Pequim criticou nesta sexta-feira 23 a “politização” da educação após a decisão do governo americano de retirar da Universidade de Harvard o direito de matricular estudantes estrangeiros, muitos deles chineses.
“A China sempre se opôs à politização da cooperação educacional”, disse Mao Ning, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, em entrevista coletiva. “A atitude dos Estados Unidos apenas prejudicará sua imagem e sua reputação internacional.”
Na quinta-feira 22, o governo de Donald Trump proibiu Harvard de receber estudantes estrangeiros. A medida retira da instituição um importante instrumento de influência global e é vista como mais um passo na ofensiva do governo Trump contra o ensino superior.
Segundo o site da universidade, considerada uma das melhores do mundo, Harvard recebe cerca de 6.700 estudantes internacionais — 27% do total — e já formou 162 ganhadores do Prêmio Nobel.
Perda financeira
“A certificação do programa Sevis (Student and Exchange Visitor) da Universidade de Harvard foi revogada com efeito imediato”, escreveu a secretária de Segurança Interna dos Estados Unidos, Kristi Noem, em carta enviada à instituição.
Com a revogação, a Harvard está proibida de receber estudantes com vistos F ou J no ano letivo de 2025-2026. Esses vistos são usados principalmente por estudantes e acadêmicos estrangeiros.
A medida representa uma perda potencial significativa para a universidade, tanto financeira quanto em prestígio internacional.
“Essa decisão é a mais recente de uma série de medidas de retaliação e autoritarismo flagrante contra a mais antiga instituição de ensino superior dos Estados Unidos”, afirmou a Associação Americana de Professores Universitários (AAUP). “O governo Trump tenta destruir ilegalmente o ensino superior no país.”
Ultimato
Segundo Noem, os estudantes estrangeiros já matriculados devem pedir transferência para outras instituições. Foi o que fez o universitário austríaco Karl Molden, 21 anos, que se transferiu para a Universidade de Oxford, no Reino Unido. “Entrar em Harvard foi o maior privilégio da minha vida”, disse. “Mas os Estados Unidos estão se tornando cada vez menos atraentes para o ensino superior.”
Kristi Noem impôs ainda um ultimato: se quiser reverter a decisão, Harvard deve fornecer, em até 72 horas, informações sobre supostas atividades ilegais de seus estudantes estrangeiros nos últimos cinco anos.
“A decisão do governo é ilegal”, respondeu um porta-voz da universidade. “Estamos totalmente comprometidos em manter a capacidade de Harvard de receber estudantes e acadêmicos internacionais, que vêm de mais de 140 países e enriquecem a universidade e o país.”
Harvard já havia processado o governo semanas antes, após a suspensão de auxílios federais.
Ofensiva contra universidades
O governo Trump tem acusado instituições como Harvard e Columbia de tolerarem o antissemitismo e de não protegerem estudantes judeus em protestos contra a guerra de Israel em Gaza.
Republicanos criticam as universidades por promoverem ideias progressistas. Já entidades de defesa das liberdades civis veem nas ações uma tentativa de censurar críticas à política israelense.
Na carta divulgada, Noem acusa Harvard de se recusar a colaborar com o governo, manter um ambiente hostil a estudantes judeus e adotar políticas de diversidade, igualdade e inclusão, consideradas “racistas” pela administração Trump.
Defensores dessas políticas argumentam que elas buscam corrigir desigualdades históricas na sociedade americana.
O governo já havia cortado mais de 2 bilhões de dólares em subsídios à universidade, afetando programas de pesquisa. Harvard respondeu com ações judiciais, apoiadas por estudantes e professores.
“Estamos trabalhando para orientar e apoiar nossa comunidade. Essa retaliação ameaça gravemente Harvard e compromete sua missão acadêmica e científica”, disse o porta-voz da instituição.
Para a estudante Alice Goyer, a notícia gerou incerteza entre os colegas estrangeiros. “Todos estão um pouco em pânico”, disse, esperando uma “batalha judicial” contra a decisão.
Na quinta-feira, um juiz federal ordenou a suspensão de qualquer revogação da situação legal dos estudantes internacionais. Ainda não está claro, entretanto, se essa decisão pode ter consequências para os estudantes Harvard.