“O frequentador da Coréia é o único torcedor autêntico do futebol.
Não é o espetáculo que o atrai. Dali onde ele fica não se vê espetáculo algum.
A única visão desimpedida que ele tem é dos fundilhos do bandeirinha.
O resto ele adivinha.
O coreano está ali por que tem que estar.
Seu compromisso não é com o jogo, que ele não vê, é com o time.
Como não enxerga os detalhes vive apenas os momentos decisivos do jogo, as grandes explosões.
O resto é uma angústia cega, do pescoço esticado.
Todas as outras misérias da sua vida lhe são impostas, essa é a única miséria que ele escolhe.”
Luis Fernando Veríssimo, no livro “Internacional: autobiografia de uma paixão”
“Coréia” era – era, pois não existe mais – um setor muito popular e barato do estádio Beira Rio e assim nomeado em referencia à guerra dos anos 1950. Os torcedores ali pareciam numa trincheira, estavam literalmente num fosso abaixo da arquibancada inferior.
Mas vamos ao assunto.
A campanha DoeArena
Há uma campanha de arrecadação financeira em andamento. Vaquinha. Organizada pela torcida Gaviões da Fiel e pelo Corinthians, do qual este que escreve é torcedor desde a tenra infância e sempre será. Que fique claro.
A ambição da vaquinha, que em poucos dias já arrecadou mais de R$30 milhões, é gigantesca: quitar ou ao menos saldar parte da dívida de R$710 milhões ligada à construção da Neo Química Arena. Este é o nome oficial do estádio do Corinthians. Conhecido também como Itaquerão, em referência ao bairro na periferia de São Paulo onde está localizado. Cientes da ampla desconfiança que gozam os dirigentes de clubes de futebol, a vaquinha direcionará o dinheiro para a Caixa Econômica Federal (credora da dívida) sem intermédio do clube nem dos Gaviões. Independentemente do resultado (montante) final da campanha, já se trata de algo histórico e muito marcante. Disso não se pode ter dúvida.
A cifra já arrecadada é espantosa e nos dá mais mais uma mostra da colossal capacidade de mobilização social ligada a este esporte fascinante. Capaz de arregimentar apoio em escala que nenhum outro se aproxima. São poucos os exemplos de vetores sociais ou políticos capazes de tamanha mobilização. Seja presencialmente seja pela televisão, praticamente o ano inteiro. Alguns diriam até durante a vida inteira. Milhões de pessoas acompanham com real interesse e verdadeira atenção cada detalhe de cada rodada, cada revisão do VAR, cada transferência de atletas, cada nova ou velha polêmica, cada campeonato e copa. Na maior parte do tempo, é justamente sobre isso que se fala: campo&bola. É impedimento milimétrico, é bate boca entre atletas e árbitros pela marcação ou não de faltas insignificantes ao jogo, simulação de faltas e longo etc bastante superficial. O cartola corrupto ou inescrupuloso tem pouca atenção da grande mídia. O técnico ou o jogador abusador, e mesmo estuprador, recebe generosas doses de indulgência. As trocas de favores e esquemas que limitam a imensa maioria dos jornalismo de criticar a CBF e as diretorias dos clubes são escandalosos. Então, em um momento como este, em que alguns holofotes se voltam para um tema fora do campo de jogo, é importante que se aborde o debate com alguma profundidade.
Esta é mais uma página da história da torcida organizada que lutou contra o autoritarismo bolsonarista nas ruas e se mobilizou para ajudar quem mais precisava durante a Pandemia. Mais uma página na história do clube que inspirou pessoas de todo o mundo com a Democracia Corintiana, processo histórico que explicarei um pouco mais pra frente.
Futebol e as “vaquinhas”: um pouco de história
A iniciativa da vaquinha atual é notável e está longe de ser novidade.
Nosso arquirrival Palmeiras, quando ainda se chamava Palestra Itália, movera uma campanha popular de arrecadação de fundos para comprar o terreno daquele que seria seu primeiro estádio, o Parque Antarctica. Ali, o senso de comunidade italiana – esteve muito presente e certamente contribuiu para o fortalecimento dos vínculos entre eles.
Em 1971, o próprio Corinthians botou em marcha um campanha popular de arrecadação de fundos. Barris de madeira foram distribuídos por São Paulo e cada corintiano, cada corintiana depositava ali o que podia se somando ao esforço para tentar contratar Paulo César Caju, craque do Botafogo. A campanha foi um fracasso e Caju seguiu no Rio de Janeiro.
Em 1995, o Grêmio fez o possível para tentar manter Mário Jardel em seu elenco e convocou a torcida a colocar a mão no bolso. Através de ligações telefônicas as pessoas doavam R$3,00 ou compravam bônus de R$5,00 ou R$10,00 e ajudaram o clube a arrecadar R$300.000,00 na campanha “Fica Jardel!”. Porém o valor não bastou, ele foi transferido e se tornaria uma lenda no Porto, em Portugal, onde ficaria para sempre conhecido como o Super Mário.
