O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou, no último dia 18, a retirada do Brasil da Aliança Internacional para a Memória do Holocausto (IHRA), organização intergovernamental criada nos anos 1990 com foco na preservação da memória do Holocausto e no combate ao antissemitismo. A decisão, confirmada por fontes do Itamaraty, foi justificada pela forma “apressada” com que o país aderiu à aliança, ainda durante o governo de Jair Bolsonaro, e pela existência de obrigações legais e financeiras não discutidas internamente.
Diplomacia coerente com o multilateralismo
Cinco dias após anunciar a saída da IHRA, o Brasil oficializou sua entrada como parte interessada no processo aberto pela África do Sul contra Israel na Corte Internacional de Justiça (CIJ), que acusa Tel Aviv de genocídio na Faixa de Gaza. Segundo o Itamaraty, não há relação direta entre os dois movimentos, mas ambos refletem um realinhamento diplomático que prioriza os mecanismos multilaterais do direito internacional frente a violações de direitos humanos.
“O Brasil considera que já não há espaço para ambiguidade moral nem omissão política. A impunidade mina a legalidade internacional e compromete a credibilidade do sistema multilateral”, afirmou o Itamaraty em nota.
Críticas à IHRA e controvérsias na definição de antissemitismo
A IHRA é alvo de críticas por parte de organizações judaicas progressistas e grupos de direitos humanos, que denunciam o uso político da definição de antissemitismo adotada pela aliança para coibir críticas legítimas ao Estado de Israel. Em 2023, entidades como Human Rights Watch, Anistia Internacional e B’Tselem pediram à ONU que rejeitasse tal definição, acusando-a de confundir antissemitismo com posicionamentos críticos ao sionismo e à ocupação de territórios palestinos.
Reações e agravamento das relações com Israel
A decisão brasileira gerou protestos da Confederação Israelita do Brasil (Conib), que classificou a saída da IHRA como um “retrocesso moral e diplomático”. O governo de Israel reagiu com dureza, acusando Brasília de “falha moral profunda” e “abandono do consenso global contra o antissemitismo”.
Desde a guerra iniciada por Israel em Gaza, em 2023, as relações entre os dois países se deterioraram. Em fevereiro de 2024, após Lula comparar as ações israelenses ao Holocausto, o presidente brasileiro foi declarado persona non grata e o embaixador brasileiro foi retirado de Tel Aviv. A crise diplomática permanece sem solução, com o Brasil se recusando a aceitar o novo indicado de Israel para a embaixada em Brasília.
Ao mesmo tempo, cresce o isolamento de Israel no cenário internacional. A entrada brasileira no processo em Haia coincide com o anúncio do presidente francês Emmanuel Macron de que reconhecerá o Estado da Palestina, gesto saudado pelo Itamaraty. A decisão reafirma o compromisso do Brasil com uma solução de dois Estados e com a responsabilização por crimes de guerra.