De olho no espólio político de Jair Bolsonaro (PL), os governadores Romeu Zema (Novo-MG) e Ronaldo Caiado (União-GO) aceitaram o convite para participar da chamada ‘COP do Agro’, prevista para outubro em Marabá (PA). Ambos se colocam como pré-candidatos à presidência em 2026 e têm usado o agronegócio como plataforma de legitimação.

A ‘COP do Agro’ foi planejada como contraponto à COP 30, que será realizada em Belém (PA). Enquanto a ONU promove o debate sobre ações contra a mudança climática, o encontro ruralista pretende projetar outra imagem – e mirou alto ao convidar Donald Trump, símbolo da extrema direita antiambiental. A escolha do local também chama atenção: o sudeste do Pará carrega um histórico de massacres rurais, como os de Eldorado dos Carajás e Pau D’Arco.

“De antemão, digo que farei de tudo para estar presente lá”, afirmou Zema. “Eu estarei com vocês”, prometeu Caiado. As declarações foram divulgadas em vídeos compartilhados pelo organizador do evento.

O encontro defende os interesses o agronegócio exportador. Oficialmente, os organizadores rejeitam a pecha de negacionistas climáticos. Nos bastidores, porém, disseminam a tese de que a responsabilidade pela crise ambiental é problema dos países ricos, enquanto minimizam o impacto das atividades agropecuárias – embora 74% das emissões brasileiras estejam associadas ao setor, segundo o Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa.

Desde a eleição de Lula, a politização do agro se intensificou. Sem Bolsonaro na disputa de 2026 — inelegível até 2030 —, Zema, Caiado e Ratinho Jr. se articulam para herdar o eleitorado bolsonarista. Precisam superar a preferência já declarada tanto do agro quanto do empresariado pelo governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas (Republicanos).

Caiado é um ruralista orgânico: foi fundador da UDR União Democrática Ruralista, criada nos anos 80 para combater a reforma agrária. Zema não veio do campo – é herdeiro de uma poderosa rede varejista mineira – mas se esforça para forjar essa identidade. E, no governo mineiro, tem tentando se aproximar do agro.

Agora, Zema frequenta feiras, desfila de trator e dispara críticas ao MST. Mais recentemente, vestiu um boné com a inscrição “Abril Verde”, cunhada para se contrapor ao Abril Vermelho, jornada de lutas e ocupações em memória dos 21 trabalhadores rurais sem terra executados em Eldorado dos Carajás.

Narrativa ruralista

Zema e Caiado receberam o convite para participarem da COP do Agro durante a Expozebu, em Uberaba (MG). O governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), também participou. Na ocasião, Zema pregou a união: “No ano que vem, Caiado, Ratinho, tenho certeza de que nós estaremos tirando esse governo que persegue quem produz, que persegue quem trabalha. O Brasil não merece. Estaremos caminhando juntos para um Brasil melhor.”

O fortalecimento da narrativa ruralista nas grandes feiras do agro, como em Uberaba e na Agrishow, em Ribeirão Preto, que começa nesta segunda-feira 28, evidencia a politização do setor. Governadores e empresários repetem, nesses eventos, o discurso da defesa irrestrita da propriedade privada e da criminalização do MST.

“Nos nossos Estados, sejam Paraná, Goiás e Minas, abril é verde e amarelo e não tem abril vermelho porque bandido não cresce enquanto nós governarmos os nossos estados”, afirmou Caiado.

MST e o governo

O MST, contudo, também se movimenta. Durante o Abril Vermelho de 2025, mobilizou 50 mil militantes em 47 municípios e realizou 28 ocupações sob o lema ‘Ocupar para o Brasil Alimentar’, denunciando o modelo agroexportador que prioriza commodities enquanto o preço dos alimentos básicos dispara.

Os dados são expressivos. O Censo Agropecuário indica que 70% dos alimentos consumidos no Brasil vêm da agricultura familiar, enquanto a Comissão Pastoral da Terra registrou 2.185 conflitos rurais em 2024, o segundo maior número desde o início da série histórica, na década de 80. Indígenas, quilombolas e camponeses seguem sendo as principais vítimas.

O governo Lula mantém uma relação ambígua com o MST, evitando confrontos diretos. O presidente cancelou viagens a Rondônia, Pará e Paraná para participar do funeral do Papa Francisco, frustrando cerimônias planejadas para entrega de terras e regularização fundiária. Embora tenha oficializado alguns assentamentos, como o Quilombo Campo Grande, em Minas Gerais, o MST critica a lentidão do governo.

Enquanto o governo hesita, o agro se organiza. Em 2026, estará também em disputa o direito de semear, colher e decidir o futuro da terra no Brasil.

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Last Update: 28/04/2025