Pouco depois, em 1998 a Federação Paulista de Futebol queria trazer Marcelinho Carioca de volta ao futebol brasileiro, pois estava “encostado” no Valência da Espanha. Criou então uma campanha onde cada ligação, ao custo de R$3,00, contribuiria para a caríssima transação. A campanha que ficou conhecida como Disque Marcelinho daria o jogador ao time que mais recebesse telefonemas entre os 4 grandes de São Paulo. Marcelinho era antes e seguiu sendo da Fiel.
Ainda sobre vaquinhas e estádios, provavelmente a mais espetacular história seja a da construção do estádio do Club de Regatas Vasco da Gama. Oficialmente “Estádio Vasco da Gama”, é mais conhecido como São Januário, por conta do bairro onde está. O estádio começou a ser construído em 1925, quando o clube fez campanhas para que torcedores se tornassem sócios e arrecadou 685 contos e 895 mil réis para a compra do terreno e 2 mil contos de réis para a construção.
Mais do que dinheiro e se tornar associado, o projeto contou com várias formas de apoio do povo vascaíno: constam nos registros do clube a doação de pequenas e grandes quantidades de materiais de construção e até mesmo de mão de obra, com vascaínos disponibilizando horas de trabalho voluntário ao seu clube. Como nos informa o site do Vasco: “Era comum naqueles dias ver vascaínos subindo a rua São Januário em carroças para doar cimento, pedra e areia para a construção. A força de trabalho contratada para a obra foi complementada por voluntários de todos as áreas. Eram pedreiros, serventes, carpinteiros, marceneiros, vidraceiros, bombeiros hidráulicos, engenheiros e projetistas orgulhosos em servir ao seu Clube e à nobre missão de colocar de pé o ‘Gigante da Colina’.”
Futebol é política: identidade, comunidade e resistência!
Se alguém ainda tem dúvidas, não é que futebol e política se misturam. Futebol é política. Diminuir sua importância ao gramado onde rola a bola é ignorar completamente sua imensa relevância social e desprezar sua história. Instrumento de poder e propaganda, representação de identidades, mobilização social e resistência, eixo de dinâmicas econômicas e políticas: o futebol é política. Ao mesmo tempo que um espelho da sociedade, o futebol é um palco onde questões de poder, comunidade e inúmeros conflitos se manifestam. Especialmente quanto mais sua indústria e influência sócio-cultural crescem sem parar como nos tempos atuais.
Sobre as motivações para a vaquinha atual, de acordo com o site oficial para doar:
“1. Orgulho e Identidade Corinthiana: A Arena Corinthians é um símbolo de orgulho para o clube e seus torcedores. Quitar o estádio é quitar a nossa segunda casa. Significa a plena posse do clube sobre o palco que reúne os torcedores em torno da sua maior paixão.”
“2. Liberdade Financeira: Quitar a Arena Corinthians eliminaria uma dívida gigantesca que pesa sobre a saúde financeira do clube. Atualmente, o financiamento da dívida limita o investimento em outras áreas, como reforços e infraestrutura.”
“3. Mobilização da Torcida: Ter a Arena Corinthians quitada é um desejo de todos os torcedores e a Fiel Torcida já manifestou o interesse em fazer parte desse projeto por meio de uma enquete realizada na página do Gaviões, onde 96% dos torcedores responderam positivamente para a ação.”
Clubes de futebol, por todo o mundo, expressam as mais variadas identidades e carregam os mais distintos valores. É extremamente comum que seus torcedores, adeptos ou fãs tenham as cores do time, seu escudo, seu hino, seus ídolos históricos e tradição como algo valiosíssimo, cheio de significados e afetos, como elementos criadores de sentido de pertencimento, de comunidade.
No leste da Turquia, há um time que encarna a resistência curda ao massacre movido pelo estado turco já há muitas décadas. Fundado em 1972, o Amedspor se chamava Diyarbakır – nome oficial, em língua turca, da cidade onde se localiza – até 2015 pois era proibido ostentar um nome curdo. Amed é o nome curdo da cidade. Nunca se verificou qualquer ligação do clube com o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), acusado pelo Estado turco de terrorismo, mesmo assim o clube é constantemente perseguido pelas autoridades e pelos nacionalistas turcos. Há pouco mais de um mês o clube alterou seu hino e agora afirma categoricamente: “Vocês não são apenas um clube de futebol, vocês são a esperança e a resistência de um povo.” Apesar das constantes multas aplicadas pela Federação Turca e do clima hostil e racista que constantemente enfrenta, recentemente o time ascendeu à segunda divisão e segue vivo como símbolo da resistência e força de todo um povo. Sua torcida conta inclusive com o coletivo feminista Mor Barikat (Barricada Lilás).
Algo similar encontramos no Chile. O clube Palestino é mais um exemplo de como o esporte, e especialmente o futebol, extrapola as fronteiras do jogo. Fundado em 1920 por imigrantes palestinos e sediado em Santigo, o clube pretendia inicialmente promover a integração social e cultural daquela comunidade. O Club Deportivo Palestino carrega as cores e símbolos palestinos em seu uniforme e, em 2014 chamou atenção internacionalmente ao apresentar em seu uniforme o mapa histórico da Palestina – aquele antes de o sionismo invadir e mutilar o território – como parte dos números dos jogadores. A atitude vista como polêmica reafirmou o compromisso com a herança cultural e política da comunidade que representa. Com algum sucesso nos campos, o clube chegou mesmo a vencer o Campeonato Chileno em 1978, e este ano venceu o Flamengo pela Libertadores da América jogando em casa por 1×0.
