Quase toda a esquerda brasileira capitulou diante da investida do imperialismo contra a Venezuela. A antiga defesa do país oprimido contra o colosso norte-americano ou foi completamente abandonada, com alguns atacando diretamente Maduro, ou foi colocada em suspenso, com outros se recusando a defender o governo atacado. É uma falência gigantesca da esquerda. Uma das organizações da esquerda que está nessa política é o PCB, que publicou uma nota oficial em seu portal sobre a situação.
O texto afirma que: “o governo Maduro, que opera na lógica do capitalismo, vem perseguindo setores do sindicalismo classista, retirando direitos, congelando os salários e fazendo concessões ao liberalismo econômico, como a dolarização para estabelecer o controle inflacionário, parcerias público-privadas na área petrolífera com a Chevron, privatizações nos setores de telecomunicações, dentre outras medidas. O governo do PSUV se comporta de forma a impedir o avanço da organização popular e restringe a participação das forças revolucionárias, a exemplo da perseguição política ao histórico Partido Comunista (PCV) e às forças políticas integrantes da Alternativa Popular Revolucionária (APR), com a intervenção judicial e o sequestro da legenda do PCV nas recentes eleições no país. Trata-se de um comportamento autocrático que impede a livre participação política daqueles que defendem o avanço do processo de mudanças na Venezuela”.
O ponto principal aqui é que, diante de uma investida do imperialismo contra o país, o PCB faz questão de tecer muitas críticas ao governo. Neste momento, não deve haver nenhuma consideração nesse sentido. O imperialismo ataca o governo do Irã, é preciso defender incondicionalmente qualquer governo de país atrasado, não importa quais são os seus defeitos.
Mas entrando no mérito das críticas em si, mais uma vez o PCB erra. Ele ataca o PSUV por ser neoliberal, uma crítica um tanto absurda, pois é o governo menos neoliberal da América do Sul e o governo com mais apoio popular de todos. O que leva à segunda crítica, que é uma farsa, que supostamente o governo Maduro restringe o avanço da organização popular. A Venezuela é, de longe, o país com a maior mobilização popular no continente. O governo está constantemente mobilizando os trabalhadores. Isso para os que querem ampliar a organização é muito positivo, pois gera um clima de luta política.
Organizações que não são o PSUV podem crescer muito nessas condições. Ele cita o caso do PCV, que está participando do golpe de Estado contra Maduro, assim como fez o PSTU e o próprio PCB contra Dilma. Isso abriu margem para um embate político do governo com o partido. Mas caso haja uma organização revolucionária de fato que luta contra o imperialismo, ainda mais que Maduro nas condições atuais, ela tenderia a crescer muito. Caso ela existisse e Maduro estivesse a reprimindo, isso permitiria a única crítica possível ao governo, que ele estaria desmobilizando o povo, ou seja, facilitando o golpe. Mas nada perto disso acontece. As organizações reais de luta estão apoiando Maduro contra o imperialismo.
O texto segue citando quem é a oposição: “por outro lado, nos últimos dias, em virtude das eleições, o golpismo da extrema-direita, representado por Edmundo González (miliciano que ajudou a matar milhares de insurgentes em El Salvador nos anos 1980), juntamente com a líder neofascista Maria Corina, a serviço do imperialismo dos EUA, têm agido no sentido de fomentar uma total desestabilização do país na perspectiva de uma guerra civil”.
Com essa descrição fica ainda mais bizarro o fato do PCB não se posicionar totalmente a favor de Maduro. Imagine se em 1964, diante da campanha dos generais contra Jango, o PCB falasse: “Jango é um latifundiário direitista que não defende de fato os trabalhadores”. Seria absurdo, e é exatamente isso que acontece na Venezuela. Qual era a posição correta em 1964? Lançar uma enorme campanha “abaixo o golpe militar!”.
Logo depois, o PCB abaixa ainda mais o nível e considera Maduro um ditador: “entendemos que a Venezuela se encontra em um momento político bastante complexo, realçado pelos equívocos políticos oriundos da postura autocrática de Maduro contra a esquerda socialista e classista, bem como as concessões ao capital na política econômica. Prestamos aqui total solidariedade aos que lutam pela perspectiva socialista, em especial ao PCV e à APR”.
Ao desconsiderar que a suposta repressão de Maduro foi contra um setor da esquerda golpista, eles então reforçam a campanha feita pela direita imperialista de que ele é um ditador. Nesse caso, seria até um ditador de direita reprimindo a esquerda “socialista e classista”. O PCB nem entra no mérito de explicar os motivos do porquê houve essa suposta repressão. E presta solidariedade ao PCV, que apoia o golpe, ao invés de prestar solidariedade a Maduro, que está sofrendo o golpe. É mais uma demonstração da sua posição absurda.
E assim o texto fecha com sua posição centrista: “portanto, exigimos respeito à soberania da Venezuela e às decisões da Comissão Nacional Eleitoral (CNE). Ao mesmo tempo, apoiamos o esforço das organizações efetivamente revolucionárias da Venezuela, que lutam para construir uma alternativa popular e fazer avançar o processo de mudanças”.
A declaração política final não é abertamente golpista, mas também não se coloca contra o golpe. Pedir respeito às decisões da CNE é, no mínimo, fica na defensiva diante da campanha “libere as atas”. Principalmente sendo um partido que se considera marxista, o correto seria declarar apoio total a Maduro contra o golpe de Estado.
Nas palavras de ordem isso não é expresso: “viva a soberania da Venezuela! Respeito à autodeterminação do povo venezuelano! Abaixo o imperialismo! Pelo fortalecimento da luta pelo socialismo! Toda solidariedade ao PCV!”.
Por que falar tudo de forma abstrata com exceção do apoio ao PCV? Nesse sentido, a única posição concreta do PCB é que eles apoiam a esquerda golpista venezuelana. O apoio a Maduro, o mais importante nesse momento, é completamente ignorado. E na luta do gigante imperialista contra um pequeno país oprimido, quem não está ao lado deste, está ao lado o imperialismo.