O destino, as circunstâncias, a sorte, seja lá o que for, abriu algumas oportunidades históricas para o Brasil se tornar uma grande nação.
Ele nasceu vocacionado para tal: um grande território, terras agricultáveis, minerais estratégicos. Faltava apenas uma elite com projeto de país.
A primeira grande oportunidade surgiu nos anos 30, reflexo da crise de 1929, quando a escassez absoluta de libras obrigou Getúlio Vargas a interromper o livre fluxo de capitais. Capitais da cafeicultura, que tinham a Citi Londrina como destino, sem alternativa ajudaram a financiar o início da industrialização brasileira.
A segunda oportunidade – também bem aproveitada – foi na Segunda Guerra, com Vargas explorando a disputa entre Alemanha e Estados Unidos, tornando o país parceiro do novo modelo de hegemonia americana, que consistia em ajudar no desenvolvimento dos países do Sul Global. Vem daí os primeiros planos que ajudaram a identificar áreas estratégicas que, no segundo governo Vargas, permitiram a criação das grandes estatais – Companhia Siderúrgica Nacional, Petrobras, Eletrobras – lançando as bases para o salto seguinte, do governo JK. Em cima da infraestrutura legada por Vargas, JK montou o Plano de Metas, avançando a industrialização em vários setores.
O salto seguinte seria o governo João Goulart e suas reformas de base, que permitiriam o salto final de modernização, aproveitando o êxodo rural para construir uma classe média vigorosa e uma classe trabalhadora que atenderia às demandas da indústria.
Esse passo foi abortado pelo golpe militar que se, de um lado, permitiu a modernização do mercado de capitais, por outro legou a sociedade mais desigual do planeta. E, a partir dos anos 80, promoveu uma destruição da economia, como respaldo do amplo endividamento do período anterior.
Todo esse processo irresponsável de endividamento veio de um dos gurus da financeirização, Mário Henrique Simonsen. Como dizia Fernão Bracher, diretor da área externa do Banco Central, dívida foi feita para ser rolada. A crise do petróleo e a explosão dos juros americanos matou o modelo brasileiro de crescimento.
A oportunidade seguinte veio com o Plano Real. O fim da hiperinflação jogou milhões de pessoas no mercado de consumo em um momento em que a revolução da telemática e da logística promoviam uma reestruturação das cadeias produtivas globais. Brasil, China e Índia eram as bolas da vez, justamente pelas características de grandes extensões de terra, ampla população, mercado de consumo potencial e uma base industrial inicial.
A política do BC, de juros altos e câmbio baixo por sucessivos anos, liquidou com essa possibilidade. Como dizia Gustavo Franco, dívida não foi feita para ser paga, mas para ser rolada.
O governo Lula assumiu em 2002 mantendo o mesmo modelo de política econômica, com juros elevados e câmbio baixo. Inovou, é verdade, nas políticas compensatórias, mas não logrou apresentar um projeto de país.
A grande oportunidade surgiu a partir de 2007, com o boom das commodities, que deixou o país com um volume recorde de receita fiscal e de reservas cambiais. Lula alterou o estilo, comandou epicamente a reação da economia para enfrentar a crise, mas sempre com medidas pontuais, visando resolver problemas imediatos. Legou para Dilma um governo sem projeto de desenvolvimento, mas com reservas cambiais expressivas.
A rigor, Dilma foi a única presidente a pensar um projeto de desenvolvimento. Investiu no PAC, trabalhou para reduzir os spreads bancários. Mas pegou a reversão dos preços de commodities e a herança maldita do presidencialismo de coalizão, que resultou na Lava Jato.
Depois, foi a destruição perpetrada por Michel Temer e Jair Bolsonaro.
Agora, o destino joga nos braços do país a derradeira oportunidade de cumprir seu destino manifesto de grande nação: a transição energética, a neoindustrialização, a mudança nas cadeias produtivas globais.
Esse desafio exigiria um planejamento minucioso e participativo, como foi o Plano de Metas de JK, um estadista capaz de promover o grande pacto nacional em torno da produção e, ao mesmo tempo, ter uma interlocução global para se valer da reorganização do sistema de poder global.
Até o momento, temos apenas a terceira condição – o estadista internacional. Até agora, Lula não acordou para a necessidade de um projeto de desenvolvimento, como eixo central da mobilização capaz de lhe dar forças para romper com os impasses políticos e orçamentários. Não pensa em montar grupos de trabalho e continua trabalhando da mão para a boca, resolvendo problemas à medida que se apresentam.
Lula de 2008 a 2010 emergiu como a grande esperança do Brasil ter encontrado, finalmente, o estadista capaz de conduzir o país na última milha do desenvolvimento.
Lula de 2026 poderá cumprir a profecia e se consagrar como o grande presidente da história. Ou confirmar as críticas dos adversários, que foi apenas um político pragmático, beneficiado pelos ventos do boom de commodities. E, em 2026, caberá a ele o papel inglório de jogar a última pá de cal na esperança de se ter uma grande Nação.