O Ministério da Defesa Nacional da China elevou o tom contra a recente venda de armas dos Estados Unidos a Taiwan, avaliada em US$ 330 milhões. Em declaração na segunda-feira (17), repercutida pela agência Xinhua e pelo Diário do Povo, Pequim classificou a operação como interferência direta em assuntos internos e afronta à soberania nacional.
Mesmo após reconhecer Pequim como único representante da China em 1979, Washington mantém-se como principal fornecedor de armas de Taiwan, contrariando compromissos assumidos e ampliando tensões em meio a disputas comerciais e estratégicas. Para Pequim, o uso de Taiwan para conter a China empurra a região por um caminho “errado e perigoso”.
O governo Trump também anunciou nesta quarta-feira (17) a venda de US$ 11,1 bilhões em armas para Taiwan, o maior pacote de armamentos dos EUA já destinado à ilha. A proposta de venda de armas abrange oito itens, incluindo sistemas de foguetes HIMARS, obuses, mísseis antitanque Javelin, drones de munição de ataque Altius e peças para outros equipamentos, afirmou o Ministério da Defesa de Taiwan em um comunicado. O pacote precisa ser aprovado pelo Congresso dos EUA, onde Taiwan conta com amplo apoio bipartidário.
Impulsionada pelos Estados Unidos, Taiwan tem trabalhado para transformar suas forças armadas, de modo a serem capazes de travar uma “guerra assimétrica”, utilizando armas móveis, menores e geralmente mais baratas, mas ainda assim eficazes em ataques direcionados, como drones.
O presidente de Taiwan, Lai Ching-te, anunciou no mês passado um orçamento suplementar de defesa de US$ 40 bilhões , que vigorará de 2026 a 2033, afirmando que “não há espaço para concessões em matéria de segurança nacional”.
Uma Só China: Protestos solenes e alerta de consequências
Zhang informou que a China apresentou “protestos solenes” a Washington e advertiu que qualquer estratégia de apoio militar a movimentos separatistas terá consequências negativas. “Instamos o lado americano a parar imediatamente suas ações erradas de armar Taiwan”, declarou.
Ao responder à imprensa, o porta-voz Zhang Xiaogang afirmou que a transação “viola gravemente o princípio de Uma Só China e os três comunicados conjuntos China-EUA”, além de prejudicar a soberania e os interesses de segurança do país. Segundo ele, a iniciativa envia “um sinal gravemente errado” às forças que defendem a chamada “independência de Taiwan”.
O Ministério das Relações Exteriores reiterou a condenação. A porta-voz Mao Ning afirmou que as vendas de armas violam flagrantemente os comunicados conjuntos, especialmente o de 17 de Agosto, minam a paz e a estabilidade no Estreito de Taiwan e encorajam forças separatistas. Pequim, disse ela, está “fortemente insatisfeita” e “firmemente oposta”, e agirá para defender sua soberania.
Sanções a empresas dos EUA
Em resposta às recorrentes vendas, a China anunciou sanções a empresas do complexo militar-industrial dos EUA, como Lockheed Martin e Raytheon, por fornecimentos anteriores a Taiwan. Para o porta-voz Wang Wenbin, a medida busca salvaguardar a soberania chinesa e conter provocações que ampliam riscos regionais.
O Estreito de Taiwan é vital para rotas comerciais internacionais e produção de semicondutores, setor no qual Taiwan é estratégica. Qualquer aumento de tensão gera volatilidade nos mercados, eleva custos logísticos e de seguros e cria incertezas para investimentos de longo prazo.
As vendas de armas beneficiam grandes empresas de defesa norte-americanas e transformam a tensão geopolítica em negócio recorrente. Para a China, isso confirma a leitura de que os EUA utilizam conflitos regionais como instrumento econômico e estratégico.
As sanções chinesas contra empresas dos EUA indicam risco crescente para companhias ocidentais que atuam em áreas sensíveis; tendência à fragmentação do comércio internacional, com blocos econômicos mais fechados. Isso acelera a chamada “desglobalização seletiva”, com cadeias produtivas reorganizadas por critérios políticos.
Taiwan não é a Ucrânia
A diplomacia chinesa também rechaçou comparações com o conflito no Leste Europeu. Hua Chunying foi taxativa: “Taiwan não é a Ucrânia; sempre foi parte inalienável da China, um fato histórico e legal indiscutível”. O presidente Xi Jinping já advertiu que apoiar a independência de Taipei é “brincar com fogo”.
A reação chinesa, somada ao apoio explícito da Rússia à posição de Pequim, acelera a formação de um bloco sino-russo mais coeso e o distanciamento estrutural entre China e EUA, que deixa de ser apenas econômico e passa a ser abertamente estratégico-militar. Isso empurra o sistema internacional para uma lógica de bipolarização, com países pressionados a se alinhar.
Países da Ásia, Europa e América Latina passam a enfrentar pressões contraditórias para apoiar a posição dos EUA ou da China; e riscos de desgaste diplomático ao manter relações equilibradas com ambos. A disputa reduz o espaço de neutralidade e aumenta o custo diplomático do “não alinhamento”.
Após cúpula entre Xi Jinping e Vladimir Putin, China e Rússia publicaram nota conjunta criticando a postura dos EUA e reafirmando que Taiwan é parte inalienável da China. A mensagem é clara: estabilidade regional exige respeito ao princípio de Uma Só China e o fim imediato das vendas de armas e contatos militares com a ilha.
Por outro lado, Taiwan passa a ser peça central da disputa EUA–China. A ilha passa a ser um instrumento de contenção da China por parte de Washington e um símbolo de soberania e integridade territorial para Pequim. Quanto mais Taiwan é armada, mais a questão deixa de ser regional e passa a ter impacto global.