Há ainda o clube cuja torcida se autoproclama a mais racista do mundo. O Beitar Jerusalem, de Israel, nunca contou com um único jogador árabe em seu elenco. Quando dois muçulmanos de origem chechena foram contratados, a torcida organizada “A Família” incendiou as instalações do clube como protesto.
São identidades que surgem em determinados contextos históricos e precisam ser constantemente renovadas, alimentadas e estimuladas para que sigam adiante de geração em geração. Sejam elas identidades inclusivas, democráticas, de resistência e anti-autoritárias ou as reacionárias.
“Em futebol, o pior cego é o que só vê a bola.”
Nelson Rodrigues
O que é, afinal, a tal “identidade Corintiana” a que a campanha de doações se refere? O que torna na prática um time “do povo”? Sua imensa quantidade de torcedores basta? Mas isso se refere à sua popularidade, não a que orientação terão as práticas do clube. Sua história e tradição são elemento centrais a se considerar.
A identidade corintiana é profundamente ligada ao povo humilde, à classe trabalhadora e suas demandas democráticas, anti-autoritárias. Diferentemente do Palmeiras, cuja origem é a comunidade italiana em São Paulo. Assim como do São Paulo Futebol Clube ligado à classe média urbana e mais elitizado em sua origem.
A própria origem dos Gaviões da Fiel, em 1969, ou seja durante o Regime Militar, é essa: “Objetivo da Gaviões era derrubar o Wadih Helu, o ditador que estava dentro do Corinthians. Já que dentro do clube não conseguíamos organizar a torcida, passamos a fazer manifestações públicas nos jogos”, lembra Malfitani, fundador da torcida organizada.
Vale a pena resumir quem foi Wadih Helu, dirigente intimamente ligado à repressão. Wadih Helu foi presidente do Corinthians por 5 mandatos, de 1961 a 1971 e também Deputado Federal pela ARENA, o partido da ditadura. Foi deputado por 9 mandatos, de 1967 até 2003. Morreu em 2011 como conselheiro vitalício do Corinthians, pois o estatuto elitista e restritivo do clube lhe deu esse direito. A ditadura sempre soube do potencial de mobilização social do esporte. Especialmente se tratando do futebol e fez tudo que pôde para manter sua violenta tutela aí também. Em entrevista recente, o jornalista Juca Kfouri contou que seu antigo dirigente político na ALN (Aliança Libertadora Nacional), conhecido como Toledo fora preso e torturado numa chácara de propriedade de Wadi Helu. É dele a responsabilidade por essa vergonhosa publicação em nome do clube, quando do golpe militar de 1964:
Mas esse período perverso e triste da história corintiana é minúsculo diante da imensa Democracia Corintiana, esta sim elemento central e definidor da identidade corintiana. Ostentar coerentemente o título “Clube do Povo” deveria pressupor não apenas identidade e senso de comunidade mas participação real, mobilização efetiva. Deveria significar colocar o povo, o torcedor no centro de suas práticas cotidianas e políticas, sujeito ativo do processo de tomada das decisões.
A identidade corintiana é a Democracia Corinthiana
Em abril de 1981, Waldemar Peres foi eleito presidente do Corinthians e colocou como Diretor de Futebol um sociólogo que pouco sabia de futebol, como ele mesmo admitia. Uma coisa ele sabia: como estava não era possível continuar. Homem de cabeça aberta, atento ao momento político do país e disposto a promover mudanças, Adílson Monteiro Alves encontrou jogadores com a mente tão aberta – e politizada – quanto ele. Sócrates, Wladimir, Casagrande e todo elenco recebeu uma mensagem clara do diretor de futebol: suas vozes serão ouvidas aqui.
Dessa união improvável surgiria o único movimento realmente democrático que o mundo do futebol já viu. Não há paralelos pelo mundo: todos votavam e tinham peso igual para decidir diversos assuntos do time. Se ficariam ou não concentrados; se o clube contrataria ou dispensaria um atleta ou técnico; sobre consumo de álcool por parte dos atletas; se a premiação extra em dinheiro recebida por vitórias e títulos (o famoso “bicho”) seria dividido entre os trabalhadores do clube (e foi) entre outras coisas tanto da administração quanto do jogo em si.
Para além de revolucionar o ambiente tão conservador do futebol, a Democracia Corintiana claramente desafiava a própria Ditadura. Em um época que a classe trabalhadora não tinha direito ao voto e tantos outros direitos, quem falava em participação real e voto direto se chocava necessariamente com o Regime. Também porque o movimento sediado no Parque São Jorge dialogava com a campanha das Diretas Já que exigia eleições diretas.
