O governo chinês solicitou ao Chile a retomada da construção de um observatório astronômico no norte do país, interrompida no início deste ano, e criticou os Estados Unidos por tentativas de barrar o projeto. A declaração foi feita pelo embaixador da China no Chile, Niu Qingbao, durante encontro com jornalistas nesta terça-feira (30).
De acordo com Niu, as autoridades chinesas estão em diálogo com o Ministério das Relações Exteriores do Chile para dar continuidade ao empreendimento. Segundo o diplomata, a paralisação estaria relacionada a objeções levantadas por autoridades norte-americanas.
“Os EUA têm difamado consistentemente este projeto, interferido no direito soberano do Chile de escolher seus parceiros de forma independente e obstruído o projeto de todas as maneiras possíveis”, afirmou Niu. “Esperamos que o lado chileno possa eliminar a interferência americana e aprovar o projeto o mais rápido possível.”
A disputa sobre o observatório ocorre em meio ao esforço do governo do presidente Gabriel Boric para equilibrar as relações com China e Estados Unidos. O tema se insere em um contexto mais amplo de pressão geopolítica sobre países latino-americanos diante da competição estratégica entre as duas maiores economias do mundo.
Autoridades dos Estados Unidos levantaram preocupações em relação ao observatório ainda durante o governo de Joe Biden.
Segundo reportagem da revista Newsweek, os norte-americanos receiam que a instalação possa ser utilizada para rastrear satélites e integrar capacidades do programa espacial militar chinês.
Em janeiro deste ano, o ministro das Relações Exteriores do Chile, Alberto van Klaveren, reconheceu em entrevista à CNN que os Estados Unidos “estão preocupados” com o projeto, mas não detalhou o conteúdo das preocupações.
Brandon Judd, indicado por Donald Trump para o posto de embaixador no Chile, defendeu publicamente que os Estados Unidos atuem para conter a influência chinesa na região e dificultar o acesso da China a recursos chilenos. Judd afirmou que o projeto pode ampliar a presença estratégica de Pequim no hemisfério sul.
O observatório em questão está localizado no deserto do norte do Chile, área reconhecida por suas condições favoráveis à observação astronômica, como céu limpo e baixa poluição luminosa. Atualmente, cerca de 70% da capacidade global de observação espacial está concentrada no território chileno.
A China já concluiu a construção da estrada de acesso ao local em janeiro, e parte dos equipamentos necessários para o funcionamento do observatório já se encontra no país, de acordo com o embaixador Niu.
O projeto foi formalizado em 2016, por meio de um acordo entre a Universidade Católica do Norte e um centro astronômico chinês, durante visita oficial do presidente Xi Jinping ao Chile. Na ocasião, Xi participou de reuniões com a então presidente Michelle Bachelet.
Apesar do acordo firmado entre a instituição chilena e o observatório chinês, o governo de Santiago indicou que a iniciativa necessita de autorização estatal ou de intermediação da Universidade do Chile, que detém prerrogativas legais para projetos dessa natureza.
A posição do governo é que apenas a Universidade do Chile pode representar o Estado em acordos internacionais na área científica.
O embaixador Niu, por sua vez, contesta essa interpretação. Segundo ele, exigências formais adicionais só se aplicariam em casos nos quais o investidor busca benefícios específicos, como isenção de impostos para importação de equipamentos. Ele argumenta que o projeto em questão não pleiteia tais concessões e, portanto, não deveria estar sujeito a uma nova negociação.
A disputa em torno da aprovação do observatório reflete os desafios enfrentados pelo Chile em seu posicionamento geopolítico.
A China representa aproximadamente 40% das exportações chilenas, enquanto os Estados Unidos respondem por cerca de 15%. Apesar dessa diferença na pauta comercial, os investimentos chineses no país ainda são inferiores aos realizados por Pequim em outras nações da América Latina.
A instalação também reacendeu o debate sobre a finalidade dos projetos científicos estrangeiros em território chileno. Niu declarou que acusações de finalidade militar devem ser aplicadas com o mesmo critério a projetos financiados por Washington.
“Se os EUA insistem em culpar o projeto por propósitos militares, podemos nos perguntar se o projeto de astronomia dos EUA no Chile tem propósitos militares”, afirmou, fazendo referência ao Observatório Vera Rubin, financiado por agências norte-americanas.
Até o momento, o governo chileno não emitiu novo posicionamento oficial sobre a continuidade do projeto. O Ministério das Relações Exteriores informou que o tema segue em análise. Não há previsão anunciada para uma decisão final. A cúpula diplomática chinesa, por sua vez, mantém a expectativa de que o Chile autorize a retomada das obras nas próximas semanas.
Com informações da Bloomberg