O Brasil pode não ser para iniciantes, mas os as previsões do mercado sobre a nossa economia parecem, sim, exercícios a cargo de novatos. Com um histórico de erros a granel, os “especialistas” da área se assemelham ao personagem da música de Raul Seixas que dizia ser “os olhos do cego e a cegueira da visão”.

Em janeiro, uma reportagem da jornalista Lílian Cunha para o UOL confrontou tais projeções aos dados oficiais no período de 2021 a 2024. O levantamento levou em conta cinco indicadores: Bolsa de Valores (Ibovespa), taxa básica de juros (Selic), crescimento econômico (PIB), dólar e inflação (IPCA).

Para saber o que o mercado agourava ano a ano, Lílian consultou edições do Boletim Focus – o informe do Banco Central (BC) baseado nos prognósticos semanais de mais de cem economistas ligados a instituições financeiras. O primeiro Boletim Focus de cada ano foi usado como referência.

O resultado: nada menos que 95% dos palpites dos analistas se revelaram equivocados. O mercado errou ao longo do governo Jair Bolsonaro (PL) e continua a errar durante a gestão Lula (PT). A chuva de enganos foi universal e ilimitada.

A fim de contemporizar o vexame, Claudia Moreno, do C6 Bank, disse que o importante não é acertar o número, mas, sim, a “direção”. Ao UOL, a especialista declarou: “Quanto antes você conseguir prever essa direção, mais o investidor tem tempo de se preparar e ganhar dinheiro”.

É como se Claudia aplicasse o conceito de “margem de erro” aos vaticínios do mercado. Mas que margem! A tese faria sentido se o conceito de “direção” fosse mais preciso – e se alguns erros pudessem ser relativizados à luz de tamanha flexibilidade estatística.

Não é o que ocorre, porém, com as adivinhações do mercado em relação ao PIB (Produto Interno Bruto) sob o governo Lula. A discrepância é tão grande que carece de explicações menos simplórias do que as de Claudia Moreno.

Quando Lula assumiu seu terceiro mandato presidencial, homens e mulheres do mercado eram só pessimismo. No primeiro Boletim Focus após a posse, publicado em 6 de janeiro de 2023, os analistas anunciavam uma nação estagnada – a projeção média era de um “pibinho” de 0,78%. Alguns agentes citavam até o risco de recessão.

Doze meses depois, a economia não havia estagnado, nem tampouco decrescido. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a expansão do PIB em 2023 foi de 3,2% – quatro vezes acima da estimativa do mercado.

Sobreveio o segundo ano de Lula 3 – e o bota-abaixo do mercado persistiu. De acordo com o BC, o Índice de Atividade Econômica (IBC-Br), considerado a “prévia do PIB”, foi de 3,8% em 2024. A taxa oficial de será divulgada no próximo dia 7 de março.

Já é certo, porém, que a “bola de cristal” do mercado voltou a quebrar. O Boletim Focus de 5 de janeiro de 2024 antevia um crescimento de apenas 1,52%. A “direção” estava um pouco mais alinhada, mas, desta vez, a realidade ficou 2,5 vezes superior à profecia.

Por incompetência ou má-fé, o mercado paga para ver a própria desmoralização. Não há razoabilidade nenhuma em minimizar o disparate e dizer que analistas ao menos acertaram a “direção”. Ao contrário: uma visão turva dessas proporções prejudica não apenas os investidores – mas toda a população.

É fato que, para azar do Brasil e dos brasileiros, os investimentos externos ficam em xeque se o catastrofismo prevalece no discurso, com ou sem fatos que o sustentem. Mas o alcance das vozes do mercado impacta de várias outras maneiras os rumos de uma economia.

Autoridade monetária do País, o Banco Central se afiança sobretudo na “percepção” do mercado para impor sua política ultraliberal, mantendo o Brasil há anos entre os países com as maiores taxas reais de juro. Com um BC “independente” e com analistas doentiamente hostis a governos progressistas, a fórmula é explosiva.

Uma instituição pública e um conglomerado privado se unem em torno de interesses nada louváveis. Ainda que erros de projeções tenham virado a regra desse jogo sinistro, as pressões por ajustes fiscais e corte de gastos sociais, reverberadas integralmente pela grande mídia, ganham ares de verdade absoluta. Está dada a senha para todo tipo de chantagem contra Lula e seu governo.

A boa notícia é que, em 2025, a aposta inicial do mercado para o salto do PIB brasileiro está menos conservadora. No Boletim Focus que abriu este ano, em 3 de janeiro, analistas desenhavam um crescimento de 2,02%. A prosseguir o histórico de erros desses experts, dá para cravar que dias melhores virão.

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Last Update: 24/02/2025