A conexão óbvia e necessária com o legado desse movimento segue vivo nos protestos recente protagonizados pela Gaviões da Fiel e outros coletivos.
Futebol é política: participação e direitos dos torcedores
O – mal – exemplo mais gritante certamente é o do Flamengo. Já há várias décadas é disparado o clube mais popular do Brasil. Mas está longe, muito longe de ser do povo. Mais de 40 milhões de brasileiros se declaram flamenguistas (o segundo colocado é o Corinthians com pouco mais de 30 milhões), mas o ridículo número de 1731 votos bastaram para eleger o presidente do clube em suas últimas eleições, em 9 de dezembro de 2024. Foram computados 3272 votos no total. Parece brincadeira, mas foram registrados 5 votos em branco e 7 nulos na eleição que ditará os rumos do clube cuja massa de apoiadores é maior que muitos países.
Mas o Corinthians é regra e não exceção. Na última eleição foram computados um total de apenas 4184 votos. 2771 votos bastaram para eleger Augusto Melo o novo presidente do Timão. Atualmente votam apenas os sócios do clube social com mais de cinco anos de associação e com as mensalidades em dia (somente o titular vota, dependentes não). Para fins de comparação, vamos considerar não algum clube mais democrático e aberto a seus torcedores, mas os Gaviões da Fiel: sua última eleição em março de 2024 contou com 5942 votos.
É uma possibilidade real a participação significativa dos torcedores nos processos tanto eleitorais quanto decisórios. Poderiam ter órgãos consultivos que reunissem milhares de pessoas, porque não dezenas de milhares já que os times movem literalmente milhões de fãs Brasil e mundo afora. A Internet possibilitaria tal participação de forma muito simples e prática, além de segura. Basta querer fazê-lo. Já é passada a hora que os estatutos sociais dessas instituições sejam reformulados, tornando-os mais acessíveis e democráticos. São várias as possibilidades disso aliás. Em eleições diretas e ou indiretas, órgãos consultivos e ou deliberativos, instâncias de poder e decisão quanto aos rumos e políticas adotadas. Podiam ser feitas enquetes ou outros tipos de mecanimos de consulta pública sobre os mais variados temas. Não tem mais cabimento que um conselheiro do Corinthians tenha a audácia, como teve recentemente, de afirmar que “O clube não é do torcedor, o clube é do associado.” quando questionado sobre a transparência dos processos decisórios do Corinthians.
Porém, técnica e lamentavelmente, ele não está errado e esse é justamente o problema. Vejamos 4 itens definidores do clube: seu formato jurídico é Associação Civil sem fins lucrativos. Tecnicamente o clube pertence aos associados do clube (não confundir com os pagantes do clube de compras Fiel Torcedor). Não há divisão de capital social, como em empresas. A receita gerada deve ser reinvestida no clube. A gestão é governada por estatuto próprio e dirigido por um presidente e um corpo administrativo, eleitos pelos associados com direito a voto. A administração deve prestar contas somente aos órgãos internos do clube, como o Conselho Deliberativo. Apesar do debate muito atual sobre as SAF´s (Sociedade Anônima do Futebol) o Corinthians mantém o modelo tradicional, praticado pela maioria dos clubes do país.
Os milhares de pagantes do programa Fiel Torcedor (espécie de “clube de compras” que dá descontos e prioridade na compra de ingressos) não têm qualquer direito nesse sentido. Nem de voto, nem consultivo, nada. Numa palavra: clientes, é assim que são vistos pela diretoria do clube. Entretanto, a discussão sobre dar direitos a estes torcedores não é nova. A esse respeito, ambos candidatos da última eleição no Corinthians têm a mesma postura: se dizem a favor. Dizem e acaba por aí. Já há mais de 1 anos eleito, Augusto Melo segue o modus operandi dos políticos profissinais e se esquece do que falou em campanha.
São 43 mil os sócios/clientes do Fiel Torcedor. Caso essa massa pudesse participar dos processos eleitorais e ou deliberativos, isso sim nos colocaria no alto da lista das maiores eleições de clubes do mundo. Aí sim poderíamos dar passos importantes para democratizar o clube, honrando a tradição de Sócrates, Casagrande, Wladimir & cia e então entraríamos no caminho colocar o clube nas mãos do povo.
Novamente, o Corinthians é regra e não exceção neste sentido.
Vejamos alguns bons exemplos de exceções atuais.
Na última eleição do Benfica em 2021, 40.115 sócios votaram em algum dos 25 locais de votação distribuídos por todo o país, inclusive os habitantes das ilhas da Madeira ou Açores. O segundo time da capital lusitana, o Sporting, contou com 16 mil votos. Vale lembrar que Lisboa conta com cerca de meio milhão de habitantes e São Paulo cerca de 11 milhões. O Corinthians conta uma massa de torcedores de mais de 30 milhões de pessoas, o equivalente a 3 vezes Portugal todo. É absurda a diferença! O nível de restrição e elitização na alta cúpula do clube é alarmante e absolutamente incompatível com o slogan marqueteiro “Clube do Povo” que tanto usam em benefício próprio. Tal nível de fechamento em si mesmo é, na verdade, um insulto à autêntica vocação e identidade popular do Corinthians.
