O Partido Liberal venceu as eleições federais realizadas nesta segunda-feira (28) no Canadá. Com o resultado, Mark Carney permanece como primeiro-ministro, mesmo diante do forte desgaste do governo e da impopularidade recorde herdada de seu antecessor, Justin Trudeau, que renunciou em janeiro.
Carney, que havia assumido o cargo de forma interina após a saída de Trudeau, liderou a campanha dos liberais aproveitando a histeria em relação às declarações de Donald Trump. Durante a votação, os liberais ultrapassaram os conservadores em número de assentos, embora ainda não esteja claro se conseguirão formar um governo majoritário. A apuração dos votos continua.
A eleição canadense é realizada por distritos. O sistema permite que partidos com menor percentual de votos totais conquistem mais cadeiras no Parlamento, dependendo da distribuição geográfica dos votos. A Câmara dos Comuns tem 343 assentos, e são necessários 172 para garantir maioria absoluta.
Partido Conservador liderava pesquisas com ampla vantagem
A vitória dos liberais ocorre após uma reversão inexplicável nas pesquisas. Em janeiro, o Partido Conservador, liderado por Pierre Poilievre, aparecia com mais de 20 pontos percentuais de vantagem sobre os liberais. À época, o governo de Trudeau acumulava altos índices de rejeição devido à inflação, ao aumento do custo de vida e à crise habitacional.
Após a renúncia de Trudeau, em 6 de janeiro, Mark Carney foi apontado como novo líder do partido e primeiro-ministro interino. A mudança ocorreu a menos de quatro meses do pleito. No período entre sua posse e a eleição, a diferença entre os partidos se inverteu. Os liberais chegaram a 42,8% das intenções de voto, enquanto os conservadores caíram para 39,2%, segundo agregados de pesquisa divulgados até a véspera da votação.
A queda brusca na vantagem conservadora não foi acompanhada de uma explicação consistente por parte dos institutos de pesquisa ou da imprensa canadense. Mesmo com um histórico de eleições majoritárias e sem registro de mobilizações populares relevantes em apoio aos liberais, o partido conseguiu reverter uma desvantagem de mais de 20 pontos em menos de quatro meses.
Carney foi presidente dos bancos centrais do Canadá e do Reino Unido
Mark Carney tem 60 anos e foi presidente do Banco do Canadá e, posteriormente, do Banco da Inglaterra, sendo o primeiro estrangeiro a ocupar o cargo. É a primeira vez que disputa uma eleição.
Durante a campanha, os liberais concentraram seus esforços em discursos voltados à política externa, após declarações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sugerindo a imposição de tarifas econômicas ao Canadá e até a anexação do país como um “51º Estado norte-americano”.
Carney adotou o tema como eixo central de sua campanha, acusando Trump de querer “destruir o Canadá” e afirmando que seu governo seria o mais preparado para lidar com o cenário externo. No discurso de vitória, disse que o sistema de comércio conjunto com os EUA “acabou” e prometeu redefinir as relações com o país vizinho.
Pouco tempo depois de Carney ter declarado sua vitória, o The Economist, um dos principais órgãos de imprensa do imperialismo, saudou o resultado eleitoral canadense. O periódico inglês publicou artigo intitulado Mark Carney leva os liberais do Canadá a uma vitória notável:
“O primeiro-ministro canadense Mark Carney conquistou uma sólida vitória que estende o controle de uma década de seu partido liberal para um raro quarto mandato consecutivo. Esse resultado foi impensável há apenas alguns meses. A vitória dá ao ex-banqueiro central um mandato para enfrentar um Donald Trump truculento”, disse o The Economist.
Conservadores perdem liderança e Poilievre fica fora do Parlamento
A queda dos conservadores nas pesquisas resultou não apenas na derrota nacional, mas também na perda do assento parlamentar de Pierre Poilievre. O líder conservador ficou sem vaga na Câmara dos Comuns após perder a disputa em seu próprio distrito, Carleton (Ontário), para o liberal Bruce Fanjoy.
Durante a campanha, Poilievre havia centrado seus discursos na crise do custo de vida, no desemprego e na política habitacional do governo liberal. Com a mudança repentina do cenário, tentou se desvincular de Trump, chegando a pedir publicamente que o presidente norte-americano “não interferisse na eleição canadense”.
Resultado ainda depende da composição final do Parlamento
Até o momento, não há confirmação se o Partido Liberal terá maioria na Câmara dos Comuns. O resultado final definirá se Carney poderá formar um governo estável ou se precisará negociar apoio com outros partidos. O sistema parlamentarista canadense permite a formação de governos minoritários, como ocorreu com Justin Trudeau em duas das três eleições que venceu.
A depender do número final de assentos conquistados, o governo poderá ser derrubado por voto de desconfiança ou por derrotas em projetos orçamentários. O Partido Liberal venceu as quatro últimas eleições federais, mas enfrentou crescente rejeição nos últimos anos. Trudeau deixou o cargo com altos índices de impopularidade, e sua renúncia foi vista como tentativa de evitar uma derrota eleitoral mais ampla.
Expressão da decadência do regime
Na última edição do programa Análise da 3ª, transmitido pela Rádio Causa Operária, Rui Costa Pimenta, presidente nacional do Partido da Causa Operária (PCO), comentou sobre o resultado das eleições no Canadá. Ele afirmou que a vitória do candidato dos banqueiros é mais uma prova da crise nos países imperialistas, que abandonam qualquer fachada democrática:
“O partido do Trudeau é identificado com o Partido Democrata, Partido Trabalhista, Partido Conservador, Macron, CDU, etc. É o partido do imperialismo propriamente dito. Essas manobras eleitorais — não sabemos exatamente o que aconteceu — revelam a crescente erosão do regime político dito democrático em todos os países do mundo, particularmente nos países imperialistas.
É parecido com o que aconteceu na Alemanha, com a diferença de que, no Canadá, os conservadores — que se identificam mais com o trumpismo — tinham a possibilidade de ganhar a eleição. Na Alemanha, a AfD não tinha essa possibilidade.
O voto distrital é altamente manipulável. Democracia é uma espécie de nome fantasia para o domínio dos especuladores, capitalistas, mercado financeiro: os donos do mundo. É correta a avaliação de erosão da democracia, porque o que existe de democracia — se é que podemos chamar assim o que existe nesses países — está em uma situação terminal. Não tem salvação.
E não é de agora, a crise já tem muito tempo.”