriado de tudo que está em jogo e tomar a melhor decisão”, disse Haddad.

O plano foi desenvolvido em conjunto com os ministérios da Fazenda, Indústria e Comércio e Relações Exteriores, sob coordenação do vice-presidente e ministro da Indústria, Geraldo Alckmin.

O que se sabe sobre o plano de contingência até agora

Embora o conteúdo do plano não tenha sido revelado, Haddad confirmou que os cenários foram encomendados com base em parâmetros técnicos definidos pelos três ministérios envolvidos. As medidas podem envolver compensações econômicas, apoio ao setor exportador e mobilização diplomática e empresarial.

Não houve menção concreta a retaliações comerciais ou taxação de empresas estrangeiras. Segundo Haddad, eventuais iniciativas como taxar as big techs devem ser tratadas pelo Congresso e não estão na pauta do Executivo como resposta direta ao tarifaço.

Silêncio dos EUA trava negociações e aumenta incertezas

Apesar dos esforços diplomáticos brasileiros, as respostas dos Estados Unidos seguem limitadas e vagas. Haddad afirmou que o canal oficial de negociação com o Tesouro americano está fechado, e que os contatos têm ocorrido apenas em nível técnico — sem interlocução direta com o secretário do Tesouro, Scott Bessent.

“Estamos fazendo tentativas de contato reiteradas, mas há uma concentração de informações na Casa Branca”, explicou.

O próprio Alckmin, segundo relatos, também não teve sucesso ao buscar interlocução com a Secretaria de Comércio americana. O governo Trump tem centralizado as tratativas comerciais em sua assessoria mais próxima e sinalizado que só haverá avanço com autorização direta do presidente.

“Vai chegar a vez do Brasil”, diz Haddad

Apesar do impasse, Haddad demonstrou otimismo moderado, citando acordos recentes firmados pelos EUA com Japão, Indonésia, Filipinas e Vietnã como sinais de abertura para o diálogo.

“Nós tivemos boas surpresas em relação a outros países nos últimos dias. […] Vai chegar a vez do Brasil, e temos que estar preparados para quando sentarmos à mesa”, afirmou.

A fala reflete a estratégia do governo de manter uma postura de disposição para o diálogo, evitando escalar politicamente o conflito e preservando canais diplomáticos — ainda que informais.

Pressão empresarial cresce dos dois lados do Atlântico

Com os canais formais travados, o governo brasileiro passou a mobilizar também o setor privado. Alckmin e assessores buscam apoio de empresários afetados pela medida para que pressionem seus interlocutores americanos e forcem uma reabertura das negociações.

Nos Estados Unidos, algumas empresas — incluindo gigantes das áreas de energia, suco de laranja e tecnologia — já manifestaram desconforto com o impacto potencial da medida. Uma distribuidora americana de suco de laranja, por exemplo, acionou a Justiça para contestar as tarifas.

Lula deve avaliar impactos geopolíticos e diplomáticos

O governo brasileiro insiste em não politizar o debate, mesmo diante de indícios de que a medida de Trump tem motivação ideológica. O ex-presidente americano citou em discursos recentes a regulamentação das big techs no Brasil e investigações contra Jair Bolsonaro como justificativas para a sanção.

Haddad rejeitou qualquer ideia de escalada diplomática: “Não vejo escalada política de os países terem sua dinâmica institucional. Ninguém está escalando nada. Está todo mundo fazendo o seu trabalho.”

Internamente, porém, o Palácio do Planalto reconhece que a decisão de Trump pode ter sido pensada para criar um “caso exemplar”, intimidando outros países e desgastando a imagem do governo Lula. Auxiliares do presidente defendem, por isso, cautela estratégica e ênfase em argumentos técnicos.

Prazo até 1º de agosto preocupa

O relógio corre. A tarifa de 50% começa a valer oficialmente no dia 1º de agosto, deixando ao governo brasileiro menos de 10 dias para obter uma sinalização positiva dos EUA ou apresentar um pacote de medidas compensatórias às empresas afetadas.

Entre as propostas discutidas no plano de contingência, estão mecanismos de crédito emergencial, apoio fiscal e estímulos à diversificação de mercados. Governadores também têm apresentado iniciativas próprias, como o programa de R$ 200 milhões do governo paulista, classificado por Haddad como “bem-vindo, mas limitado” diante da escala do problema — que envolve cerca de US$ 40 bilhões em exportações. O ministro ressaltou a importância dos governadores bolsonaristas terem abandonado a postura de apoio ao tarifaço de Trump como um ataque a Lula e percebido a gravidade do problema para o Estado brasileiro e seu setor produtivo.

A reavaliação de cenários é diária e envolve tanto a diplomacia quanto o setor produtivo. A aposta do Planalto é que uma solução possa vir não apenas de Brasília ou Washington, mas também de Nova York, da Califórnia e de outros centros empresariais americanos que têm muito a perder com o tarifaço.

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Last Update: 23/07/2025