Como relata o jornalista e pesquisador Irlan Simões, sobre as eleiçõs de Internacional e Boca Juniors em 2023:
“No dia 9 de dezembro, a contagem dos votos registrou a participação de 29.796 sócios do Internacional no pleito que reelegeu Alessandro Barcellos, superando em uns 735 votos a eleição de 2020 (o recorde anterior). A grande maioria desses votos se deu on-line, modelo adotado pelos colorados há alguns anos. Pouco depois, no dia 18 de dezembro, com votação presencial no gramado de La Bombonera, o número de votantes da eleição do Boca Juniors foi ainda maior. Superando a eleição anterior (2019) em mais de 5 mil votos, o pleito de 2023 mobilizou nada menos que 46.402 sócios xeneizes para a eleição do ídolo Juan Román Riquelme, que foi vice-presidente na gestão que se encerrou.”
Na última assembleia do Fenerbahçe da Turquia, em 2024, mais de 23 mil conselheiros encheram boa parte do estádio do time para votar um tema eminentemente político: se o clube sairia ou não da Liga Turca após uma
Voltando ao Corinthians, é necessário – e doloroso – constatar que o time do povo não conta com o povo para tomar nenhuma decisão. O time do povo só conta com o povo para pagar o quarto ingresso mais caro do Brasil – atrás apenas de Palmeiras, Flamengo e Grêmio – pagar mais caro ainda nas camisas, brindes e itens oficiais licenciados pelo clube. O time do povo agora pretende contar com o povo para pagar uma dívida contraída por meio de dinheiro público, corrupção, irresponsabilidade, piora nas condições de vida de milhares de pessoas, desrespeito e descaso com o longo prazo do clube. Tudo isso envolto em muito discurso de amor e de paixão pelo clube.
Eu tive a sorte de estar presente várias vezes no Morumbi dos anos 1990. Cheguei a dividir as arquibancadas com 75.000 torcedores e sentir o concreto das arquibancadas balançando. O público ali tinha pouco ou nada a ver com a predominância de rostos brancos distribuídos de maneira quase homogênea nas arquibancadas atuais. Não há dúvida que é a consequência visível do encarecimento dos ingressos. A Fiel presente nos jogos do Timão já não expressa a diversidade do povo.
O exemplo do Esporte Clube Bahia
Noutro sentido, o exemplo atual do Bahia é digno de aplaudir de pé e celebrar!
Ao adotar políticas de combate ao machismo e a homofobia, lutar contra a intolerância religiosa e promover o acesso das mulheres ao clube e às arquibancadas, o Esporte Clube Bahia já foi taxado de esquerdista e comunista. A adoção de uma mascote negra, homenagens a Marielle Franco e Moa do Katendê, criação do “Bolsa-Ídolo” que ampara ex-atletas do clube, Ronda Maria da Penha em torno do estádio para proteção das mulheres e outras ações semelhantes são fruto do Nucleo de Ações Afirmativas do clube. Mais que promover transformações sociais através do esporte, o Bahia presente se consolidar como o clube mais democrático e inclusivo do país.
Para os critérios normalmente pouco sensatos do universo futebolístico, o esforço do clube beira a insanidade e homenageia inclusive torcedores do arquirrival Vitória “para provar que a luta contra o racismo está acima de qualquer rivalidade”.
Outra iniciativa popular digna de nota é o Passaporte Social do Fortaleza. A ideia é simples e genial. Ao custo de R$ 60,00 torcedores de baixa renda teriam acesso aos últimos 5 jogos do Leão em casa pelo Brasileirão, contando com jogos importantes contra Palmeiras e São Paulo. Os critérios eram: a pessoa devia estar cadastrada no CadÚnico, ganhar até meio salário mínimo por pessoa e até três salários mínimos de renda mensal total. Fico imaginando se algo assim algum dia chegará perto das reuniões da diretoria do clube do povo paulista…
Existem inúmeras formas de se incluir um número maior de pessoas nos processos decisórios e especialmente levá-las de volta ao estádio. Obviamente a redução de preços é a primeira e mais eficiente medida para reaproximar efetivamente o torcedor do time. Já sobre a participação/mobilização poderia mesmo ser via sócio torcedor, sócio membro, diminuição significativa dos custos de associação, incentivo a associações regionais, processos digitais de participação, votação direta online e etc.
Poderia ser voto apenas consultivo, poderia ser sem voto para presidente mas um conselho deliberativo mais amplo como forma intermediária. Poderia-se organizar uma vaquinha que desse direito a participar dessas instâncias ao mesmo tempo que ajuda financeiramente o time. Poderia ser permanente: a contribuição mensal ajudaria o clube ao mesmo tempo que o torcedor ganha, como contrapartida (para além de um certificado destinado às redes sociais e nada mais) o direito a voz e voto no clube. Entretanto, qualquer dessas iniciativas de ampliação de mecanismos de participação direta dependem de mobilização e vontade política. É preciso de vontade que vá além de estampar e vender “do povo” seja para se eleger presidente de torcida organizada ou do clube.
