Não foi a fase mais criativa de Caetano Veloso, mas o período entre o fim do Tropicalismo e o seu retorno ao Brasil, após um ano e meio exilado em Londres, ainda desperta muita curiosidade em pesquisadores, pelo modo como o baiano lidou com aquele momento difícil.
Aquele tempo pareceu para o cantor e compositor uma eternidade e influenciou sua produção. O livro “It’s a Long Way – O Exílio em Caetano Veloso” (Garota FM Books, 224 páginas), de Márcia Fráguas, analisa os três álbuns produzidos entre 1969 e 1972, um deles apresentado pouco antes de ele sair forçado do País. Os trabalhos são marcados por tensões e distensões.
Caetano e Gilberto Gil foram presos em São Paulo em 27 de dezembro de 1968 e levados para o Rio de Janeiro. Cinquenta e quatro dias depois, foram confinados em Salvador, antes de irem para o exílio.
Em abril e maio de 1969, Caetano Veloso gravou um álbum com seu nome e vários estilos musicais, já com um tom melancólico do adverso tempo em que vivia e sob influência do Tropicalismo — ainda que o movimento, para ele, houvesse dispersado, porque a ditadura já não permitia a colaboração entre os artistas envolvidos.
O disco é composto por “Irene”, referência à irmã caçula do baiano e feita na prisão; “Marinheiro Só”, o samba de roda marco do gênero; a animada “Atrás do Trio Elétrico”; “Carolina”, a obra da dor de uma mulher de Chico Buarque; “Não Identificado”, música de Caetano que se tornou um sucesso na voz de Gal; e outras canções introspectivas.
Em 27 de julho de 1969, Caetano e Gil partiram para o exílio. O álbum “Caetano Veloso” (1971), produzido e lançado em Londres, quase todo em inglês, é o mais melancólico de toda a sua discografia. O livro de Márcia Fráguas conta sobre cada faixa e suas influências.
O repertório vai de um artista “perdido” na canção “London, London” à música “Maria Bethânia”, na qual pede notícias do Brasil à irmã, além da clássica “Asa Branca” (Luiz Gonzaga, Humberto Teixeira).
Por fim, há o álbum “Transa” (1972), gravado em Londres, com banda de músicos brasileira e direção musical de Jards Macalé. É da faixa “It’s a Long Way” que saiu o título do livro. Para a autora, a canção “se configura como um balanço do caminho musical e pessoal percorrido até aquele momento” por Caetano Veloso.
De novo, o livro destrincha canção por canção do paradigmático “Transa”, com referências fortes do Brasil, já com o seu autor talvez prevendo o retorno ao País, o que ocorreria em 11 de janeiro de 1972. À época, o álbum foi lançado só no Brasil.
A análise da poética de Caetano Veloso por Márcia Fráguas, formada em História pela USP e com mestrado em Literatura Brasileira, reforça o que o baiano costuma dizer: “As minhas letras são autobiográficas”. Portanto, está na obra “It’s a Long Way” parte importante da biografia do artista e uma das mais intrigantes.