do Conselho Indigenista Missionário – CIMI

Em nota, CNDH se opõem à Mesa de Conciliação e propostas de lei que tentam negociar direitos indígenas

O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) publicou hoje (25) uma nota aprovada no dia 8 de abril, se opondo às propostas de mudança legislativa debatidas na Mesa de Conciliação do Supremo Tribunal Federal (STF).

A Mesa, que trata das ações que questionam a constitucionalidade da Lei 14.701, mais conhecida como Lei do Marco Temporal, foi criada em abril do ano passado, e é conduzida pelo ministro da Suprema Corte e relator das ações, Gilmar Mendes.

Mesmo sem a participação dos povos indígenas, o ministro tem mantido os debates na Mesa, que tenta aprovar uma proposta de lei que fragiliza os direitos indígenas. Em decisão dada hoje (25), Gilmar Mendes adiou pela terceira vez as discussões conciliatórias, que devem seguir até o dia 25 de junho.

“As propostas até então discutidas na mesa de negociação carregam vícios, riscos de potenciais prejuízos irreversíveis, a exemplo da mineração e cooperação com não indígenas para exploração econômica dos territórios; o processo administrativo de demarcação ganha novas fases, onerando a Funai e tornando o procedimento demarcatório ainda mais moroso do que já é”, afirma um trecho da nota.

Para o CNDH, “esta Mesa de Conciliação sequer deveria ter sido permitida e instalada no âmbito da Corte Suprema, pois não há que conciliar o inconciliável no que se refere aos direitos originários e inalienáveis dos povos indígenas”, considera.

O Conselho destaca ainda a importância de a Suprema Corte julgar os embargos de declaração do Tema 1031, que ainda carecem de definição sobre os pontos referentes a indenização a ocupantes não indígenas em terras originárias.

“Reclama-se, pois, o que é urgente: o imediato julgamento dos embargos de declaração no Tema 1031, pelo STF, sobre pontos como indenização a não indígenas impactados pela demarcação e o seu possível direito de retenção, no que se inclui, ainda que pasmemos, a possibilidade de indenização a invasores, grileiros e criminosos que se utilizam e se utilizaram das terras indígenas para os mais variados ilícitos, a exemplo dos crimes ambientais e degradação de territórios de ocupação tradicional. Ao mesmo tempo, não há previsão de indenização dos indígenas e povos que foram expulsos, espoliados e mortos no processo de esbulho territorial”, consideram.

Leia abaixo nota na íntegra:

NOTA CNDH Nº 25/2025

SOBRE AS PROPOSTAS LEGISLATIVAS APRESENTADAS NO ÂMBITO DA MESA DE NEGOCIAÇÃO DO STF SOBRE A LEI DO MARCO TEMPORAL

O Conselho Nacional de Direitos Humanos – CNDH, no uso das atribuições que lhe fora conferidas pelo art. 4º da Lei 12.986, de 02 de junho de 2014, na promoção e a defesa dos direitos humanos, ante acontecimentos e fatos recentes, manifesta sua inteira oposição às propostas de mudança legislativa, levadas à mesa de conciliação instaurada no âmbito das aç de controle de constitucionalidade da Lei 14.701/2023. A bem dizer, esta mesa de “conciliação sequer deveria ter sido permitida e instalada no âmbito da Corte Suprema, pois não há que conciliar o inconciliável no que se refere aos direitos originários e inalienáveis dos povos indígenas. O sentido único desse intento judiciário, que assim se diga e fique posto, é buscar meios e formas de tangenciar as cláusulas pétreas constitucionais insertas nos arts. 231 e 232 Constituição Federal, visando, assim, malbaratar os princípios – e direitos – garantes dos povo indígenas do Brasil.

Evidente, reafirma-se, a presunção de inconstitucionalidade da Lei 14.701/2023, promulgada a a declaração, pelo STF, da inviabilidade jurídica da tese do marco temporal no Tema 1031. Nã há como se ater a subterfúgios, como “negociações” de outros contorcionismos judiciais ou legislativos, ante o fixado no Tema apontado.

É intolerável que o Legislativo, o Executivo e o Judiciário sigam violando a norma supral (Convenção 169, OIT) quanto à consulta prévia, livre, informada e de boa – fé dos povos indígenas, como desnuda o quadro enfrentado nessa seara legal – judiciária. Esse deambular quanto à aplicação em concreto da norma convencional internalizada é inadmissível, afrontoso desrespeitoso aos povos originários.

Reclama-se, pois, o que é urgente: o imediato julgamento dos embargos de declaração Tema 1031, pelo STF, sobre pontos como indenização a não indígenas impactados pela demarcação e o seu possível direito de retenção, no que se inclui, ainda que pasmemos, a possibilidade de indenização a invasores, grileiros e criminosos que se utilizam e se utilizaram terras indígenas para os mais variados ilícitos, a exemplo dos crimes ambientais e degradação territórios de ocupação tradicional. Ao mesmo tempo, não há previsão de indenização dos indígenas e povos que foram expulsos, espoliados e mortos no processo de esbulho territorial.

As propostas até então discutidas na mesa de negociação carregam vícios, riscos de potenciais prejuízos irreversíveis, a exemplo da mineração e cooperação com não indígenas p exploração econômica dos territórios; o processo administrativo de demarcação ganha novas fases, onerando a FUNAI e tornando o procedimento demarcatório ainda mais moroso do que é; exigências extravagantes em relação aos antropólogos e os demais profissionais que comp os GTs (Grupos de Trabalho), responsáveis pelos RCID (Relatórios Circunstanciados de Identificação e Delimitação). É o desalinho do Direito Convencional e Constitucional garantista dos indígenas, a gosto do latifúndio, da mineração, do agronegócio e suas teias nacionais e internacionais.

Deve-se respeitar os limites postos no julgamento do Tema 1031: a Corte permitiu, ainda que parte da temática esteja sob o crivo do julgamento dos embargos de declaração, a indenização por evento danoso a particulares, quando da titulação de áreas indígenas, e validando apenas o ato jurídico perfeito e a coisa julgada quando o título ou a posse decorrere de comprovada boa-fé, mas nunca a indenização pela terra nua, o que é expressamente veda pelo 6§, do art. 231.

O Brasil vive hoje um acirramento dos conflitos envolvendo povos indígenas e decorrent aumento de violações de direitos humanos. A mesa de negociações impostas pelo STF vem colaborando negativamente para este cenário, de modo que não há outra alternativa a não ser recomendar sua dissolução, e que nenhuma proposta advinda desse cenário de violações seja aprovada ou homologada pelo Pleno da Corte.

O que urge, fundamental, social e humanisticamente necessário, é a retomada e continuidade dos processos demarcatórios, com toda a garantia e proteção aos povos indígen Há vidas em jogo, várias delas perdidas nos últimos anos e meses na esteira de devaneios e contorcionismos que, assim o sabemos, postergam e burlam os inalienáveis direitos dos povos indígenas.

Omissões e ações fugidias não se coadunam com o verdadeiro Estado Democrático de Direito, no que diz aos povos originários. O Conselho Nacional dos Direitos Humanos é peremptório na afirmação do mais estrito cumprimento daquilo que de fato serve à causa indígena.

Brasília, 8 de abril de 2025

CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS

Leia também:

Acompanhe as últimas notícias:


Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 26/04/2025