Em pronunciamento durante a reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU neste domingo (22), a China condenou com veemência os ataques realizados pelos Estados Unidos contra instalações nucleares iranianas. Segundo o embaixador chinês junto à ONU, Fu Cong, os bombardeios — realizados na madrugada de sábado para domingo pelas forças norte-americanas — violam a soberania do Irã, afrontam a Carta das Nações Unidas e põem em risco o regime global de não proliferação nuclear.
“Os atos cometidos pelos Estados Unidos violam claramente os princípios do direito internacional, assim como a soberania, a segurança e a integridade territorial do Irã”, declarou Fu Cong. “Esses ataques exacerbam ainda mais as tensões no Oriente Médio e constituem um duro golpe ao regime internacional de não proliferação nuclear.”
A ação dos EUA mirou três centrais nucleares — Fordow, Natanz e Esfahan —, todas sob salvaguardas da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). Não havia provas de que o país estivesse desenvolvendo armas nucleares.
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Cessar-fogo e diálogo: a saída defendida por Pequim
A posição da China não se limitou à condenação dos ataques. O embaixador Fu Cong apelou para um cessar-fogo imediato e incondicional por parte de todos os envolvidos, em especial Israel. “As partes envolvidas deveriam acatar o direito internacional e frear o uso da força. A paz no Oriente Médio não pode ser alcançada com bombas, mas sim com diálogo e negociação”, afirmou.
Fu lembrou que o Irã vinha negociando com os Estados Unidos termos para garantir seu compromisso com o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP), do qual é signatário. “Os meios diplomáticos ainda não foram esgotados. Há esperança de se conseguir uma solução pacífica”, declarou, exortando o Conselho de Segurança da ONU a agir com responsabilidade diante da escalada.
A China, junto com Rússia e Paquistão, propôs um projeto de resolução exigindo cessar-fogo, proteção a civis e respeito ao direito internacional.
Rússia: Trump trocou o discurso de paz por guerra
A Rússia também condenou duramente os ataques dos EUA. Dmitri Medvedev, vice-presidente do Conselho de Segurança russo, atacou o presidente Donald Trump, responsabilizando-o diretamente pela escalada. “Trump, que entrou como um presidente pacificador, iniciou uma nova guerra para os EUA”, disse, ironizando: “Com esse tipo de sucesso, Trump não ganhará o Prêmio Nobel da Paz.”
O governo russo reafirmou apoio a Teerã e defendeu uma solução diplomática multilateral, ecoando a proposta chinesa de contenção e respeito ao TNP.
Reação global: condenações da América do Sul à Ásia
A ofensiva militar norte-americana provocou reações em diversas partes do mundo. O Brasil, por meio do Itamaraty, afirmou que o bombardeio de usinas nucleares é “uma grave violação do direito internacional” e alertou para o risco de “contaminação radioativa e desastres ambientais de grande escala”. Reiterou também a defesa histórica do país pelo uso pacífico da energia nuclear.
O Chile foi incisivo. O presidente Gabriel Boric declarou: “Atacar usinas nucleares é proibido pelo direito internacional. Mesmo que você seja os Estados Unidos.” Cuba e Venezuela também emitiram notas de repúdio, acusando os EUA de violações à Carta da ONU.
Na Ásia, a Índia expressou “profunda preocupação” com a escalada regional. Os Emirados Árabes e o Catar alertaram para as “repercussões catastróficas” da intensificação do conflito.
Contradições no Ocidente: entre contenção e apoio
Na Europa, a reação foi dividida. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, defendeu a estabilidade regional e o respeito ao direito internacional, pedindo que o Irã “retorne à mesa de negociações”. Já o primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, apoiou a ação dos EUA, alegando que o programa nuclear iraniano é “uma grave ameaça à segurança internacional”.
A França, por sua vez, reiterou que qualquer solução deve ocorrer no marco do TNP e apelou à diplomacia. A posição dos países ocidentais, no entanto, contrasta com o histórico silêncio sobre o arsenal nuclear israelense — estimado em cerca de 90 ogivas atômicas, não declarado oficialmente.
A ONU diante da crise: Guterres alerta para risco de catástrofe
O secretário-geral da ONU, António Guterres, fez um apelo veemente pela contenção. “Esta é uma escalada perigosa em uma região já à beira do abismo — uma ameaça direta à paz e à segurança internacional. Há um risco crescente de que este conflito saia rapidamente do controle, com consequências catastróficas”, advertiu.
Apesar da gravidade, o Conselho de Segurança segue dividido, sem consenso para aprovar uma resolução, dada a oposição dos Estados Unidos a qualquer condenação formal.
O mundo diante da linha vermelha nuclear
Com ataques a instalações nucleares, a guerra no Oriente Médio cruza uma nova fronteira — potencialmente devastadora. A China alerta para o desmonte do regime de não proliferação e para o risco de normalização da força como instrumento de política internacional. Enquanto a diplomacia tenta agir, o mundo assiste à perigosa erosão das regras multilaterais em pleno século XXI.