Já existem movimentos reivindicando o voto aos “Sócios Torcedores”, que hoje não são mais que clientes dos clubes, como nesta faixa estendida no Maracanã por torcedores da Nação 12, flamenguista.
Inclusive temos precedentes: Grêmio e Internacional – mas não só eles – contam com estatutos onde os sócios torcedores têm direito a voto para presidente e conselheiros, podendo inclusive formar chapas e concorrer.
Caso a estratosférica dívida do clube siga crescendo, não tarda esse debate da implementação da SAF no Corinthians chegará. Especialmente porque a dívida segue galopante…
Qur alternativa então? Vaquinha? Ou mobilização pela real democratização do clube? Pela real aproximação que dê materialidade e concretize a consignia “Time do Povo” como algo para além de slogan para venda de camisetas, brindes com detalhes em dourado e ingressos em camarotes VIP.
A vaquinha e a “Liberdade Financeira”
Quitar o estádio está longe de ser a solução para os seríssimos problemas financeiros do Corinthians. Basta ver que nesta semana a diretoria assumiu uma dívida de mais de R$2 bilhões. O estádio não é sequer a metade da dívida total contraída ao longo de várias gestões, todas igualmente irresponsáveis e incompetentes. Pior, um dia após o início da vaquinha, a justiça penhorou cerca de R$20 milhões em contas do Corinthians por conta de descumprimento de acordo com a antiga patrocinadora do Timão, a casa de apostas Pixbet. Desse valor, 12 milhões estavam na Caixa Econômica Federal destinados ao pagamento da Arena.
O que pesa sobre a saúde financeira do clube são as gestões irresponsáveis e sem absolutamente nenhum controle dos torcedores que não se cansam de bradar serem parte do “time do povo”. As decisões financeiras não passam por qualquer escrutínio amplo, assim como as decisões sobre ampliar o endividamento, badaladas contratações astronômicas, parceirias de utilidade duvidosa, iniciativas de investimentos e etc. O que afunda as finanças do clube são tramóias contábeis que estampam manchetes do tipo: “Polícia instaura inquérito sobre suposto “laranja” em repasse de comissão no Corinthians” do Globo Esporte de junho de 2024.
Voltando à vaquinha atual, a romântica iniciativa pretende aliviar a situação financeira do clube. Notável é que nenhum organizador, seja do clube seja da torcida organizada, parece enxergar o peso que sairia dos ombros de quem efetivamente contraiu a dívida caso ela fosse quitada. Em nenhuma declaração os organizadores parecem perceber que a responsabilidade real por esta situação seria minimizada caso a vaquinha seja um sucesso. A mobilização diminuiria a pressão das obrigações tanto legais quanto com o clube, ainda que não seja seu objetivo. Não é o que pretendem, mas o fato objetivo e inegável é que quitar a dívida livraria gente da pior espécie das responsabilidades pelas quais certamente deveriam responder. Mas voltaremos a isso mais adiante.
Vale notar que as decisões financeiras não passam por qualquer escrutínio amplo, assim como as decisões sobre ampliar endividamento, badaladas contratações astronômicas, parceirias de utilidade duvidosa, iniciativas de investimentos e etc.
A última janela de contratações trouxe varios atletas pagos a peso de ouro que inclusive são a origem do bom momento atual do time que saiu da zona de rebaixamento para a primeira metade da tabela de classificação em meia dúzia de jogos. Portanto, o endividamento colossal não se mostra objetivamente como impedimento para que novas dívidas sejam contraídas pela diretoria irresponsável, tal qual todas que a precederam nas últimas décadas.
A construção da Arena: Copa do Mundo, corrupção, exclusão social e elitização
Falam sobre quitar a dívida, mas pouco se menciona a origem dela. Ora, o estádio foi construído no contexto das obras para a realização da Copa do Mundo de 2014. A realização deste evento aqui no Brasil é parte importantíssima do processo de avanço da mercantilização do futebol que se inicia nos anos 1970, se acelera com a expansão neoliberal dos anos 1990 e se acentua fortemente com os grandes eventos esportivos abrigados pelo Brasil nos anos 2010. Parte desse processo é a “arenização” dos estádios, antigo local de características profundamente populares e democráticas. O fenômeno se refere ao processo de transição desses estádios rumo às modernas arenas multiuso. É a transformação dos antigos espaços considerados de diversidade e expressão popular em ambientes planejados para gerar a maior rentabilidade possível, além de aumentar o conforto e a segurança e destinado a outro público, não mais os setores mais pobres da classe trabalhadora.
Segundo um dos maiores corruptos da história recente brasileira, Marcelo Odebrecht, o esquema para erguer o estádio em Itaquera foi acertado num jantar entre Gilberto Kassab, Lula, Andrés Sanchez e o ex-presidente do BNDES Luciano Coutinho, na casa de Marcelo.
Era um antigo desejo: jogar na própria casa. Solidificar o projeto de clube forte e imponente. Sonho que todos sabiam de dificílima realização.
