Busca por manchetes chamativas atrapalha compreensão do que é o BRICS, diz especialista

Foto de família da 17ª Cúpula do Brics, no Rio de Janeiro. Foto: Isabela Castilho | BRICS Brasil

O cientista político Oliver Stuenkel, especialista em geopolítica e professor da FGV, defendeu em seu perfil no X que o BRICS não deve ser visto como uma aliança ideológica, mas sim como parte de uma estratégia pragmática de multi-alinhamento adotada por países como Brasil e Índia. Confira:

Tanto os entusiastas quanto os críticos do BRICS costumam exagerar o componente ideológico do grupo. Estar no BRICS não obriga os países a escolher um lado na geopolítica global.

A Índia, por exemplo, está hoje mais próxima dos Estados Unidos, do ponto de vista estratégico, do que de qualquer outro membro do bloco BRICS — e mesmo assim, o BRICS continua sendo útil para Nova Délhi se adaptar a um mundo multipolar.

O Brasil também integra o BRICS, mas ao mesmo tempo trabalha para implementar um acordo comercial histórico com a União Europeia, que pode transformar a relação entre o Mercosul e o bloco europeu.

Com exceção de membros como Rússia e Irã, que adotam uma retórica mais claramente antiocidental, os outros países do BRICS mantêm relações sólidas com potências ocidentais de fora do grupo.

O BRICS é apenas uma peça dentro de uma estratégia de multi-alinhamento. Brasil e Índia, por exemplo, atuam de forma consistente para retirar qualquer linguagem antiocidental das declarações finais das cúpulas.

E vale lembrar: nem mesmo Bolsonaro — provavelmente o presidente mais pró-EUA da história do Brasil — cogitou sair do BRICS. Ele também entendeu que manter um diálogo institucional com grandes parceiros é útil, e os custos de fazer parte do BRICS são baixos.

A entrada da Indonésia neste ano é um bom exemplo: é uma potência emergente sobre a qual o Brasil sabe muito pouco. Mesmo quem, no Brasil, acompanha política internacional de perto teria dificuldade em dizer quem é o chanceler da Indonésia ou qual sua maior universidade.

A Cúpula do Brics ocorre no Rio de Janeiro. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

O BRICS ajuda a preencher essas lacunas — assim como ajudou muitos brasileiros a entender melhor países como China, Índia e Rússia.

Por isso, quando alguém descreve o BRICS de forma extrema — ou como algo totalmente irrelevante ou como uma ameaça à ordem global —, vale lembrar que nenhuma dessas visões reflete a realidade.

A realidade sobre o BRICS é mais técnica, ambígua e, às vezes, até entediante. Estudo o grupo há mais de dez anos e sigo fascinado pelo tema. Mas, sempre que ocorre uma cúpula, a busca por manchetes chamativas pode atrapalhar a compreensão do que realmente é o BRICS.

Artigo Anterior

IA não pode ser privilégio de poucos nem instrumento na mão de milionários, diz Lula

Próximo Artigo

Eleição interna do PT tem indefinição após suspensão da votação em MG

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter por e-mail para receber as últimas publicações diretamente na sua caixa de entrada.
Não enviaremos spam!