Em 2009, o presidente do Corinthians Andrés Sanchez rompe definitivamente as negociações com o São Paulo e afirma que nunca mais o Morumbi receberia jogos do alvinegro. Todos jogos “em casa” seriam no Pacaembu dali em diante. O foco era ampliar o lucro com a venda de ingressos, ainda que diminuindo drasticamente a quantidade de torcedores presentes aos jogos: o público máximo ali era de cerca de 37.000 pessoas. Alguém teria de pagar por essa diferença. Justamente num momento de enorme incremento da popularidade e entusiasmo em torno do clube, pois Ronaldo, o Fenômeno, voltara ao Brasil e era contratado pelo Corinthians.
Eis que a Copa do Mundo de 2014 foi a oportunidade perfeita. Não para mobilizar os torcedores em torno do projeto e quem sabe até de uma campanha como a do Vasco da Gama e com uma vaquinha como essa atual. Mas sim um projeto onde dirigentes, políticos e capitalistas todos igualmente corruptos lucrassem muito e surfassem a popularidade em torno da realização do antigo sonho. Tudo “em nome do Corinthians”, é claro. Vale lembrar que o presidente do Corinthians de então, Andrés Sanchez era membro do PT já há muitos anos e, justamente em 2014, se elegeria deputado federal. Ele foi o principal articulador da obra e Lula apadrinhou a coisa toda.
O financiamento da obra recebeu cerca de R$400 milhões do BNDES, via Caixa. O recurso tinha sua origem legal no programa BNDES Pro Copas, do Governo Federal e destinado à estruturação do mega evento Copa do Mundo FIFA 2014. Além da injeção direta de recursos, a obra contou com isenção Municipal da ordem de R$420 milhões e mais isenção de ICMS (Estadual) sobre os equipamentos e materiais utilizados na construção da arena para reduzir o custo total da obra. Resumindo: uma montanha de dinheiro público injetada em um projeto privado cuja contrapartida de melhorias na região é altamente questionável.
A obra expõe como poucos exemplos a desgraça da elitização do futebol: erguido num bairro da periferia de São Paulo a obra pretendeu desde sua concepção e projeto afastar os moradores da periferia dos jogos. Gritante contradição para o “time do povo”.
Em reportagem da época da construção, uma moradora dos arredores do canteiro de obras há 20 anos disse: “Vão tirar a gente de um lugar onde tudo é perto. A escola das crianças, o hospital, o mercado, tudo. Para que? Construir uma avenida?”. Na ocasião, a área de ocupação contava com 377 domicílios, com mais de 300 crianças morando entre um total de pouco mais de mil pessoas.
Ainda segundo a reportagem: “De acordo com os moradores, o problema começou principalmente após a confirmação de Itaquera como palco da abertura da Copa do Mundo a ser realizada no Brasil. A partir daí, se iniciou a briga para retirar as comunidades do local para conclusão de obras de desenvolvimento urbano, como rodovias e áreas de lazer públicas.” Por fim, Drancy Silva, 53 anos, há vinte na comunidade: “O governo tem verba para o estádio do Corinthians, mas para nos ajudar não tem“, reclamou.
Desde o surgimento do projeto, durante toda a obra e mesmo anos após a entrega, o nome da Arena esteve constantemente nas manchetes de denúncias e processos sobre corrupção. As suspeitas são variadas: superfaturamento, pagamentos de propina, irregularidades financeiras e desvios de recursos públicos.
A Neo Química Arena construída no processo de aprofundamento da mercantilização do esporte e distanciamento de seu caráter popular pode até ser motivo de orgulho para os dirigentes do clube, mas deveria sê-lo também para seus torcedores? Para aqueles que somente veem o estádio pela janela do metrô ou do ônibus? Tão próximo e tão distante. Deveria ser para aqueles despejados ou cujos aluguéis dispararam por conta da contrução da Arena?
Dessa história de trabalhadores desalojados e prejudicados em suas vidas já tão sofridas, corrupção e troca de favores entre cartolas, políticos e burgueses é que querem agora nos convencer ser motivo de orgulho? É essa a “segunda casa” digna da tradição corintiana? Seria mesmo nossa sina comprovar o (mal) dito popular de que brasileiro tem memória curta? Pois é destinado a esse lodaçal que a vaquinha atual pede que o trabalhador corintiano coloque a mão no bolso: já não basta a exploração diária, agora querem que paguemos voluntariamente por este absurdo monumental.
Sobre o legado da Copa: perfil da ocupação da Neo Química Arena
Uma pesquisa divulgada em 03/10/2017 indicava claramente: a ocupação da Neo Quimica Arena não podia ser considerada exatamente popular. 3 anos após a inauguração, a Arena era frequentada majoritariamente por pessoas de nível superior e uma renda que dificilmente poderia ser classificada como baixa.
Nova pesquisa, divulgada em 2020 pelo Ibope revelava o seguinte: o alvinegro paulista conta com o maior número de torcedores com ensino superior, em números absolutos (5,2 milhões de pessoas) e também o clube com maior número de torcedores com renda superior a 5 salários mínimos (2,8 milhões de pessoas).
Um dado digno de se celebrar é que a maioria da torcida é corintianA: 47% da torcida é composta por homens e 53% por mulheres, sendo a maior participação feminina da Série A. Sem dúvida, a Arena trouxe a sensação positiva de progresso e mesmo fortalecimento do clube: “aquele sim é um estádio digno da grandeza do Todo Poderoso Timão” diriam alguns.Porém, aquele espírito de comunidade dos primeiros tempos do futebol de várzea, do clube fundado por operários do Bom Retiro e apoiado por torcedores que conheciam os jogadores e iam ao pequeno campo desfrutar de horas de lazer entre os seus, havia atingindo um ápice oposto: as Arenas padrão FIFA são a expressão máxima, em nosso tempo, do esporte transformado em espetáculo midiático, reservado a uns poucos que possam pagar. Do jogo popular repleto de valores comunitários e de identidade transformado em mercadoria. Do jogador transformado em pé de obra de exportação e do torcedor espremido de ponta cabeça para que cada moeda lhe saia dos bolsos: virou mero cliente. Recentemente, em entrevista no Roda Viva, foi exatamente assim que o presidente do São Paulo Futebol Clube se referiu a quem frequenta o Morumbi (hoje oficialmente denominado “Morumbis” por conta do chocolate BIS): clientes. É a mão terrivelmente visível do capital a tudo tocar e tudo corromper. Ou pior, como Alexandre Kalil, ex presidente do Atlético Mineiro e ex prefeito de Belo Horizonte, certa vez afirmou de forma incrivelmente sincera e escancarando a mudança de paradigma de nossos tempos sobre o espetáculo do futebol: “Pobre assiste na televisão, rico vai ao estádio”.
Afinal de contas, vaquinha pra quem?
Enfim, a que “identidade Corintiana” a vaquinha para pagar Arena se refere? Uma vaga identificação com os setores mais pobres da população? Não contente em esfolar o trabalhador no preço do ingresso e nos valores absurdos cobrados pelas camisas e demais itens oficiais, agora o clube quer literalmente meter a mão no bolso do trabalhador. Em video recente, o presidente do Corinthians Augusto Melo com a cara de pau típica dos cartolas. pede parte da PLR dos trabalhadores da Volkswagen. Objeto de investigação sobre corrupção, responsável por alimentar a tragédia social que a vertiginosa expansão das “bets” significam para nossa classe, a diretoria do Corinthians se aproveita da campanha da torcida organizada para pedir dinheiro que cubra irresponsabilidades e incompetências de sua gestão e de outras.
Não é difícil imaginar Andrés Sanchez, Lula, os senhores Odebrecht e tantos e tantos capitalistas que lucraram com a obra agora vendo a vaquinha enquanto riem e brindam suas bebidas caras: “Tomara que a corintianada pague a dívida toda, hein! Quem sabe assim esquecem de nós!”Que Arena é essa cujo acesso é tão difícil aos setores mais pobres do povo? Arena com camarotes custando R$4.000,00 e piscina privada! Arena recheada de mármore branco que mais parece um shopping center… e isso não é elogio, mas crítica! Esta Arena não honra a história nem a tradição e muito menos a comunidade corintiana.O projeto elitista, a obra corrupta, a ocupação elitista, branca e de classe média… nada disso diz respeito à a identidade Corinthiana que vem da origem operária do clube. Vem do crescimento profundamente popular da sua massa de torcedores durante a fila de 23 anos. Vem do tempo que a torcida mais cresceu e mostrou radicalmente Fiel, apesar da diretoria reacionária e dos times medíocres em campo.
Origem e tradição operária cuja torcida organizada que personifica nossa identidade surgiu durante a ditadura, e criou a única democracia verdadeira dentro do futebol e ainda é corretamente o mais identificado com o povo humilde de São Paulo.É essa a identidade Corinthiana.As importantes manifestações de rua em defesa da democracia, derrubando bloqueios pró-intervenção militar e contra o autoritarismo demonstram o grande potencial das torcidas organizadas e como poderiam se transformar em pauta pela democracia nos clubes também.
Se o espírito dos socialistas nos impulsiona a fomentar a participação dos trabalhadores nos processos decisórios da sociedade, alimentar essa participação no importante âmbito do futebol soa nada mais que natural e coerente. Democracia nas fábricas, locais de trabalho, nas ruas… e no futebol!Por fim, que arena é essa que sequer tem um nome digno da grandeza do clube. Pro quinto dos infernos os setores “Doril”, “Engov”, “Neosaldina” e “Epocler”!. Deveríamos pular, cantar e apoiar o Coringão nos setores ”IV Centenário”, “Fim da Fila 77”, “Invasão ao Maracanã 76”, “Mundial de 2000”, “Libertadores Invicta”, e ainda o setor “Democracia Corintiana”, obviamente o setor mais barato, popular e com a festa mais animada do estádio. Por fim, uma humilde sugestão do único nome coerente com a grandeza e a história do Corinthians: Estádio Doutor Sócrates Brasileiro.
“A Democracia Corinthiana foi a maior vitória que já tive no futebol. Não era só sobre ganhar ou perder, era sobre dignidade, respeito e justiça”
Sócrates